Eu lembro quando o 34º andar do prédio da Time Life era o imóvel mais ostentoso do jornalismo. Aqueles eram escritórios de verdade, tão grandes quanto os de qualquer outro negócio, incluindo Wall Street e Hollywood. Eram ante-salas que levavam a salas de espera que desembocavam em salas separadas. Para editores.
Então, os sinais da história: a parede descascando, as molduras das famosas fotografias da Life descoloridas, as mesas grudentas da Diet Coke derramada no dia anterior. A questão não era “se”, mas “quando” a venda aconteceria, apesar do CEO da Time Warner, Jeff Bewkes, garantir que nunca venderia suas revistas.
E ainda que o fim estivesse claro há algum tempo, nós não deveríamos deixar a defenestração da maior companhia de revistas da história acontecer tão levemente. Existe muita culpa a ser distribuída e muitas relações de causa e efeito com a crise dos impressos para se considerar.
Mesmo no contexto de queda do negócio de revistas, a Time Inc traz vergonha e humilhação especiais. Não muito tempo atrás, eram os EUA contra a Itália e a França dos rivais, Conde Nast e Hearst. Então a Time Inc virou a União Soviética. Agora ela deverá ser comprada pela Meredith. Meredith. De Des Moines. Que fica, bem, em Iowa.
Fusões e novidades
Existem muitos pontos de interesse nessa história, cada um contribuindo para a queda da empresa. Em 1989, a Time Inc, empresa de editores da Ivy League com muito dinheiro no banco, assustou-se com os saqueadores de Wall Street e se fundiu com a Warner Communications, uma insípida companhia de entretenimento. Os editores tinham a fantasia romântica de que seriam protegidos por ela. Então, o CEO da Warner, Steve Ross, que antes atuava em casa funerárias e estacionamentos, deu um golpe nos editores e os expulsou da empresa, mudando o foco de publicações para celebridades.
Em 1994, a Time Inc foi a primeira grande companhia a abraçar a Internet. Na verdade, ela foi, mesmo que por pouco, a mais importante companhia da Internet, arrogantemente rejeitando chances de investir em empresas como AOL, Netscape, Yahoo e Google. Mas ela fez duas grandes contribuições para o futuro digital que depois viriam a assombrá-la: criou o primeiro site com conteúdo, o Pathfinder, e o ofereceu gratuitamente; e, violando o que era então costume da Internet, começou a vender publicidade virtual.
Devemos recordar antes que caia no esquecimento: a Time Inc lançou a Internet como uma plataforma de publicações e publicidade, falhando em saber quando isso foi feito ou o que fazer depois.
Após a morte de Ross e outra briga por controle, Gerard Levin se transformou no CEO da Time Warner, um dos mais importantes executivos da América. A Time Warner, com suas poderosas revistas, dominando o negócio da TV a cabo, comprando a CNN e a Turner e ganhando proeminência em Hollywood e na indústria musical, tornou-se tão central para o estabelecimento da mídia liberal na América quanto a Fox e a News Corp foram centrais para a mídia conservadora. Era um momento de orgulho.
Levin era um expansionista, ou, segundo críticos, um paranóico que comprava tudo o que achava que outros poderiam comprar. Nessa lógica, a confusão de investimentos, as personalidades disfuncionais e a gestão perturbada se tornaram o modo operante da Time Warner.
A expansão da Time Inc incluiu centenas de novos títulos de revistas, desde A Vida no Sul até A revista do Golf, passando por muitas revistas que a companhia nem sabe que possui no Reino Unido. O que parecia ser a criação de uma grande empresa editorial teve o efeito de transformar uma empresa prestigiosa em uma lojinha de tranqueiras.
Tempo de declínio
Em 2000, Levin arquitetou um acordo, possivelmente o mais infame dos EUA, em que a AOL comprou a Time Warner, destruindo bilhões de dólares em valor, desapontando milhares de funcionários e acabando com o crescimento e o domínio da empresa.
A Time Warner (que por pouco tempo foi AOL Time Warner) congelou. Sua vasta humilhação pública, as baixas ambições de seu novo CEO, Dick Parsons, e a incompreensão da empresa do que fazer com seu futuro significaram que, por meia década, ela não fez nada a não ser produzir a série de TV Os Sopranos. (Desta maneira, o CEO da HBO, Jeff Bewkes, se transformaria no CEO da Time Warner em 2008)
Certamente, a Time Inc era um navio à deriva. Sua CEO, Anne Moore, amplamente ridicularizada pela própria companhia e pela indústria editorial, manteve seu cargo por oito anos.
Somente quando Carl Icahn tomou as rédeas da empresa em 2006 a Time Warner voltou a reconstruir seu negócio. Icahn forçou o reconhecimento oficial de que a maior empresa de mídia do mundo era uma ideia morta. Aos poucos, despachou-se a Warner Music, a Time Warner Cable e a AOL, e a companhia voltou a focar em seus canais de TV a cabo.
Farsa em grandes proporções
O longo intervalo entre Icahn e a emergência de uma nova companhia significou que as revistas foram deixadas sem supervisão. Ou que foram supervisionadas pela ineficaz Moore. Enquanto vastos recursos e poder intelectual da companhia foram devotados para a adaptação digital, o resultado foi fazer o menos possível enquanto se tentava criar a maior fundação burocrática possível. Não sei se existe alguma outra empresa que tenha perdido tanto tempo discutindo seu futuro digital com tão pouco resultado. Tratava-se de uma farsa em grandes proporções.
Cortes viraram uma norma constante. A qualidade se desintegrou. A influência se dissipou. O fim da companhia era uma certeza. A recusa de Bewkes em acreditar nisso era mais algo natural do que uma mentira. Porque o nome da companhia era Time, e porque o pai de Bewkes havia trabalhado ali, talvez ele estivesse deixando uma janela sentimental aberta. Mas ninguém se aproveitou disso. As intensas hostilidades na empresa tornaram impossíveis seu resgate, ou progresso, ou uma nova ideia, ou até a boa vontade.
John Huey, o falante editor-chefe da Time nesses anos finais, parecia expressar apenas falta de esperança e frustração com a companhia. Em 2010, Jack Griffin, da Meredith, substituiu Moore como CEO. A distância entre a Time e a Meredith (que na prática é uma eficiente casa de marketing) e a ironia dessa combinação pode ser medida pela velocidade com que Griffin foi demitido do emprego (cinco meses).
Um ano depois, ele foi substituído por Laura Lang, uma executiva menor de publicidade sem experiência ou interesse na área editorial. Bewkes pareceu considerar toda sua companhia como um apanhado de mediocridades, todos tentando desesperadamente manter seus empregos.
Curiosamente, parece que as jóias esquecidas da empresa serão deixadas para trás, já que nem a Meredith as deseja: as revistas Time, Sports Illustrated e Fortune. Esses são os maiores nomes da indústria de revistas e, sem as impurezas ao seu redor e com uma bela faxina, podem ser uma boa oportunidade.