Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Entrevistas do presidente a jornais são raras

Além dos já conhecidos problemas como o declínio da receita publicitária e a redução do número de leitores, os jornais americanos sofrem de outro mal: a falta de atenção do presidente. Sim, a questão é séria. Barack Obama não costuma dar muitas entrevistas e, quando o faz, geralmente não é para um jornal, e sim para a TV.

O presidente aparece com frequência no jornalístico 60 Minutes, participa de chats na MTV e marca presença até em canais locais. As revistas ficam com um distante segundo lugar. Em sua última edição, a New Republic trazia uma entrevista com Obama, feita pelo novo dono, Chris Hughes, que é ex-coordenador da campanha do presidente. Depois das revistas, em número de entrevista concedidas, vem o rádio. Os jornais ficam bem no fim da lista.

Não é difícil entender a predileção. Entrevistas de TV permitem que se leve uma mensagem diretamente a um amplo número de telespectadores. Na TV, o clima é mais leve, e o presidente raramente argumenta com opositores ou enfrenta contextos obscuros. Outra vantagem é que ela permite o foco a audiências específicas. Nas recentes entrevistas concedidas aos canais Telemundo e Univision, por exemplo, Obama falou sobre a reforma migratória, tema de grande interesse do público hispânico.

Valor

Segundo David Lauter, chefe do escritório de Washington do grupo Tribune Company, funcionários da Casa Branca consideram que as entrevistas na TV são mais valiosas. “Tivemos várias conversas com eles durante a campanha. De maneira geral, o sentimento era de que, se não houvesse nada para a TV, não interessava”, diz.

Para Dee Dee Myers, que foi porta-voz no governo de Bill Clinton, a falta de interesse de Obama em jornais também reflete mudanças no ecossistema midiático. “Os jornais, cada vez mais, estão atingindo audiências menores. Além disso, [as entrevistas] são editadas. Temos muito menos controle sobre a mensagem”, diz ela.

O porta-voz da Casa Branca, Jay Carney, explica que não é nada pessoal. Sem se referir a jornais específicos, ele argumenta que as entrevistas de Obama são pesadas no melhor uso do tempo do presidente. “Ele tem feito impresso e TV e continuará a fazer ambos”, afirma. A Casa Branca também vem usando com mais frequência as mídias sociais, como Twitter, Facebook e Flickr. No Twitter, Obama tem quase 27 milhões de seguidores, audiência maior do que os noticiários noturnos de TV combinados e mais do que a circulação total dos 75 maiores diários do país.

Sem atenção

Quando assumiu o poder, em 2009, Obama era parcimonioso com entrevistas para jornais, mas a situação vem piorando desde as eleições intermediárias de 2010. O presidente falou com oUSA Today e o Virginian-Pilot durante a campanha para a reeleição, no ano passado, e concedeu uma entrevista em off (depois tornada pública) para o conselho editorial do Des Moines Register em outubro. Cada uma dessas entrevistas teve valor estratégico. O USA Today é um jornal nacional com a segunda maior circulação do país (atrás apenas do Wall Street Journal). Os jornais de Virgínia e de Iowa estão em estados críticos para a reeleição.

Mas a maior parte dos jornais de grande circulação, com repórteres escalados para cobrir a Casa Branca diariamente, não vêm recebendo atenção do presidente. As últimas entrevistas de Obama no Washington Post e no WSJ foram publicadas há quase quatro anos; o NYTimes conseguiu falar com ele em 2010. O Boston Globe e o Los Angeles Times não entrevistaram Obama depois que ele se tornou presidente. Nem mesmo os grandes jornais de Chicago, Chicago Tribune e Chicago Sun-Times, tiveram chance.

Obama também nunca concedeu uma entrevista para qualquer membro da Associação Nacional de Editores de Jornais, organização com 210 jornais voltados ao público negro. Obama e George W. Bush foram os primeiros presidentes que não o fizeram desde Franklin Roosevelt.

Pouco acesso

Anders Gyllenhaal, chefe do escritório de Washington da cadeia McClatchy, lamenta que a Casa Branca esteja “perdendo uma oportunidade” para falar com milhões de leitores de jornais. Antes da convenção do Partido Democrata em Charlotte, a McClatchy pediu uma entrevista a Obama em nome de seus 30 jornais diários, que incluem o Miami Herald e oCharlotte Observer. O pedido foi tratado com pouca importância pela equipe de comunicação da Casa Branca, diz Gyllenhaal. A ironia, afirma David Leonhardt, chefe da sucursal de Washington do NYTimes, é que “o presidente é um leitor ávido de jornais”.

De maneira geral, Obama concedeu duas vezes mais entrevistas durante seu primeiro mandato do que Ronald Reagan, George H. W. Bush, Bill Clinton e George W. Bush, segundo Martha Joynt Kumar, cientista política da Universidade Towson. Mas a quantidade de entrevistas a jornais é bem menor do que entre seus antecessores.

A Associação de Correspondentes da Casa Branca, que representa os jornalistas que cobrem o presidente, afirma, no entanto, que a principal preocupação não é a escolha de entrevistas de Obama, mas a erosão do acesso da imprensa ao presidente. O grupo reivindica mais coletivas de imprensa e idas ao Salão Oval durante a visita de autoridades, quando é permitido que os repórteres façam perguntas rápidas.