Saturday, 02 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

As lições da televisão para os jornais

Em novembro do ano passado, Mike Darcey, na época um executivo do primeiro escalão da BSkyB, empresa britânica de televisão por satélite, recebeu um telefonema de Rupert Murdoch, o chefão da News Corporation. Murdoch queria que ele dirigisse a News UK (ex-News International), o braço britânico responsável pelos jornais e atormentado por escândalos, embora Darcey nunca tivesse trabalhado em jornal. “Não se preocupe”, disse Murdoch. “É exatamente a mesma coisa” que a televisão.

A televisão e os jornais parecem ter pouco em comum. O negócio de fazer as telas piscarem vem dando bons resultados, ao passo que os jornais vêm encolhendo. Portanto, Darcey, que tomou posse em janeiro, está fazendo com que seus jornais – inclusive o Sun, um tabloide populista, e o Times, um jornal mais para intelectuais – venham recebendo lições da indústria em que trabalhou.

Não se deve oferecer conteúdo gratuitamente a alguns leitores enquanto se pede a outros que paguem. O Times aprendeu essa lição em 2010, quando começou a cobrar pelo conteúdo online. O Sun começou a fazê-lo em agosto do ano passado. Ambos os jornais, que historicamente dependem mais das vendas inconstantes em banca do que de assinaturas estáveis, estão tentando atrair assinantes de forma a poder ter uma relação direta com seus clientes – e coletar mais informações sobre eles.

Leitores de tabloides são mais pobres

As empresas de TV paga seduzem e retêm assinantes ao acrescentar promoções, como filmes e canais. Mike Darcey acha que os jornais deveriam fazer o mesmo. No início deste ano, foi divulgado que a News UK pagou 30 milhões de libras (cerca de R$ 105 milhões) por três anos de direitos – tanto para aparelhos móveis quanto para a internet – a transmitir clipes dos jogos da Liga Inglesa de Futebol. Os clipes ficam por trás dos paywalls dos jornais e, portanto, são um incentivo a uma assinatura. Se funcionar, outros jornais podem se juntar às ofertas por direitos de eventos esportivos e vídeos de entretenimento.

Os jornais precisam do pensamento renovado que as pessoas de fora podem oferecer. Jeff Bezos, fundador da Amazon, um gigante do comércio digital, irá com certeza dar uma sacudidela no Washington Post, que comprou recentemente com seu próprio dinheiro. Darcey, um neozelandês duro, não tem o carinho sentimental que Murdoch tem pelos jornais. “Se você ficar dizendo ‘jornal’, você corre o risco de restringir sua maneira de pensar”, diz Mike Darcey. “Nós distribuímos a nossa proposta de várias maneiras, e uma delas é… em papel.”

Mas a tarefa imediata de Darcey é sustar a queda de leitores e anunciantes. Desde que criou seu paywall, o Times aumentou ligeiramente suas vendas, para cerca de 536 mil exemplares (em março de 2013); as assinaturas para o digital e o impresso aumentaram, entre si, cerca de metade. Mas o Times ainda não é lucrativo – e não o é há muito tempo. Os planos de cobrar pelo acesso online ao Sun, mesmo sendo de apenas 2 libras por semana (cerca de R$ 7,00), são arriscados, diz Mark Oliver, da empresa Oliver and Ohlbaum, de consultoria de mídia. Os leitores de tabloides são mais pobres (o leitor médio do Sun ganha um quinto da renda de um leitor do Times). Até agora, eles não mostraram disposição de pagar por notícias online.

Furos com menos entusiasmo

Mike Darcey terá que ler mais títulos desagradáveis sobre sua empresa. Em 2011 foi revelado que jornalistas do News of the World, um tabloide da News International, estavam violando os telefones de celebridades, assim como de outras pessoas, como Milly Dowler, uma jovem estudante que foi assassinada. Rapidamente, Murdoch fechou o jornal. No dia 28 de outubro próximo, Rebekah Brooks, ex-editora-chefe da News International, responderá em juízo, sob a acusação de conspiração, juntamente com sete outras pessoas.

O drama no tribunal talvez não atinja as vendas de jornais – poucos leitores associam o Sun e o Times com escutas telefônicas clandestinas – mas poderia prejudicar o moral da redação. O Sun vem prosperando às custas de furos de primeira página. Os jornalistas talvez procurem os furos com menos entusiasmo quando seus concorrentes comemorarem suas primeiras páginas com imagens de sua ex-editora-chefe no tribunal.