Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Google e Facebook anunciam a morte do jornalismo

O jornalismo envolve pessoas treinadas, intuitivas, que conseguem pôr ordem no caos e nas coisas sem sentido para criar uma história que as pessoas compreendem. Falando baixinho, o Google anunciou a morte do jornalismo em 21 de fevereiro de 2013. O Facebook, o outro gigante da ciência e tecnologia do Vale do Silício, escreveu seu epitáfio no dia 7 de março.

O obituário do Google para o jornalismo veio, curiosamente, num pequeno anúncio em seu “blog oficial”, único lugar em que é feito qualquer pronunciamento da empresa. “Nossos primeiros vencedores do prêmio Jornalismo do Google”, dizia a manchete acima de um post de cinco parágrafos anunciando os sete sortudos vencedores do concurso do Google.

A oferta do prêmio era sedutora – estudantes de Jornalismo do mundo inteiro recebem uma ajuda de custo de 7.500 dólares (cerca de R$ 15 mil) para trabalhar com organizações sem fins lucrativos tentando encontrar algum sentido num panorama de uma mídia nacional amplamente fraturada. Também passariam uma semana com a Fundação Knight e uma semana no Googleplex, em Palo Alto. Uma oferta difícil de resistir e é por isso que 2.300 estudantes de todos os cantos do mundo se candidataram.

Tecnologia não é jornalismo

“Tivemos tantas candidaturas – no último dia, elas choviam numa média de uma a cada dois minutos – que ampliamos nosso período de revisão em uma semana para fazer a seleção”, dizia um post do Google. Mas é no fim do primeiro parágrafo do post do blog – aquele em que todos os estudantes de Jornalismo sabem que se apresenta, sucintamente, o quem, o que, quando, onde e por que de qualquer boa matéria – que o Google revela aquilo que acredita provavelmente serem os futuros rumos do jornalismo. “O interesse que o prêmio atraiu demonstra claramente a necessidade para estes novos tipos de oportunidades, principalmente por o jornalismo e a tecnologia se tornarem cada vez mais uma única coisa”, dizia o post.

O Google acredita que a tecnologia e o jornalismo estão se fundindo numa única entidade, que as plataformas digitais da internet com conteúdo gerado pelos usuários, o tratamento da matéria e a agregação (i.e., Google News) e os serviços de informação específicos, que parecem maravilhosos em seu aparelho móvel, são, de alguma maneira, um ótimo substituto para o jornalismo.

Mas não são.

Definitivamente, a tecnologia não é jornalismo. O Google está simplesmente (e perigosamente) errado. O jornalismo envolve pessoas treinadas, intuitivas, que conseguem por uma ordem no caos e nas coisas sem sentido para criar uma história que as pessoas compreendem. A tecnologia, por mais elegante que seja, não consegue fazê-lo.

“Jornal personalizado”

Mas, também, o Google não dá a mínima. Eles estão forjando um novo futuro no qual, na realidade, a tecnologia e uma pálida sombra de jornalismo se tornam uma única coisa. E, uma vez que isso aconteça, o resultado é que teremos menos informação. Os widgets da tecnologia digital, os bytes, os packets e os streams terão substituído a avaliação humana sobre o que as grandes audiências deveriam saber e compreender. A morte do jornalismo será completa.

Ao mesmo tempo, o Facebook juntou-se, à sua maneira, ao escrever o obituário do jornalismo no dia 7 de março – dia em que o diretor-presidente Mark Zuckerberg anunciou uma mudança dramática no News Feed, a primeira página que todos os usuários veem ao acessarem suas contas no Facebook. Ao anunciar o novo formato, Zuckerberg disse que o Facebook queria tornar o News Feed mais relevante individualmente. Irá dar maior ênfase ao conteúdo visual, mas, mais importante, irá “costurar” o conteúdo das notícias de acordo com o gosto preferencial do usuário e nivelar esse conteúdo com mais visual – verdadeira publicidade. O Facebook quer criar “o melhor jornal personalizado que pudermos” para todos e cada um dos 1 bilhão de usuários, disse Zuckerberg.

O problema, evidentemente, é que isto não será, na realidade, um jornal – pelo menos, não do jeito que o imaginaria um jornalista. Será uma criação tecnológica de engenhos altamente especializados de informação em redes sociais, e não, de fato, um jornal. O conceito de “jornal personalizado” de Zuckerberg também é, e não por coincidência, algo que será imensamente mais atrativo para anunciantes em busca de clientes em potencial. Isto é, claramente, o verdadeiro objetivo deste novo conceito de “jornal personalizado” do News Feed do Facebook.

Google e Facebook estão errados

No passado, Zuckerberg disse que o Facebook queria encontrar uma maneira melhor para os anunciantes oferecerem apresentações de visual rico (fotos grandes e vídeos) dentro do conteúdo de “notícias” nas páginas do Facebook. Aparentemente, ele conseguiu encontrá-la. Mas uma coisa que esse “jornal personalizado” do Facebook não é é um tipo de jornalismo ressuscitado. É uma tecnologia que trata e agrega aquilo que as pessoas gostariam de ver mais ou sobre o que gostariam de ouvir mais.

E aqui, como no caso da visão do Google de um futuro em que a tecnologia e o jornalismo são uma única coisa, ficaremos coletivamente menos informados porque as pessoas, em grande parte, irão ouvir, ver e ler somente coisas que se adaptem ao seu próprio mundo de informação personalizada costurado pelo News Feed do Facebook. Não me entendam de modo errado. A ciência e a tecnologia irão sempre proporcionar mudanças, o que é bom. A espécie humana evolui, cresce, adapta-se e expande-se. Quanto a isto, a era da informação digital não é diferente de qualquer outra.

Mas isso não significa que deveríamos fingir que esta nova era da informação digital seja algo que ela não é. Cada um à sua maneira, o Google e o Facebook estão ambos errados em suas caracterizações do que a tecnologia estaria substituindo, tijolo por tijolo. A tecnologia não é jornalismo e os “jornais personalizados” também não são.