Agora é oficial. Charles e David Koch acham que Warren Buffett pode ter razão.
Após a confirmação, apenas unilateral, de seu interesse em comprar os jornais do grupo Tribune, Charles Koch explicou na quarta-feira [5/6] o interesse dos irmãos a um de seus veículos preferidos, o Wall Street Journal. “Não estaríamos interessados em aplicar grandes quantias de dinheiro apostando que poderíamos ter um retorno miraculoso”, disse. “Continuamos vendo os jornais impressos em declínio.” Isso é um eco da declaração dada recentemente por Warren Buffett em sua reunião anual com os acionistas da Berkshire Hathaway. “Nós estamos em partes da indústria do papel que estão em declínio”, disse Koch, “e por termos uma vantagem competitiva e termos inovado bastante, conseguimos continuar comercialmente viáveis.”
Além da base lógica para o investimento, Koch jogou a carta editorial: “É necessário um foco na notícia concreta. Não na notícia com uma agenda, nem na notícia que, na verdade, é editorializada.”
“É na página editorial que jogaríamos nossas energias”, disse ele, acrescentando que, nos jornais que comprou, “elas seriam um mercado de ideias onde todo tipo de abordagem de questões de política pública será examinado e questionado e poderia haver um debate contínuo”.
Esta confirmação pública só irá estimular os protestos anti-Koch. As pessoas que fundaram o Tea Party estão semeando protestos de cidadãos por conta própria. Esses protestos são inúmeros e barulhentos, a segunda indicação da indignação dos leitores-nas-ruas, que vimos primeiramente com o Times-Picayune, de Nova Orleans, reduzindo o número de dias de circulação e a entrega a domicílio. Em sua maioria, os protestos ocorreram em Los Angeles, embora tenham sido vistas pequenas multidões em uma dúzia de cidades em todo o país e mesmo a opinião de um fundo para a compra do grupo Tribune. Os gritos foram dirigidos à residência de Los Angeles de Bruce Karsh, presidente da diretoria do grupo Tribune. David Freedlander descreve as nuances de aplicar esse tipo de pressão em sua matéria no Daily Beast. Os irmãos Koch são claramente um dos principais compradores em potencial num sorteio do grupo Tribune, uma provável venda da quarta maior empresa de mídia (por arrecadação) dos Estados Unidos e a 11ª maior do mundo. Devemos dizer “provável” porque a Tribune Company ainda não se comprometeu formalmente com a venda nem emitiu o “manual de dados” que os possíveis compradores possam examinar. O grupo Tribune divulgou que 40 pessoas/empresas manifestaram interesse em suas propriedades.
Um pouco sobre dinheiro e poder
Irá a Tribune Company fazer um leilão? O momento talvez fosse o ideal. A diretoria tem a possibilidade de ofertas competitivas e pode citar a sabedoria de Warren Buffett em termos de investimentos – e também sabe que a futura queda da publicidade dos impressos no mercado se seguirá apenas ao futuro declínio dos valores, se esperarem muito tempo. E, enquanto financistas, e não corretores, eles apostam no curto prazo.
De momento, há uma grande complicação. Dois dos três proprietários do grupo Tribune – Oaktree Capital Management e Angelo, Gordon & Co. – investem, cada um, consideráveis somas de fundos de pensão; para saber detalhes, veja a matéria de Matt Taibbi na Rolling Stone. O crescente protesto sindical – que agora irá aumentar com as declarações de Koch – levanta pontos de pressão conflitantes, pontos esses que podem levar a um acordo de venda sem os irmãos Koch, caso outra oferta competitiva seja suficientemente boa.
Em sua maioria, os jornais envolvidos são grandes (veja a matéria de Ken Doctor). Nomeando alguns deles – o Los Angeles Times, o Chicago Tribune, o Baltimore Sun, o Hartford Courant, o South Florida Sun-Sentinel, o Orlando Sentinel – dá para ter uma ideia do por quê da gritaria. Nos Estados Unidos, país em que a imprensa regional é tradicionalmente forte com apenas três grandes jornais nacionais, os jornais acima citados dominaram suas regiões durante décadas.
Vamos então olhar as tendências que moldarão as notícias dos irmãos Koch entrando para o palco público e a insurreição que se opõe a essa entrada. Vamos tentar explicar um pouco de dinheiro e de poder e do entrelaçamento dos dois. Existem algumas certezas envolvidas numa possibilidade de compra e também podemos acrescentar um pouco de conjeturas.
Os participantes
Comecemos por pôr em perspectiva o interesse – agora público – dos irmãos Koch. À medida que finaliza suas opções de venda, quais são as alternativas da diretoria do grupo Tribune? Em resposta aos protestos contra os Koch, o CEO do grupo Tribune, Peter Liguori, disse que as especulações sobre quem irá comprar os jornais são “prematuras”. São prematuras até as informações serem divulgadas e as ordens tomadas, mas então a decisão poderá vir rapidamente.
A ordem da nova diretoria, naturalmente, é tirar o máximo da venda. Os lucros dos jornais do grupo Tribune são, aproximadamente, de 200 milhões de dólares (cerca de R$ 425 milhões), um terço dos quais provavelmente vêm de Los Angeles. Portanto, pegue o múltiplo de mercado 3 ou 4 e multiplique aquele número como preço – ou um pouco mais de 600 milhões de dólares – pelos oito jornais, muito embora os fundos de pensão insuficientes representem um obstáculo a esse número. Aí, se as paixões inflamadas, alimentadas pela proposta de Koch, produzirem um maior preço de venda, tanto melhor.
A diretoria joga claramente num único acordo. Um acordo reduz os custos da transação, assim como os riscos do próprio acordo, e acelera o fechamento do negócio. Portanto, quem são os participantes mais prováveis de um único leilão para os oito jornais do grupo Tribune, que também incluem dois jornais não-metropolitanos – o Newport News, no estado da Virgínia, e o Allentown, na Pensilvânia?
Os quatro mais prováveis são os irmãos Koch, Rupert Murdoch, o grupo B de Los Angeles (Eli Broad, Ron Burkle e Austin Beutner) e o 2100 Trust, de Aaron Kushner. Tanto para o grupo de Los Angeles quanto para Murdoch, o interesse maior é no Los Angeles Times, mas eles sinalizaram que poderiam comprar todos os jornais – pelo menos temporariamente – para conseguir o Times.
Murdoch é um homem de jornal
Como em outros casos de vendas, há a pergunta habitual: a proposta de Rupert Murdoch seria realmente séria? O velho leão da imprensa ainda gosta de brincar de gato e rato. Não: ele explicou que a propriedade que tem de duas estações de TV em Los Angeles impediria a compra do Los Angeles Times devido às regras de propriedade cruzada da FCC. “Com o governo do Partido Democrata no poder, não passa.” Sim: ele explicou o desmembramento dos ativos de sua empresa de mídia, a partir de 30 de junho, numa News Corporation independente: é uma “oportunidade extraordinária, que a maioria das pessoas não tem durante toda sua vida, de fazer tudo de novo”. Reforçando a oportunidade: a nova News Corp. começa com 2 bilhões de dólares (cerca de R$ 4,25 bilhões) no banco e sem dívidas.
Aos 82 anos, é improvável que Murdoch venha a ter outra oportunidade de comprar o Los Angeles Times. Seria uma coroa apropriada e uma plataforma para o homem que vai se tornar presidente e CEO da outra parte da News Corp., o conglomerado de entretenimento 21st Century Fox. Em Hollywood, fala-se mais sobre um estúdio importante à frente de uma das principais empresas de mídia cobrindo filmes e programas de TV do que sobre a credibilidade da notícia do Los Angeles Times ir para a frente.
As licenças de TV de Murdoch em Los Angeles vencem em 2014. Portanto, a questão da propriedade cruzada é imediata e concreta, e com a designação pela FCC de molho, ele não conseguirá o alívio de dispensa que seus lobistas esperavam conseguir agora. Jogue uma moeda e eu digo que Rupert Murdoch vai com tudo.
Se ele realmente tentar comprar o Times (e outros títulos, se necessário), Murdoch não poderia pedir um competidor melhor que os irmãos Koch. Ninguém está na rua protestando contra uma compra por Murdoch do Los Angeles Times ou do Chicago Tribune. Mesmo os opositores dos irmãos Koch sussurram que Murdoch seria melhor – o cavaleiro cinzento contra os chapéus pretos dos Koch. É uma nova forma de análise: como é que você avalia a propriedade potencial nesta época, exceto se o fizer numa base relativa?
Pelo menos, vale pensar da seguinte maneira: Murdoch é um homem de jornal. O único outro homem de jornal naquele grupo é o novato Kushner. Sua empresa comprou a Freedom Communications e a Orange County Register no ano passado e deu início à reviravolta mais ambiciosa e contraditória no país.
Kushner faz uma diferença entre os atuais proprietários de jornais e os potenciais compradores, como os irmãos Koch. Destacando que eles têm estado em negócios como papel e gás natural, atividades a que poucas pessoas dão atenção, ele se pergunta se eles realmente querem adotar o brilho público da propriedade de um jornal. “Há uma diferença muito grande entre preencher um cheque [para a compra] e aceitar a responsabilidade de uma instituição comunitária”, declarou esta semana.
Para lá de Los Angeles
Embora aparentemente o interesse dos irmãos Koch seja pelos jornais como um todo, quem ganhar os jornais poderá decidir vender os títulos que não lhe interessar. Embora grande parte da atenção esteja focada no Los Angeles Times, a marca e a árvore genealógica do Chicago Tribune seriam os próximos, em interesse. Embora o proprietário do Chicago Sun-Times tenha sido citado como possível comprador, seus recentes esforços parecem indicar que esse potencial foi exagerado. Passando por dificuldades para pagar ao Tribune pela impressão de seu jornal, que havia terceirizado há dois anos, e ganhando o noticiário da semana passada ao demitir todos os funcionários do departamento de fotografia, onde iria o Sun-Times encontrar dinheiro para comprar o Tribune? Talvez em outro bolso de financiamento – mas a profundidade das perdas em publicidade tem que dar aos financiadores uma pausa.
O Baltimore Sun – que foi reconstruído após ser enxugado por cortes nos custos – interessaria vários compradores locais, incluindo a família Abell, que já foi proprietária do Sun e dirige a principal fundação de Baltimore. O Allentown e o Newport News são jornais do mercado redefinido por Warren Buffett. O que deixa os dois jornais da Flórida – ambos veículos importantes. Se você fosse os Koch ou alguém com uma agenda política, poderia achar que a capacidade de balançar dezenas de milhares de eleitores da Flórida numa eleição presidencial ou para o Senado poderia valer mais do que aparenta o pequeno preço de fazer funcionar um ou dois jornais em dificuldades.
Ouvimos o debate esperado sobre que tipo de investimento – financeiro ou outro – isto representaria para os irmãos Koch. Isso é besteira. Eles não ocuparam o sexto e o sétimo lugares na lista da revista Forbes apostando em modelos de negócios que parecem mais para baixo do que para cima. A única maneira de ler o interesse dos irmãos Koch é “cívica”, do ponto de vista deles, ou “política”, para seus adversários. Até Warren Buffett, ao defender a compra de jornais diários na reunião de abril de Berkshire Hathaway, disse com todas as letras: “Não vai fazer a mínima diferença na Berkshire. Não o teríamos feito em qualquer outro tipo de negócio. Não há dúvida a respeito disso.”
A percepção, e não os fatos, é tudo
Para os irmãos Koch, a compra pareceria um prolongamento de suas guerras políticas por outros meios. É claro que eles rejeitam essa opinião e o único histórico que podemos rastrear é sua influência profunda sobre o ativismo conservador da política norte-americana há vários anos.
Aparentemente – e um motivo pelo qual vimos uma insurreição modesta em oposição à proposta dos irmãos Koch – é que os compradores políticos representam um problema maior para a imprensa norte-americana. A imprensa pós-II Guerra Mundial foi treinada e auto-ensinada a fazer suas reportagens sem rodeios, sem intenções políticas. A própria imprensa passou por maus bocados para explicar sua tendência à precisão ao público em geral – basta ver seus contínuos problemas de credibilidade. Depende de humoristas e críticos de mídia como Stephen Colbert para resumir de uma maneira surpreendentemente simples:
“A probabilidade está destroçando nosso país e não me refiro ao argumento sobre quem surgiu com a palavra. Não sei se se trata de uma coisa nova, mas é, com certeza, atual na medida em que não parece que tenham importância quais são os fatos. Antes, todo mundo tinha direito a ter sua opinião, mas não os fatos. Mas isso já não é o caso. Os fatos já não têm importância. Agora, a percepção é tudo.”
Portanto, em nosso mundo de cabeça para baixo, onde os bufões têm melhor capacidade para pronunciar a verdade/probabilidade, temos esse estranho fenômeno de fatos do tipo de Colbert – com os irmãos Koch talvez reivindicando uma parte do negócio dos fatos.
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Ken Doctor é analista da indústria de mídia e autor do livro Newsonomics: Doze Novas Tendências Que Moldarão as Notícias e o Seu Impacto na Economia Mundial