As manifestações que tomaram conta de diversas cidades brasileiras nas últimas semanas foram destaque na imprensa internacional, que tentou explicar o que moveu a revolta e mostrar, em imagens, a magnitude do movimento popular. O interesse cresceu junto com os protestos, e as preocupações com a Copa do Mundo foram tema bastante presente na cobertura.
Na imprensa britânica, o Daily Mirror afirmouque um milhão de brasileiros participaram de manifestações em 100 cidades alegando que o dinheiro gasto na Copa poderia ter ido para a construção de escolas e hospitais. O jornal traz artigo do professor de Direito Octávio Luiz Motta Ferraz, da Universidade de Warwick, para tentar resumir por que os protestos cresceram tanto:
“As pessoas estão tentando dizer que se trata de uma ‘primavera brasileira’, mas estão erradas. O que é importante é que estes distúrbios começaram com uma minoria irrelevante protestando contra as passagens de ônibus, mas o modo como a polícia militar reagiu inflamou a situação. Até 1985, o Brasil era uma ditadura militar, e a polícia militar era usada para combater a oposição. Ver manifestantes pacíficos atacados com gás lacrimogêneo em São Paulo, com nove jornalistas feridos, trouxe de volta lembranças terríveis daqueles tempos. Muitos já defenderam o fim da polícia militar, e o modo como ela reagiu prova que não tem lugar em um país democrático como o Brasil. Ela foi treinada para lutar contra a oposição em uma ditadura, e a maneira como reagiu é a única razão para as coisas terem saído do controle”.
O Guardian explicouque os brasileiros foram às ruas para “protestar contra o governo, os cortes em peças-chave do serviço público e a distribuição de verbas para a Copa do Mundo do próximo ano”. O jornal destacou a importância das redes sociais na mobilização popular, e estimulou o compartilhamentode conteúdo do público, como textos, fotos e vídeos, pela ferramenta GuardianWitness.
A BBC News publicou um mapamostrando as principais cidades das manifestações e um slideshow com fotos dos manifestantes e suas faixas. Também postou depoimentosde leitores brasileiros. Para mostrar a diversidade de reivindicações nos protestos, o jornalão americano New York Times teve uma ideia criativa: publicou em seu sitefotos de manifestantes com seus cartazes – e a tradução, para o inglês, das frases contidas neles.
Spray de pimenta
Em peça de opinião assinadapelo Conselho Editorial, o Times afirmou que, apesar de todas as conquistas do Brasil nas últimas décadas – como o fortalecimento da economia e as eleições democráticas –, ainda existe uma grande lacuna entre as promessas dos governantes e as “duras realidades do cotidiano fora da elite política e empresarial” do país. Portanto, afirma o texto, as manifestações não deveriam ser uma surpresa. O jornalão ressalta que Dilma Rousseff tentou responder aos manifestantes, declarando que o desejo por mudança era bem-vindo. O diário americano também chamou a atenção internacional para a truculência policial durante os protestos ao publicar, em sua primeira página, a fotode um oficial da polícia militar atingindo o rosto de uma mulher com spray de pimenta.
A imprensa alemã destacou as críticas dos brasileiros à Fifa e à Copa, segundo artigono site da DW. “Finalmente, uma democracia se revolta contra uma profundamente antidemocrática Fifa”, afirmou o semanário Die Zeit. “Pela primeira vez, o povo, que paga por essa Copa do Mundo da Fifa, se revolta”, completou a revista Der Spiegel, fazendo, ainda, uma comparação da revolta popular brasileira com a queda do Muro de Berlim.
A al-Jazira ouviuo sociólogo e editor-chefe do Le Monde Diplomatique Brasil, Silvio Caccia Bava, que explicou que o movimento é formado, em sua maioria, por estudantes e pela classe média, e ressaltou que, assim como na “Primavera Árabe”, a mídia social teve papel determinante para a disseminação dos protestos. A al-Jazira afirmou ainda que a grande mídia brasileira inicialmente caracterizou os manifestantes como vândalos por conta dos confrontos com a polícia e de alguns atos de quebra-quebra. “O que a mídia fez também reflete a distribuição de poder neste país. As famílias poderosas que são donas de alguns dos principais jornais e emissoras de TV têm medo dos movimentos sociais, então têm a tendência a criminalizá-los. Elas mudaram a sua narrativa apenas por causa do contexto, nada mais mudou”, resume Caccia Bava.