O lançamento de um documentário, de um site e a inauguração de uma praça (prevista para 2008) e de um busto, na sede da empresa, no bairro paulistano de Pinheiros, marcam o início das homenagens do Grupo Abril ao seu fundador Victor Civita, que na sexta-feira (9/2) estaria completando 100 anos de idade.
Falecido em 24 de agosto de 1990, Victor Civita até hoje é considerado um dos mais bem-sucedidos empresários da área editorial e conseguiu transformar a Editora Abril – fundada em 1950 – numa das maiores do setor na América Latina.
De ascedência italiana, Victor Civita nasceu em Nova York, no bairro de Greenwich Village. Em 1935, casou-se com Sylvana Alcorso, com quem teve os filhos Roberto e Richard e morou na Inglaterra, na França e nos EUA. Em meio à dedicação à família e aos negócios, sempre reservava um tempo para a música, especialmente a ópera – paixão também do pai, Carlo.
Férias interrompidas
Em 1949, Victor foi passar férias com a família na Itália, onde se encontrou com o irmão César Civita, que se tornara responsável pela versão italiana das revistas do Grupo Disney. Na biografia que escreveu sobre ele, o jornalista Roberto Pompeu de Toledo – editor especial da Veja – conta que o empresário resolveu interromper as férias e viajar imediatamente com o irmão para a América do Sul.
Visitou primeiro a Argentina, para conhecer a Editorial Abril, fundada por César. Depois, veio para o Rio e seguiu para São Paulo, que o atraiu mais. ‘A cidade era mais do feitio de um milanês. Disseram-lhe que implantar uma editora em São Paulo não daria certo. Era uma província. Não tinha os jornalistas, os artistas gráficos, os recursos necessários ao setor. Victor insistiu, e o resto já se sabe’, destaca Pompeu.
Esperança e otimismo
Ao se mudar para São Paulo, Victor Civita instalou-se com a família no Hotel Esplanada, considerado o mais nobre da cidade, próximo ao Teatro Municipal. Seu primeiro escritório foi uma pequena sala, com apenas um telefone, na Rua Líbero Badaró, que dividia com uma secretária.
Fundou a Editora Abril – mês em que começa a primavera na Europa – e escolheu a logomarca, como costumava explicar, porque ‘a árvore é a representação da fertilidade, a própria imagem da vida, e o verde é a cor da esperança e do otimismo’. Nessa época, contava com US$ 500 mil em recursos próprios, levantou alguns empréstimos e convidou para sócios o Grupo Smith de Vasconcelos e o italiano Gordiano Rossi e, no dia 12 de julho de 1950, lançou o primeiro número da revista O Pato Donald.
Na década seguinte, Victor Civita investiu na publicação de obras em fascículos, que se transformaram em fenômeno editorial, e lançou a revista Zé Carioca, impulsionando os quadrinhos nacionais. Aproveitando o crescimento da indústria automobilística e do turismo, iniciado com Juscelino Kubitschek, pôs também no mercado as revistas Quatro Rodas, Guia Quatros Rodas e Viagem & Turismo.
Liderança
Victor Civita foi um dos maiores empreendedores do setor editorial no Brasil. Sob sua direção, em 50 anos de fundação, o Grupo Abril se tornou um dos líderes da sua área de atuação. A editora chegou a publicar 351 títulos, sendo 90 regulares, com circulação de 161 milhões de exemplares e índice de 23 milhões de leitores e 3,5 milhões de assinaturas. Sete das principais revistas que circulam atualmente no País pertencem à Abril – a Veja lidera a circulação, com cerca de 1 milhão de exemplares, de acordo com a Associação Nacional dos Editores de Revistas (Aner). A editora é também uma das maiores empresas de comunicação que mais emprega profissionais de imprensa – atualmente, tem em seus quadros mil jornalistas.
Em setembro de 1985, o empresário criou a fundação que leva seu nome, com a missão de ‘contribuir para a melhoria da qualidade do ensino fundamental, prioritariamente das escolas públicas com menos recursos’. Segundo Pompeu de Toledo, Victor Civita é um dos principais personagens da história dos sucessos empresariais do Brasil, aliando a capacidade de trabalho ‘ao fino talento para manter sua caravela a favor do vento, de forma a aproveitar-se das mesmas forças que impulsionavam o país de modo geral’.
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100 anos de um visionário
Gabriela Carelli # copyright Veja nº 1995, 14/2/2007
Um quarteirão arborizado no bairro de Pinheiros, em São Paulo, tornou-se na semana passada a Praça Victor Civita. Na sexta-feira [9/2], foi assinado o termo de cooperação entre a prefeitura de São Paulo e o Grupo Abril para a criação da Praça Victor Civita, que será inaugurada daqui a um ano e também funcionará como um Museu da Sustentabilidade – a arquitetura e o paisagismo do local serão um exemplo de preservação ambiental. A cerimônia teve a presença do governador de São Paulo, José Serra, e do prefeito da cidade, Gilberto Kassab. Ela foi o auge da semana de comemorações do centenário de Victor Civita, fundador da Editora Abril, que publica Veja.
Thomaz Souto Corrêa, membro do Conselho de Administração e do Conselho Editorial do Grupo Abril, veterano colaborador de Victor Civita, disse: ‘Este evento homenageia no dia do centenário do seu nascimento um homem muito especial, um italiano de sangue que adotou o Brasil como pátria e nos deixou uma imensa contribuição com seu trabalho em favor do jornalismo, da cultura, da educação, da livre-iniciativa e da democracia’.
Na quarta-feira, uma emocionante festa na Sala São Paulo reuniu 800 pessoas. Políticos, empresários e artistas se uniram a alguns dos mais antigos colaboradores de Victor Civita. Os convidados viram trechos do documentário Paixão por Fazer, que mostra a trajetória de VC, como ele era chamado na Editora Abril. Para muitos, era ‘seu Victor’, sempre pronto a dar conselhos – alguns enigmáticos, todos muito espirituosos e encorajadores. ‘Você está começando. Se fizer tudo direito terá na Abril recompensas morais e financeiras (pausa)… mais morais do que financeiras’, disse em 1984 a um repórter iniciante que hoje dirige uma revista semanal da Editora Abril.
Na sexta-feira, os Correios lançaram um selo com a efígie de VC. A praça, o selo e o documentário comemoram a história de um empreendedor visionário que, em 1950, fundou em São Paulo uma pequena editora para publicar a revista infantil O Pato Donald e a transformou em um dos maiores e mais influentes grupos de comunicação da América Latina.
‘Ele tinha duas das maiores qualidades de um homem: sonhar com projetos grandiosos e ter a capacidade de realizá-los’, disse a atriz Fernanda Montenegro, apresentadora da festa do centenário. Essa opinião é compartilhada pelos que de alguma forma conviveram com Civita – ou ‘pelos milhões de brasileiros que tiveram sua vida tocada pelo trabalho de VC’, como disse Roberto Civita, seu filho mais velho, presidente do Grupo Abril e editor de Veja. O entusiasmo de VC pela vida e a persistência para concretizar seus projetos eram inquebrantáveis. ‘Entre as principais coisas que aprendi com ele estão a necessidade de fazer bem-feito qualquer coisa que se faça, de pensar grande e de nunca aceitar um não como resposta’, completa Roberto Civita.
Quando fundou sua pequena editora numa sala do centro da cidade, Victor Civita ouviu de amigos e empresários que sua empreitada era lunática. O Brasil, diziam-lhe, não estava pronto para consumir revistas modernas, com padrão equivalente ao das melhores publicações do mundo. O Brasil, diziam a VC, é um país de analfabetos. Os banqueiros repetiam os mesmos argumentos e fechavam-lhe as portas. ‘Se eu tivesse aceitado a centésima parte dos nãos que ouvi, nenhuma das empresas que fundei existiria’, disse Victor Civita numa conferência em 1986. Se o leitor brasileiro não tinha gosto apurado era simplesmente porque não teve acesso a publicações de qualidade mundial. Se há muitos analfabetos no país é preciso alfabetizá-los… Esse era VC. Transformava desafios em oportunidades.
Victor Civita nasceu em Nova York, filho de pais italianos que dois anos depois de seu nascimento regressaram para o país de origem. Foi criado em Milão até os 20 anos, quando ganhou do pai um talão de cheques, uma passagem para os Estados Unidos e a seguinte ordem: ‘Vire-se’. O futuro empresário perambulou por várias cidades americanas durante quase um ano, visitou fábricas e conheceu os costumes locais. Acabou por voltar a Milão, onde se dedicou aos diversos negócios do pai – entre eles uma firma de representação de máquinas americanas e uma oficina automobilística. Casou-se em 1935 com Sylvana Alcorso. No ano seguinte nascia o primeiro filho do casal, Roberto. O segundo, Richard, viria ao mundo três anos depois.
Em 1939, a família foi morar nos Estados Unidos, onde permaneceu dez anos. Em uma visita ao Brasil, Civita entusiasmou-se com a possibilidade de fazer negócios no país e chamou a mulher e os filhos para se mudarem para São Paulo. No ano seguinte, com o lançamento de O Pato Donald, deu início à construção do que viria a ser o Grupo Abril. Victor Civita morreu de infarto fulminante no fim de agosto de 1990. Até o último dia, em sua sala, demonstrava o entusiasmo que marcou sua personalidade. Suas últimas energias foram direcionadas a colocar de pé a fundação que leva seu nome e que hoje beneficia 25 milhões de alunos das escolas públicas. Sua mensagem definitiva: ‘Quero ter uma idéia nova a cada dia e realizá-la’.
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Repórter do ABI Online