Quando o cara que arruinou a internet com anúncios de banners diz que um novo tipo de publicidade poderá destruir o jornalismo, tende a chamar a atenção. Isso não é inteiramente justo. Joe McCambley, o fundador da Wonderfactory, uma empresa que faz projetos digitais, ajudou a construir o primeiro anúncio de banner em 1994. Era uma inovação maligna que cresceu como uma praga até quase destruir a web dos consumidores, definindo sua aparência e economia pelos anos seguintes.
Agora, a nova onda é um método de publicidade que utiliza conteúdo [chamada de native advertising, ou publicidade nativa], imitando a estética de narrativa do site anfitrião. O site Buzzfeed, as revistas Forbes e The Atlantic e, mais recentemente, a New Yorker desenvolveram uma versão de publicidade nativa, também conhecida como conteúdo patrocinado; se você estiver no Buzzfeed, o jogo de RPG World of Warcraft pode enviar uma mensagem patrocinada alegando 10 motivos segundo os quais seus amigos virtuais são melhores que seus verdadeiros amigos. Normalmente, este tipo de conteúdo vem com uma etiqueta identificando tratar-se de publicidade (às vezes, de maneira nítida, às vezes, não), mas se o conteúdo for atraente, os marqueteiros poderão conseguir sua atenção e envolvimento mais do que conseguiriam, digamos, com um anúncio de banner.
Joe McCambley é cuidadoso. Ele diz acreditar que a publicidade nativa pode valorizar o leitor e o anunciante, se executado adequadamente, mas preocupa-se com o fato de grande parte da atual safra destes anúncios estar prejudicando o contrato entre o consumidor e as organizações de mídia. “Compreendo perfeitamente o valor deste método de publicidade”, disse McCambley, “mas há um determinado número de editores que está permitindo às empresas de relações públicas e às agências de publicidade acesso direto a seus sistemas de gerenciamento de conteúdo, permitindo-lhes que publiquem diretamente no site. Acho que isso é um grande erro. É uma pirambeira muito escorregadia e, se os editores não forem cuidadosos, pode matar o jornalismo.”
Uma lista de museus pelo mundo
Ele tem razão. Os editores poderiam construir uma plataforma de receita por meio da inovação do formato de publicidade, mas a confusão que a faz funcionar muitas vezes diminui a credibilidade do patrocinador da publicação. É claro que alguns editores já foram mais longe do que deviam. O caso mais badalado é o da revista The Atlantic, que, em janeiro, permitiu que a igreja da cientologia criasse uma mensagem vinculada ao restante do conteúdo editorial, ainda que estivesse etiquetada. Foram surrados, em parte porque entregar a chave do carro a uma religião controvertida com reputação de perseguir jornalistas é uma coisa pouco inteligente de se fazer.
“Você está se aventurando com o contrato que tem com seus leitores”, disse Joe McCambley. “Como é que eu posso saber quem escreveu o conteúdo que estou lendo e qual o valor da informação?” Considerando seu status de oráculo, pouco surpreende que, quando você vai visitar esse mago da publicidade em Manhattan, você toma um elevador que o deixa em frente a uma entrada vazia com um barbante pendurado do teto. Acabei puxando o barbante e abriu-se uma porta para The Wonderfactory. Uma vez lá dentro, você descobre que Joe McCambley não é o tipo de editor mal-humorado, destacando os males necessários e desagradáveis da publicidade. Tudo que ele sempre quis foi fazer um bom conteúdo e o anúncio de banner não é sua única credencial. The Wonderfactory projetou websites para a National Geographic, Martha Stewart, Coca-Cola e The Huffington Post.
Parte de seu atual ceticismo é decorrente de sua experiência com os anúncios de banner. Vinte anos atrás, a maioria das pessoas acessava a internet através de provedores como Prodigy e CompuServe, que tinha uma versão de publicidade, mas não os banners que acabamos conhecendo e detestando. Em outubro de 1994, HotWired, a versão digital da revista Wired, decidiu criar anúncios e a AT&T entrou como parceira. O anúncio convidava as pessoas a clicar e entrar na página – e elas o faziam, num percentual assombroso de 44%, comparado ao 0,1% que é comum hoje em dia. Os usuários eram então transportados para uma lista de museus pelo mundo todo para mostrar que a internet tinha como levar você a muitos lugares.
Conteúdo é publicidade, mas parece um trabalho editorial
Na época, era uma coisa única, mas à medida que o tempo passava a abordagem tornou-se onipresente e de má qualidade. “Nós nos orgulhávamos daquele anúncio”, disse McCambley. “Mas tudo começa bem até que o tornamos ruim.” Atualmente, ele é fã e crítico do site Forbes.com, que tem representado a vanguarda do movimento pelo método da publicidade nativa. “O que eu adoro na Forbes é que eles têm coragem de correr riscos, de fazer experiências, mas acho que isso em parte é perigoso”, disse ele. “Quando você entra no site da Forbes, espera encontrar conselhos de negócios e notícias, informações checadas e aprovadas. Porém, em vez disso você recebe uma mistura de conteúdo produzido pela equipe, conteúdo de colaboradores e conteúdo patrocinado. É difícil saber onde você está.”
Lewis Dvorkin é chefe de produção da Forbes e um veterano de publicações tradicionais, assim como digitais. Trabalhou no New York Times, na Newsweek, no Wall Street Journal e na AOL. “Acredito que as pessoas gravitam rumo a um conteúdo em que confiem, e nos últimos três anos, segundo a comScore, nossa audiência cresceu de 12 milhões de usuários únicos para 25 milhões”, disse ele. “Temos padrões muito exigentes e passamos muito tempo aprovando o conteúdo enviado por colaboradores e confirmando que os responsáveis pelo nosso marketing se esforcem bastante em relação ao que colocam no site e entendam a importância de divulgar informações precisas e úteis.”
A plataforma BrandVoice, da Forbes, permite que os anunciantes criem produtos editoriais que reflitam seus melhores esforços para envolver audiências. O conteúdo é claramente etiquetado como publicidade, mas tem a abertura familiar, a arte e a configuração de texto de um trabalho editorial. Consequentemente, as coisas podem complicar-se rapidamente. Além das mensagens da equipe, o site tem uma lista de 1.200 colaboradores – consultores, professores, jornalistas etc – que são recompensados de acordo com a audiência que conseguem atrair. E depois há as mensagens do pessoal do marketing, que atualmente conta com uma lista de 15 marcas.
Editores devem ser cuidadosos
De certa forma, a Forbes arranjou um forno que prepara sua própria comida – um objetivo e tanto para os editores – com um conteúdo abundante para os leitores e todo tipo de oportunidades de marketing para os anunciantes. Mas para uma marca que foi construída com ênfase no enriquecimento e no “viver bem”, as mensagens neste novo mundo são uma mistura: na sexta-feira, havia os aguardados artigos da Apple, da Dell e do Google, mas também havia outros sobre jogos, filmes etc. E, uma vez que você começa a clicar, é difícil saber os motivos que estão entre as linhas do que você está lendo.
(Seria interessante mencionar aqui que o New York Times entrou na briga, incluindo publicidade nativa da Citi Bikes num aplicativo chamado The Scoop.)
Talvez Malcolm Forbes não reconheça essa versão de sua revista, mas ela é um sucesso: a receita da BrandVoice no ano passado foi o dobro da do ano anterior. No momento, a Forbes pode ser recompensada por ser uma marca conhecida que adotou cedo uma estratégia bastante atraente, mas, com o tempo, a execução desta estratégia pode vir a diluir o poder da marca.
Lewis Dvorkin aponta com rapidez que a revista vem de conquistar dois prêmios Loeb, de prestígio, e as vendas em banca aumentaram 17% na primeira metade do ano. Ele sugere que a abundância de conteúdo, ao invés de impedir, capacita sua equipe para produzir trabalhos duradouros e com credibilidade.
Joe McCambley faz a sua parte no que se refere à publicidade nativa, mas disse que “tem que se firmar por si como bom jornalismo. Uma publicidade nativa ruim é destrutiva para os editores que a apresentam”.
Em outras palavras, os editores que quiserem salvar o jornalismo por meio da inovação têm que ter cuidado para não se queimar.
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David Carr escreve sobre mídia e cultura no New York Times