Antes de tudo: nunca fui um entusiasta de Chávez. Seu internacionalismo era baseado num pressuposto falso, em oposição meio que simplista aos EUA e seus aliados caribenhos e sul-americanos, uma espécie de doutrina Monroe ao contrário: o “latino-americanismo”, algo a se saber o que é e se existe de fato, bem como o “bolivarianismo”.
Todavia, seus governos inverteram a lógica do investimento das riquezas nacionais, que passaram a ser direcionadas à Educação, sobretudo, e à integração sul-americana. Chávez foi eleito sucessivas vezes, e diretamente. Na última eleição, em 2012, quase perde, assim como perdera um referendo constitucional que lhe daria direito (e a qualquer outro) de disputar a presidência seguidamente. Portanto, é uma estupidez qualificá-lo como “ditador”, como é corrente na mídia brasileira e entre intelectuais de direita [na terça-feira (5/3), no Jornal Nacional, um sociólogo afirmou que o regime era uma “ditadura”], sobretudo quando o fazem sem mencionar que o golpe de 2002 foi capitaneado pela mídia venezuelana.
Leitura comparada
Ora, como pode um homem morrer no poder e ser saudado pela ONU, por seus congêneres mundo afora, inclusive por Obama? A capa da edição espanhola do insuspeito centrista jornal espanhol Público do dia seguinte à sua morte é mais condizente e honesta que toda a grande (grande?) mídia nacional sobre a figura controversa de Chávez. Transcrevo abaixo manchetes do Público, um convite à leitura comparada com a mídia brasileira. A refletir.
Manchete principal: Muere Chávez, nace el mito
Chamadas para artigos:
Un legado de dignidad para un continente, por Juan Carlos Monedero
Antimperialista, socialista y latinoamericano inmortal, por C. Muntaner y J. Benach
Un hombre bueno que vivirá para siempre, por Víctor Ríos
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[Túlio Muniz é historiador com graduação (2003) e mestrado (2005) pela UFC, na qual atualmente é pesquisador e doutor no Programa de Pós-Graduação em História e doutor (2011) pela Universidade de Coimbra, Portugal]