Antes de mais nada, João Ubaldo Ribeiro, um dos maiores e queridos escritores brasileiros, foi uma excepcional figura humana. Baiano de Itaparica, conheceu e conviveu com Glauber Rocha e Jorge Amado, seu patrono na entrada na Academia Brasileira de Letras, e aconteceu uma coisa mais ou menos rara: amigos fraternos durante toda a vida, João Ubaldo não copiou seu mestre.
Enquanto Jorge Amado centraliza sua literatura no riquíssimo folclore baiano, seria natural que seu maior e mais famoso discípulo também seguisse seu mestre, concentrando sua obra nos mesmos temas e com a mesma linguagem de seu mentor. João Ubaldo seguiu um caminho diferente. Seus temas, embora baianos, eram muito amplos, e não se prendia aos temas que haviam feito a glória de Jorge Amado.
Também foi jornalista, inicialmente na Bahia, depois no Rio de Janeiro, tornando-se um dos mais conhecidos e queridos cronistas da imprensa brasileira. Tal como sua literatura, ele abordava uma diversidade enciclopédica do panorama político-social não só do Brasil, mas do mundo inteiro.
Um amigo
Poliglota, ele próprio traduziu para o inglês seu primeiro livro, “Sargento Getúlio”, que por muitos é considerado seu melhor livro, embora outro romance, “Viva o Povo Brasileiro”, tenha sido louvado unanimemente pela crítica, tornando-se o livro que até hoje é disputado pelos leitores.
No momento, estou vivendo recluso, não tendo frequentado a ABL nem procurado os amigos. Mas estive com João Ubaldo na Feira do Livro de Frankfurt, no ano passado, hospedado no mesmo hotel e cumprindo os mesmos compromissos.
Fiquei impressionado com a intimidade e admiração de autores e editores de várias partes do mundo, mas volto a dizer que a Academia Brasileira de Letras e eu próprio perdemos um grande escritor e um amigo, cuja memória perdurará para sempre.
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Carlos Heitor Cony é colunista da Folha de S.Paulo