Foi com incontida satisfação que aceitei, em junho de 1997, o convite de Alberto Dines (1932-2018) para editar a versão impressa do Observatório da Imprensa. Primeiro, por ter o chamamento vindo de quem veio. Depois, porque desde o começo fui leitor assíduo e colaborador bissexto do OI, que estreara na internet em abril do ano anterior.
Começou mensal e logo passou a produzir edições quinzenais que subiam à web nos dias 5 e 20 de cada mês. A versão impressa, patrocinada pela Xerox do Brasil, tinha edições mensais com 16 páginas, grampeadas, em formato ofício e distribuição gratuita. Trazia um resumo do que de melhor o site do Observatório havia publicado no mês anterior. A direção de arte era da designer Fernanda Leonardo, a criadora do logotipo do Observatório. Durou de julho de 1997 a março de 2000.
O lado prazeroso da nova tarefa derivava da possibilidade de trabalhar junto a um jornalista por quem eu nutria oceânica admiração, desde os anos da faculdade, quando ele era ainda um ser distante, passando pelo período em que editei os textos que ele escreveu para a revista Imprensa, tempo em que começamos a conversar amiúde, até chegar a uma convivência mais próxima. Isto se deu quando Dines deixou Lisboa e fixou-se em definitivo em São Paulo, em 1995, e especialmente do início de 1999 em diante, quando assumi a direção do site do Observatório.
O Observatório da Imprensa nasceu de uma costela do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (LabJor), este criado em 1994 por Dines, Carlos Vogt e José Marques de Melo, vinculado ao Núcleo de Desenvolvimento da Criatividade da Unicamp, cujo lançamento oficial foi o seminário “A Imprensa em Questão”, realizado em abril de 1994 na mesma Unicamp.
Sob a inspiração de um inquieto Dines, o Observatório demorou exatos dois anos para debutar na web. Era um projeto audacioso, único, inovador, a fomentar no plano da cidadania uma discussão até então inédita, qual seja debater a mídia, seu desempenho técnico e suas responsabilidades sociais, do ponto de vista do cidadão consumidor de informação. Começava ali um processo de disseminação da crítica de mídia no Brasil que se revelou irreversível. Com base na internet, a tendência era o incremento desse debate em amplitude muito maior do que a alcançada pela seminal coluna “Jornal dos Jornais”, assinada por Dines na Folha de S.Paulo, aos domingos, entre julho de 1975 e setembro de 1977, a primeira experiência sistemática de crítica de mídia na imprensa brasileira.
Com a criação do Observatório, contudo, Dines não queria exclusividade. Seu desejo era que o debate sobre a mídia se espalhasse, ganhasse a sociedade civil e a academia, e que mais críticos de mídia surgissem, idealmente fazendo dessa observação ativa um instrumento que concorresse para o aprimoramento da própria mídia – e do jornalismo. Ele gostava de dizer que o destino do projeto era ter “um Observatório, muitos observatórios”.
O Observatório da Imprensa foi concebido como um veículo jornalístico (com prazos, processos, fluxos, hierarquias) que adotava a crítica de mídia como pauta única. Tudo começou com o site (1996) para depois espraiar-se pelos meios impresso (1997), televisivo (1998) e radiofônico (2005). Nascido na mídia digital, percorreu, com relação à internet, caminho inverso ao da mídia tradicional. E desde sempre o OI trabalhou com o conceito de redação virtual, hoje comum, mas inusitado na virada do século.
Depois de tantos anos, vitórias e percalços, subsiste o sentido maior deste Observatório (e do Projor – Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo, sua entidade mantenedora): pela via da qualificação do debate sobre os meios de comunicação, trabalhar pelo aprimoramento do jornalismo, aqui considerado como serviço público essencial e esteio da democracia. Não haverá sociedade genuinamente democrática sem uma imprensa, uma mídia e um jornalismo de qualidade.
Esta edição nº 1000 é mais uma prova da atilada visão de futuro de Alberto Dines. Seu projeto sobrevive, cada vez mais necessário.
Longa vida ao Observatório da Imprensa.
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Luiz Egypto é jornalista.