A fronteira entre a rebeldia jovem e uma ameaça real nem sempre é clara. No entanto, em suas reflexões raivosas no Twitter, a espanhola Alba González Camacho, de 21 anos – que se descreve como “uma garota muito normal” –, parece ter cruzado este limite.
Depois de publicar posts defendendo que uma organização terrorista de extrema esquerda voltasse à ativa para matar políticos, Alba foi condenada pela corte nacional espanhola por “incentivar o terrorismo usando uma rede social”. Uma das mensagens instigava o assassinato do primeiro-ministro conservador, Mariano Rajoy; outra destacava Alberto Ruiz-Gallardón, ministro da Justiça, comparando-o a um nazista.
Foi o primeiro veredicto do tipo, envolvendo especificamente posts do Twitter, na Espanha, e o caso tocou em questões sobre os limites culturais, políticos e jurídicos em um país que há não muito tempo vivia sob o domínio tanto da ditadura fascista quanto da ameaça do terrorismo de esquerda.
O caso é mais um a levar a mídia social aos tribunais e a levantar discussões sobre os limites do discurso no espaço da internet. Em janeiro, duas pessoas foram condenadas à prisão na Grã-Bretanha por postar mensagens ameaçadoras contra uma ativista feminista. No mesmo mês, um juiz federal dos Estados Unidos condenou um homem a 16 meses de prisão por ameaçar, no Twitter, matar o presidente Barack Obama.
“Terrorismo é terrorismo”
Alba Camacho, estudante de serviço social em Jaén, no sul da Espanha, alega não ser filiada a nenhuma organização política. Em suas mensagens, ela citou um grupo conhecido como Grapo (“Grupo de Resistência Antifascista Primeiro de Outubro”), que matou mais de 80 pessoas, principalmente no final dos anos 1970, quando a Espanha retornava à democracia após a longa ditadura do general Francisco Franco. Embora o Grapo nunca tenha se dissolvido oficialmente, os oficiais de segurança locais consideram que ele já perdeu sua capacidade operativa há muito tempo.
A inatividade do grupo, porém, não foi fator relevante para o juiz, que aceitou o argumento do Ministério Público alegando que Alba Camacho havia publicado “mensagens com conteúdo ideológico altamente radicalizado e violento”, infringindo um artigo na Constituição espanhola que proíbe a glorificação do terrorismo.
Eduardo Serra, ex-ministro da Defesa, disse que, embora os grupos de extrema esquerda como o Grapo já não apresentem qualquer ameaça à sociedade espanhola, “terrorismo é terrorismo, e simplesmente não pode ser exaltado”.
Contra o sistema opressor
Alba Camacho disse que a intenção de seus posts no Twitter era lutar contra “um sistema no qual uma minoria vive no encalço da morte, da angústia e da exploração por parte da maioria em um país onde a crise do euro tem semeado desespero econômico generalizado”.
O caso veio à tona exatamente quando o governo conservador de Rajoy está de olho em restrições sobre os protestos públicos, incluindo o uso político da internet. Em novembro, ele concordou com um projeto de lei polêmico que criminaliza o uso da rede para organizar qualquer ação de protesto violento.
O advogado de Alba, Miguel Angel Gómez García, disse que o caso mostrou a “fina barreira” entre a liberdade de expressão e as regras antiterrorismo, e que sua cliente foi apenas “bode expiatório para servir de exemplo e assustar as pessoas”.
“Nunca imaginei que algo assim pudesse acontecer comigo, afinal você encontra um monte de besteiras na internet, inclusive piores do que as minhas”, escreveu Alba sobre sua condenação. “Mas aparentemente a acusação serve apenas para um lado. Os fascistas podem dizer o que quiserem e nada vai acontecer a eles”.
Sem antecedentes criminais, Alba Camacho foi condenada a um ano de prisão, porém se dispôs a fazer um acordo. O caso gerou comoção nas redes sociais na Espanha e ajudou a engrossar o número de seguidores da jovem no Twitter, que já supera os 14 mil.