Thursday, 14 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Seria difícil imaginá-lo fora do jornalismo

Só bem perto do fim Alberto Tamer deixou de escrever sua coluna. Enquanto pôde, mesmo hospitalizado, tentou manter perto de si o computador e o celular. Deixou de produzir notícias e comentários quando, já muito debilitado, o contato com o mundo se tornou quase impossível. A vida física e a profissional terminaram ao mesmo tempo.

Para quem o conheceu durante décadas seria difícil imaginá-lo fora do jornalismo. Nos anos 60, Alberto Tamer, Robert Appy e o editor Frederico Heller compuseram o núcleo da editoria econômica do Estado de S. Paulo. Outros profissionais participavam da equipe. Podiam ser competentes, mas, se a seção de economia tivesse uma imagem, seria formada por aquelas três figuras.

O lendário Heller afastou-se nos anos 70. Appy dividiu seu tempo entre a orientação da editoria, a redação de editoriais e a produção menos frequente de reportagens. Tamer continuou essencialmente repórter, mesmo depois de ter passado a integrar o grupo de editorialistas.

Produzir notícias e reportagens foi sempre sua atividade mais importante. Mudou seu foco mais de uma vez e sempre se esforçou para dominar o novo assunto. O Nordeste foi uma de suas paixões. Visitou a região várias vezes, mergulhou em seus problemas, discutiu-os em reportagens e acabou publicando um livro sobre o assunto.

Dedicou-se, depois, a questões de energia e tornou-se, para os colegas, uma fonte de informações sobre o tema.

Lições de seriedade

Viveu fora do Brasil pela primeira vez quando o ex-ministro Roberto Campos o convidou para ser seu assessor de imprensa na embaixada em Londres.

Tornou-se popular como colunista de rádio, apresentando e comentando o noticiário e procurando vincular as novidades ao dia a dia dos ouvintes. Ficou conhecido como um conselheiro para assuntos práticos. Num tempo de inflação desatada, era fundamental usar o dinheiro de forma defensiva, aplicando-o com prudência e gastando com sabedoria. Tamer buscou as melhores fontes para mostrar aos ouvintes como aplicar seu “rico dinheirinho”, expressão consagrada em seus programas de rádio. Também acabou publicando livros sobre o assunto.

Ausentou-se do País pela segunda vez quando se instalou em Paris como colunista. Com boas fontes, passou a escrever principalmente sobre economia internacional, mas sempre com a perspectiva de um brasileiro. Durante esse período, veio ao Brasil com regularidade pelo menos uma vez por ano. Aproveitava essas férias para exames de saúde e tratamentos. Acabou ficando, afinal, quando os problemas de saúde tornaram recomendável sua permanência no País. Continuou produzindo em São Paulo sua coluna, sempre com informações de boas fontes, notável bom senso e uma invejável sensibilidade para os fatos mais importantes.

A idade e a doença podem ter afetado a capacidade física de Alberto Tamer. A piora de suas condições de saúde foi visível para todos os seus amigos nos últimos anos. Mas ele passou dos 80 dando lições de seriedade e de competência com sua coluna sempre bem informada e ponderada. Os problemas de um país às vezes muito mal governado estiveram sempre em sua pauta. Mas ele nunca se rendeu ao pessimismo. Um otimismo às vezes quase inexplicável surpreendeu mais de uma vez seus colegas e interlocutores. Também isso talvez contivesse uma lição.

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Rolf Kuntz é jornalista