Alberto Dines, o criador do Observatório da Imprensa, nos deixou há um ano, mais precisamente no dia 22 de maio de 2018. O curto período que separa a despedida de Dines do contexto atual foi de mudanças expressivas no cenário político. Há um ano, o país se preparava para um processo eleitoral que, já se sabia, não seria dos mais tranquilos. Mas mesmo as previsões mais realistas não imaginavam que as eleições iriam explicitar as relações entre desinformação e mudanças políticas, demonstrando, ao mesmo tempo, a perda de poder do jornalismo como gatekeeper e revelando sua importância para a cidadania e o processo democrático.
Algo próximo já havia acontecido nos Estados Unidos com a eleição de Donald Trump, em 2016, embora o contexto norte-americano seja diverso do nosso. O fato é que os acontecimentos do último ano reforçam a importância do pensamento de Alberto Dines para o Brasil – especialmente para quem segue o desafio de fazer crítica de mídia no veículo precursor criado por ele . Como o mestre reagiria ao atual contexto das relações entre poder e jornalismo no Brasil? O que diria a respeito da epidemia de desinformação que varre o planeta anunciando tempos anti-iluministas?
Nossa proposta, nesta edição, foi endereçar uma mesma pergunta a outros jornalistas que tiveram o privilégio da convivência com o criador do Observatório da Imprensa: que falta faz Alberto Dines para o contexto atual, considerando as relações entre jornalismo e democracia no Brasil?
Eugênio Bucci lembrou o pioneirismo de Dines no chamado media criticism e no jornalismo digital, com a criação do portal do Observatório da Imprensa. O jornalista Caio Túlio Costa faz uma descrição do cenário atual do jornalismo, particularmente no Brasil, para lembrar que Dines sempre esteve ao lado da crítica, da busca pela qualidade e da convivência com os mais jovens. Na história da imprensa, o que conta, observa Caio, não é o que é publicado, mas o que vai para a cesta. E Dines foi daqueles que publicaram o que ia para a cesta.
Carlos Eduardo Lins da Silva analisa a permanência de Alberto Dines nos projetos por ele criados, como o Projor – Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo – e o próprio Observatório da Imprensa. É o Projor que lidera o Projeto Credibilidade, lançado no dia 8 de maio em São Paulo, formado por um consórcio de veículos que representam o capítulo brasileiro do Trust Project e seguem estratégias digitais para que os pilares básicos do jornalismo sejam cumpridos: servir à sociedade com relatos confiáveis, inteligentes e tangíveis.
Carlos Castilho, ex-editor deste Observatório da Imprensa, observa que Dines tem se tornado contemporaneamente uma referência obrigatória no debate sobre notícias falsas, muitas vezes dominado pelo bate-boca político ou excesso de tecnicismo. “A experiência e a autoridade moral de um Dines são tão indispensáveis quanto a compulsão inovadora”, pondera.
Norma Couri busca nas redes sociais o eco de vozes que se ressentem da ausência do ponto de vista crítico de Alberto Dines. Ela publicou uma frase do jornalista e recebeu, de volta, dezenas de comentários de ex-alunos, admiradores e jornalistas, todos se referindo a algum aprendizado obtido do mestre. A frase revela a atualidade do pensamento de Dines: “Jornalistas não podem se intimidar com o berro de um general, agressões de policiais ou quem quer que seja, mesmo vindo de um presidente dos Estados Unidos.”
Professor titular na área de semântica argumentativa e coordenador do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Unicamp, onde foi reitor de 1990 a 1994, Carlos Vogt completa: “Dines fez tanto pelo jornalismo e pela cultura que acabou criando uma ausência pesada como uma dor, que sopesa as circunstâncias de sua falta com a leveza da lembrança indelével de sua criação”.