Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Depois do pânico e violência, medidas restritivas

O recente pânico que levou dezenas de milhares de indianos a abandonar suas casas diminuiu, mas não impediu as medidas enérgicas adotadas por um governo hesitante contra a internet e serviços de mensagens. Segundo autoridades, os boatos infundados que se espalharam via SMS e redes sociais foram responsáveis pelo êxodo.

Kuldeep Singh Dhatwalia, porta-voz da Casa Civil do governo, disse que as medidas eram essenciais para preservar a lei e a ordem. No entanto, muitos dos sites que o governo procurou bloquear são sites de notícias em geral, como, por exemplo, páginas do jornal britânico The Telegraph. Algumas das contas de Twitter que o governo bloqueou são de jornalistas, críticos ou humoristas políticos que aparentemente nada fizeram que incentivasse à violência. Pranesh Prakash, do Centro para a Internet e a Sociedade, de Bangalore, disse que a campanha mostrava provas de que o governo estava apenas apreensivo. “Não vejo isso como censura politicamente motivada”, disse Prakash. “Vejo como enorme incompetência do governo.”

As restrições vieram após uma série de contínuos ataques e contra-ataques entre grupos étnicos rivais no estado de Assam, no nordeste do país, que causaram 78 mortes, destruíram mais de 14 mil casas e levaram quase meio milhão de pessoas a procurarem campos de refugiados. O conflito teve início em julho e agravou-se em agosto. Mas não havia questões de maior importância até que um protesto, realizado por muçulmanos em Mumbai, tornou-se violento e alguns moradores foram atacados na cidade de Pune. De repente, sites e mensagens por celular começaram a divulgar informações erradas que disseminaram pânico entre os migrantes da região nordeste do país.

Uma questão de idade

De início, as autoridades culparam o Paquistão por incentivar a tensão étnica e limitaram o uso de mensagens pelo celular a cinco por usuário. Também procuraram bloquear o acesso a cerca de 310 páginas de internet e sites. As medidas foram tão rigorosas que os EUA emitiram um aviso de alerta. Na quinta-feira (30/8), a porta-voz do Departamento de Estado, Victoria Nuland, disse que “como o governo indiano procura preservar a segurança, solicitamos-lhe que também levem em consideração a importância da liberdade de expressão no mundo digital”. Na mesma quinta-feira à noite, o governo indiano aumentou de cinco para 20 o número de mensagens que cada um dos cerca de 700 milhões de usuários de celular podia enviar.

Apesar disso, as restrições podem afetar dezenas de milhões de usuários e fecharam milhares de empresas que usam mensagens de texto para marketing. “Se querem que enviemos mensagens livres defendendo a paz e a harmonia, nos oferecemos para fazê-lo”, disse Subho Ray, presidente da Associação da Internet e Celulares da Índia, que representa algumas empresas de marketing. “Mas por que nos impedem de continuar nossos negócios legítimos?”

Relação tensa

A relação entre o governo indiano e as crescentes mídias sociais é tensa há muito tempo. Durante décadas, o governo criou e pôs em prática padrões rigorosos para as indústrias de jornais, cinema e televisão. Mas mesmo esse tipo de controle é impossível de ser exercido sobre sites populares, como o Facebook e o YouTube, nos quais uma enorme quantidade de conteúdos criados por usuários não são, em grande parte, fiscalizados.

No ano passado, o governo tentou por em prática regras que exigiam que o conteúdo em questão fosse aprovado por antecipação, mas voltou atrás depois de um turbilhão de críticas. Em 2006, o governo bloqueou vários blogs, um deles de uma adolescente americana que se autodenominava Princesa Kimberley. Em 2009, o governo proibiu um site bastante popular, de sexo explícito. Um dos principais fatores de desentendimento entre os líderes indianos e o mundo das redes sociais é pura e simplesmente o de idade. Dos 100 milhões de usuários de internet no país, o grupo de remetentes de textos e posts que mais cresce tem menos de 25 anos de idade – o que, em termos demográficos, representa metade da população da Índia, de 1,2 bilhão de pessoas. Raghav Bahl, empresário de mídia e escritor, destaca que as principais lideranças políticas estão na casa dos 70 e 80 anos e começaram suas carreiras como socialistas que admiravam a União Soviética. “Atualmente, ainda que a contragosto, eles podem aceitar reformas de livre mercado, mas sua ideologia, no fundo, continua socialista”, disse.

Perfis falsos

Analistas dizem que esse intervalo de gerações pode explicar por que o governo avalia as redes sociais como uma das causas da agitação, e não como uma ferramenta para controlá-la. Existe um amplo consenso entre analistas de que a mídia na Índia, cada vez mais impetuosa, é uma das razões fundamentais para que a longa história dos tumultos étnicos na nação esteja em acentuado declínio. “Essencialmente, o governo optou por bloquear as mídias sociais, ao invés de usá-las para controlar a violência”, diz Pranesh Prakash. “Pará-las, em vez de usar o SMS para acalmar as coisas. E isso é um problema.”

Alguns usuários de Twitter reagiram às restrições do governo tornando pretas suas imagens no perfil. Alguns disseram que iriam suspender as mensagens durante várias semanas. Kuldeep Singh Dhatwalia, o porta-voz do governo, disse que este respeitava a liberdade de imprensa, mas tinha que exigir das mídias sociais algum padrão de responsabilidade. “O que ocorre é que se há alguma informação, por meio das mídias sociais, que seja ofensiva a algum país, essa informação deve ser suspensa e retirada do domínio público”, disse. As autoridades também reclamaram que o Twitter, de início, mostrou resistência às exigências para congelar ou suspender algumas contas. “Em relação ao Twitter, foi pedido que retirassem algumas páginas”, disse Dhatwalia. “Eles mostraram algumas dificuldades técnicas para encontrar e remover essas páginas. Agora, estamos discutindo isso.”

Na sexta-feira (24/8) à noite, o gabinete do primeiro-ministro indiano anunciou que o Twitter concordara com os pedidos de agir contra seis pessoas que, no próprio Twitter, se faziam passar pelo primeiro-ministro. “O Twitter comunicou-nos que o assunto foi resolvido e mandou a seguinte mensagem: ‘Retiramos os citados perfis de circulação devido à violação de nossos Termos de Serviço a respeito de falsidade ideológica.’” Informações de Gardiner Harris [New York Times, 26/8/12]