Paulo Henrique Amorim diferia de certa tradição de um jornalismo de tons neutros que utiliza de variadas estratégias para mascarar seu comprometimento com os poderes políticos e econômicos. Não se tratava, evidentemente, de um personagem consensual; acumulou desafetos e processos judiciais, mas também amizades e reconhecimentos. Numa carreira de 58 anos, há muitos pontos de destaque na sua trajetória, mas talvez um dos principais seja a virada de jogo, já na idade madura, ao reconhecer na internet um canal de expressão para um novo tipo de jornalismo.
Esse aspecto foi evidenciado por alguns dos colegas que conviveram com ele. Luís Nassif lembrou da redação da Veja, nos anos 1970, e destacou sua capacidade de descobrir furos e motes, características que se acentuaram nos últimos tempos. “Nos últimos anos, seu estilo jornalístico encontrou o ambiente mais propício, os vídeos do YouTube. Tornou-se um campeão do YouTube, graças à sua enorme capacidade de identificar um tema, mirar no detalhe ridículo que ninguém percebia e fuzilar com a pontaria dos grandes polemistas”, escreveu.
Renato Rovai também destacou um certo pioneirismo do jornalista no mundo digital. “Paulo trabalhou décadas na mídia tradicional, mas são seus passos recentes na blogosfera que o manterão vivo pra sempre. Seus companheiros desta trilha não te esquecerão. Saiba disso”.
As mudanças nas formas de produção e circulação de informações têm afetado todo o ecossistema jornalístico. Profissionais com talento e vivência estão hoje fora do mercado tradicional. As redações, cada vez mais enxutas, quase aboliram a presença dos mais experientes. A forma como Paulo Henrique Amorim foi capaz de descobrir um novo universo na web, que propiciou a ele refinar sua verve polemista humorística, é inspiradora para indicar caminhos.
Não se trata de idealizar o digital e de ficar cego às pressões que o jornalista recebeu. O seu afastamento do Domingo Espetacular, na Record, foi associado às críticas ao governo Bolsonaro e o próprio Rovai observa que Paulo foi o jornalista mais processado do meio digital, com alguns processos justificáveis. Mas, ainda assim, abandonar a estabilidade das posições confortáveis e desafiar o coro dos contentes não é para muitos.
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Pedro Varoni é jornalista.