O Instituto Reuters para o Estudo do Jornalismo acaba de divulgar seu Relatório Digital 2014, que revela novas percepções sobre o consumo de notícias digitais – incluindo os grandes centros urbanos brasileiros. Com base numa pesquisa representativa realizada entre consumidores de notícias online em dez países (Reino Unido, EUA, Alemanha, França, Dinamarca, Finlândia, Espanha, Itália, Japão e Brasil), o relatório é parte de um ambicioso projeto para acompanhar a mudança no consumo do comportamento de notícias digitais ao longo da próxima década.
Uma das grandes revelações deste ano diz respeito à maneira como o brasileiro consome a notícia. O brasileiro dos centros urbanos ainda é altamente influenciado por marcas e prefere receber as notícias de indivíduos e emissoras que compartilhem de ponto de vista similar ao seu.
O Brasil se revelou, basicamente, a região pesquisada mais oposta à ideia de que um repórter deve apresentar uma gama de pontos de vista neutros e permitir que o consumidor decida o que pensar sobre eles. Isto sugere que o brasileiro ainda vai de encontro à diversidade de opiniões (elemento-chave na antiga abordagem de notícias, aquela que deveria ser mais imparcial).
A tabela abaixo, por exemplo, representa um universo de entrevistados do sexo masculino com idades entre 25 e 34 anos. Os entrevistados foram perguntados se preferem que a notícia seja apresentada de forma mais neutra – para que eles tirem as próprias conclusões, ou se preferem que haja comentários por parte dos apresentadores.
País |
Preferem a notícia apresentada de forma neutra |
Preferem que o jornalista informe seu ponto de vista |
Universo de entrevistados |
Reino Unido | 85% | 15% | 2.082 |
Alemanha | 87% | 13% | 2.063 |
Espanha | 81% | 19% | 2.017 |
Itália | 69% | 31% | 2.010 |
França | 88% | 12% | 1.946 |
Dinamarca | 74% | 26% | 2.036 |
Finlândia | 73% | 27% | 1.520 |
Estados Unidos | 79% | 21% | 2.197 |
Brasil | 71% | 29% | 1.015 |
Japão | 81% | 19% | 1.973 |
Obviamente, as diferenças culturais estão refletidas neste resultado, bem como influência de questões como instrução acadêmica e prosperidade econômica. Esta pesquisa, bem como suas edições anteriores, confirmaram que os países com maior quantidade de indivíduos escolarizados (principalmente com curso superior) e com rendimentos mais elevados tendem a preferir tomar as próprias decisões em vez de se deter aos pontos de vista oferecidos pelos jornalistas.
Curiosamente, o Brasil revelou uma questão importante no fator “confiança na notícia”: embora valorize questões como objetividade e imparcialidade, o brasileiro urbano ainda associa fortemente a confiança numa notícia à sua “marca”, ou seja, a credibilidade de uma reportagem depende também do veículo/indivíduo que a está transmitindo.
Difícil dizer, mas é possível que isso revele também a tendência a seguir aquele indivíduo que simplesmente espelhe suas convicções pessoais.
Veja a tabela abaixo (indivíduos do sexo masculino com idade superior a 55 anos):
País |
Preferem que a notícias venham de fonte neutra ou imparcial |
Preferem que a notícia venha de fontes que expressem ponto de vista similar aos seus |
Universo de entrevistados |
Reino Unido | 84% | 16% | 2.082 |
Alemanha | 90% | 10% | 2.063 |
Espanha | 87% | 13% | 2.017 |
Itália | 83% | 17% | 2.010 |
França | 87% | 13% | 1.946 |
Dinamarca | 79% | 21% | 2.036 |
Finlândia | 90% | 10% | 1.520 |
Estados Unidos | 80% | 20% | 2.197 |
Brasil | 51% | 49% | 1.015 |
Japão | 89% | 11% | 1.973 |
Mas isso levanta uma pergunta importante: os espectadores que confiam em tais marcas que simplesmente seguem suas opiniões e preconceitos estarão necessariamente mais bem informados?
Questões que envolvem a confiança do espectador são um tanto complexas e carecem de análise mais detalhada, mas tais respostas podem ser um indicativo para compreender a dinâmica da confiança em um ambiente de notícias digitais, no qual fatores culturais, educacionais e econômicos sempre influenciarão nas escolhas dos consumidores. Isto muda a maneira como as notícias serão levadas ao espectador. Se você for britânico ou alemão, por exemplo, vai preferir abordagens de notícias mais tradicionais. Se for italiano ou brasileiro, vai preferir notícias mais subjetivas.
Um diploma universitário e uma boa renda pedem notícias mais neutras, de modo que você possa interpretá-las livremente. Uma escolaridade menor pede por jornalistas interpretando a notícia para o espectador.
Para evitar manipulações, alguns analistas de mídia sugerem que a transparência seja o novo caminho para a objetividade. Em outras palavras: se uma organização de notícias ou jornalista forem abertos quanto a seus preconceitos ou opiniões pessoais, então o consumidor poderá confiar neles como consequência.
Richard Sambrook, professor de jornalismo e diretor do Centro de Estudos de Jornalismo da Universidade de Cardiff, enxerga que, embora o meio digital esteja modificando rapidamente a paisagem da veiculação das notícias, o público ainda parece mais ligado às normas tradicionais de notícias – equilibradas e imparciais – do que alguns poderiam supor. Ele diz que a questão daqui para frente é o quanto a crescente gama de serviços digitais vai consegui se estabelecer nesse meio, mantendo o impacto.