Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O novo diretor-executivo na berlinda

Em sua longa e gloriosa história, o New York Times contestou presidentes, generais e ditadores. No momento, seus jornalistas estão enfrentando uma figura pouco provável: o novo presidente e diretor-executivo do jornal, Mark Thompson. Em artigo, posts de blogs e comentários publicados ao longo das últimas semanas, o NYTimes questiona se ele está à altura do cargo.

Antes de ser contratado, em agosto, Thompson, de 55 anos, era diretor-geral da BBC. Em Londres, a rede britânica enfrenta um escândalo de abuso sexual de crianças envolvendo Jimmy Savile, uma das personalidades de maior destaque da emissora que morreu no ano passado. No ano passado, durante o mandato de Thompson, jornalistas do programa Newsnight começaram a levantar a história de que Savile seria supostamente um pedófilo. Preparou-se uma exposição sobre os supostos abusos praticados por ele – que envolveriam cerca de 300 vítimas. Mas o programa descartou a reportagem, oficialmente por não ter informações adequadas. Uma rede de TV concorrente, a ITV, revelou a história no mês passado desencadeando uma repugnância nacional e uma série de investigações, uma delas com o objetivo de apurar se a BBC teria se calado sobre o comportamento de Savile para proteger sua própria reputação.

Interesses da empresa e decisões da redação

O escândalo e o envolvimento ou não de Thompson foram abordados várias vezes no NYTimes. “Sua integridade e capacidade de tomar decisões podem afetar o NYTimes e seu jornalismo – profundamente”, escreveu a ombudsman do jornal, Margaret Sullivan, na sua coluna de 23/10. “Considerando o desenrolar dos acontecimentos, seria o momento oportuno para avaliar se ele é a pessoa adequada para o cargo.” Alguns dias depois, o colunista de finanças, Joe Nocera, foi ainda mais direto: “Considerada a gravidade dos supostos abusos sexuais, seria razoável pensar que Thompson e seus comandados fizessem imediatamente de tudo para chegar ao fundo da questão. Porém, não fizeram nada. Thompson acaba aparecendo voluntariamente ignorante dos fatos… Também leva a refletir sobre que tipo de diretor ele seria no NYTimes.”

Thompson negou repetidas vezes que tivesse conhecimento prévio das acusações a Savile, assim como da decisão de cancelar a investigação feita pelo Newsnight. Mas suas declarações evoluíram; após suas amplas negativas iniciais, ele admitiu que soube, por um repórter, da investigação do Newsnight, pouco depois de ter sido cancelada. Ele recusou-se a atender a um pedido de entrevista feito por um porta-voz do NYTimes.

A história de Thompson representa um teste original para a parede invisível que separa os interesses de uma empresa de mídia das decisões de sua redação. A pergunta é: conseguiria uma organização de mídia fazer uma cobertura razoável de si própria quando seus próprios interesses corporativos são parte da matéria que está cobrindo?

“É a pessoa ideal para nossa empresa”

Numa série de e-mails, a editora-executiva do NYTimes, Jill Abramson, diz que o jornal concedeu “consideráveis” recursos às matérias sobre Savile e Thompson, inclusive investigações realizadas pelo editor investigativo, Matthew Purdy, e pelo correspondente em Londres, John F. Burns. Ela disse que não recebeu críticas sobre a cobertura do NYTimes, em especial por parte do presidente da empresa, Arthur Sulzberger Jr., que, segundo ela, “continua fiel, como sempre, ao princípio [de fazer a reportagem ] ‘sem medo ou favor’”.

Mas ser dono de um jornal tem seus privilégios. Jill mostrou a Sulzberger um longo texto sobre Thompson, escrito por Purdy. A história não trazia revelações bombásticas, mas concluía que Thompson “perdeu, repetidas vezes, a oportunidade de deixar claro um quadro mais preciso da investigação do Newsnight, do destino do programa e, talvez, o de Savile”. “Arthur e eu temos uma relação muito próxima e adotamos a política de não surpreender um ao outro”, disse Jill. “Portanto, informei-o sobre o artigo de Purdy antes da publicação, como sempre faço com qualquer artigo que seja potencialmente delicado.”

Por meio de um porta-voz do jornal, Sulzberger disse que não faria comentários; também preferiu não atender a solicitações de entrevistas do seu próprio jornal. Nas poucas vezes em que se pronunciou publicamente sobre o assunto, apoiou Thompson dizendo, numa mensagem enviada aos funcionários no dia 25/10, que ele “preenche altos padrões de ética e é a pessoa ideal para liderar a empresa”.

“Uma história digna de atenção”

Desde outubro, quando estourou a história da BBC, o NYTimes publicou 22 textos mencionando Thompson, segundo pesquisa de um banco de dados da Nexis. Num breve e-mail, Margaret Sullivan, a ombudsman do jornal, disse: “Acho que o NYTimes fez um trabalho exaustivo e bom sobre o assunto.” Uma das vozes mais respeitadas do jornal ainda tem que se manifestar sobre Thompson: David Carr, o colunista de mídia do NYTimes , que escreveu de forma implacável sobre outras organizações de mídia. Embora tenha contribuído para um texto sobre Thompson, Carr diz que ainda não se sentiu motivado a escrever sobre Thompson e o jornal. “Acho que não há nada de estranho no fato de não o ter feito”, disse Carr. “Sempre prefiro ter alguma coisa de interessante e inteligente a dizer. Simplesmente, não senti que tivesse alguma coisa a dizer além do fato de que não vejo o que poderia impedi-lo de fazer seu trabalho.”

Jill promete que o jornal continuará com o foco em Thompson nas próximas semanas. “É uma história digna de atenção e digna de matérias profundas, que é o que continuaremos fazendo”, disse. Informações de Paul Farhi [The Washington Post, 11/11/12].