Na terça-feira (10/4) soube que o jornalista Paulinho Mattiussi havia morrido na véspera. Paulinho foi o primeiro produtor do Balancê, da extinta Rádio Excelsior (hoje CBN), programa que abandonou em 1982 para comandar a equipe de produção de Luciano do Valle na TV Bandeirantes.
Há algum tempo Paulinho Mattiussi – que há três anos escreveu o livro sobre Osmar Santos – estava fora do mercado, e talvez os mais novos não se lembrem dele. Por isso julguei necessário escrever este pequeno artigo, numa última forma de homenagear um profissional acima da média e um amigo de poucas palavras e grandes gestos.
Um dos maiores responsáveis pelo sucesso estrondoso do Balancê, Paulinho Mattiussi comandava uma equipe que tinha o mítico sonoplasta Johnny Black (alicerce de Hélio Ribeiro), a competentíssima produtora Yara Peres, o apresentador – genial, para o rádio – Juarez Soares e os humoristas Nelson ‘Tatá’ Alexandre e Carlos Roberto Escova. Havia ainda na produção Luís Carlos de Jesus e a apresentação do programa era dividida entre Juarez, o ‘China’, e o ídolo Osmar Santos, além de Jorge de Souza e Reinaldo Costa.
Balance com auditório
O Balancê marcou época pela ousadia e era a menina dos olhos de Osmar Santos, o chefe da equipe de esportes do Sistema Globo/Excelsior de Rádio. Não cheguei a ser amigo íntimo do Paulinho. Nunca almoçamos ou fomos tomar uma cervejinha juntos. Não dava tempo. Quando o Balancê terminava, às 14 horas, eu já estava a todo vapor produzindo o programa Partido do Esporte, que a voz maravilhosa de Braga Junior apresentava às 17 horas pela Rádio Excelsior e que foi o primeiro programa de rádio a falar exclusivamente de esporte amador (ou seja, todos os esportes, menos o futebol).
Fiquei muito surpreso quando num começo de noite fui chamado da redação da sucursal de O Globo – onde tinha um segundo emprego, como repórter de esportes – para uma reunião às pressas com Osmar Santos, na Rádio Globo. Cheguei e lá não estava apenas o Osmar, mas toda a direção da equipe, com os produtores Edison Scatamacchia e Tim Teixeira.
Muito direto, o Osmar disse que o Paulinho tinha saído para a TV Bandeirantes, mas que antes de ir embora, consultado sobre quem deveria substituí-lo, indicara a mim. A oportunidade dessa indicação revelou-se mais um passo importante na minha carreira, pois, seguindo os conselhos de Johnny Black, enchi tanto o Osmar e o Edison Scatamacchia, que decidiram fazer o Balancê com auditório, o que tornou o programa uma atração para a gente simples e também para os intelectuais, justificando a fama que tem até hoje.
Show do Esporte
Nunca disse isso, mas, muito agradecido ao gesto generoso do Paulinho, obriguei-me a continuar fazendo minha parte para manter o programa como o mais premiado do rádio paulista, o que se confirmou com os prêmios da Associação Paulista dos Críticos de Arte de 1983 e 84.
Com a apresentação de Fausto Silva, a produção artística da incansável Lucimara Parisi e a ajuda inestimável de César Pereira e Valdir Nogueira, continuamos mantendo o barco à tona. Certamente criamos momentos e fizemos programas dos quais o próprio Paulinho Mattiussi se orgulharia.
Fui um telespectador viciado no Show do Esporte, que durava o domingo inteiro na TV Bandeirantes. Mas a emissora não tinha cacife para comprar os direitos das competições mais importantes e, depois de dois ou três anos de auge, começou a cair.
Paulinho ainda lançou uma revista, a Show do Esporte, mas, como quase todas as revistas esportivas já editadas no País (e tenho grande experiência nisso), não durou muito.
Depois da Copa de 1990, Paulinho reencontrou profissionalmente Osmar Santos e Edson Scatamacchia, e juntos criaram o Sport Shopping Show, na TV Record, que fez história como o primeiro programa de televisão a usar ações de merchandising direto.
Em 1992, mudou-se para Curitiba, para criar a primeira emissora de televisão com sede fora do eixo Rio-São Paulo. Entrava no ar a OM, que após dois anos veio a se chamar CNT. Na emissora paranaense Paulinho acabou lançando gente que hoje faz muito sucesso, como Adriane Galisteu com o programa Ponto G e Luciano Huck, com o seu Circulando. Com o fim do projeto na OM/CNT, o dinâmico Paulinho se especializou em marketing político, fazendo grandes campanhas, todas elas vencedoras.
Um dos últimos românticos
Após se desiludir com a política, procurou trabalho em grandes redações, mas só recebeu propostas que não condiziam com o seu nível profissional. ‘Querem que eu trabalhe como um louco, coordene a editoria geral e ganhe um pau e meio. Você acha que dá, Odir?’, ele me perguntou na última vez em que nos encontramos, durante o torneio de tênis Aberto de São Paulo, no Parque Vila Lobos.
Antes, nos vimos em um evento em homenagem a Osmar Santos. Eu tinha pensando em escrever um livro sobre o grande locutor, já que fui seu redator no tempo em que ele era o ‘Locutor das Diretas’, mas Paulinho teve a idéia primeiro, e me conformei, claro, pois o projeto estava em ótimas mãos.
Infelizmente, nunca pude retribuir ao Paulinho a imensa alegria que ele me proporcionou – além de dobrar o meu salário – ao me indicar como seu substituto no Balancê, programa que acabou gerando o Perdidos da Noite e, já bastante descaracterizado e pasteurizado, o atual Domingão do Faustão, ainda baseado na fórmula de música e humor que norteava o Balancê.
Não é comum em nosso meio, o jornalístico, encontrar pessoas tão generosas, que façam o bem sem olhar a quem. Eu mal conhecia o Paulinho, que tinha muito maior afinidade com outros profissionais da equipe. E eu já deveria ser um santista fanático, o que me torna um tanto antipático para quem não me conhece bem. Mas Paulinho enxergou um Odir que, às vezes, nem eu mesmo conseguia enxergar.
Não sei se é apropriado definir o Paulinho Mattiussi como um dos últimos românticos do jornalismo, um sujeito que colocava a beleza do texto e a criatividade acima de tudo. Mas acho que não estaria muito errado se dissesse isso. Porém, estarei totalmente certo se disser que morreu um homem de coração enorme, de quem sua família, seus filhos e amigos devem se orgulhar – a esposa Elci, os filhos Sandro e Luciana, também jornalistas, e a filhinha Paola, de apenas seis anos, que, uma pena, não poderá conviver com esse papai genial.
Aos amigos e aos colegas jornalistas aconselho que reservem uma oração ou um instante de meditação em homenagem ao grande jornalista, ao homem com coração de menino Paulo Antonio Matiussi. Um homem que tinha o dom cada vez mais raro da generosidade.
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Jornalista e escritor