Cada vez mais, consumimos as notícias através de plataformas móveis – como celulares e tablets. De acordo com o Digital News Report de 2014 do Instituto Reuters – relatório da Universidade de Oxford, no Reino Unido, que traça um panorama do consumo digital de notícias ao redor do mundo –, os dispositivos móveis já formam estatísticas de peso. As regiões urbanas do Brasil, por exemplo, são o lugar do mundo onde mais leitores de notícias digitais aceitariam pagar para receber conteúdo: são seis para cada 10 leitores online.
Mas esta busca pelas notícias online significa a extinção dos tradicionais canais de notícias da TV?
Em artigo para o jornal britânico The Guardian, os jornalistas Richard Sambrook (professor de jornalismo na Universidade de Cardiff e ex-diretor da BBC News) e Sean McGuire (diretor administrativo da consultoria de mídia Oliver & Ohlbaum Associates e ex-diretor estratégico da BBC News) analisam o futuro dos canais de notícias.
Ambos dizem que a adaptação às novas expectativas dos consumidores vai muito além da reformulação nas redações ou da adoção de slogans que destaquem os meios digitais. Segundo os jornalistas, é necessária uma reformulação fundamental nos processos, na produção e até mesmo nos propósitos das empresas.
Conteúdo personalizado
Manter um canal de notícias 24 horas com transmissão via satélite, por exemplo, exige investimentos altíssimos – e isto não parece vantajoso quando o resultado é uma estrutura jornalística fechada entregue a uma audiência limitada (eles estimam que apenas de 1% a 2% dos espectadores no Reino Unido se manterão sensíveis ao uso dos recursos oferecidos neste formato).
Além dos altos investimentos, os avanços tecnológicos apontam para outras direções. De acordo com o centro de pesquisa Ericsson Consumer Labs, estima-se que até 2020 as conexões de banda larga estejam em mais de 1 bilhão de lares no mundo todo; serão mais de 50 bilhões de dispositivos conectados, sendo que, destes, 15 bilhões serão vídeo-habilitados e dependentes de redes de internet móvel.
Segundo Sambrook e McGuire, isto certamente vai transformar a TV e abrir oportunidades para a inovação, para novos modelos de negócios e novos serviços ao consumidor. E também criará uma expectativa de conectividade permanente, com armazenamento em nuvem e serviços independentes de localização, horários ou plataformas. Estima-se que o consumo sob demanda (ou seja: você escolhe quando assistir à programação) crescerá em pelo menos 50%. O consumidor buscará imediatismo e relevância – e desejará que tudo seja personalizado.
Alternativas
Diante de tais perspectivas, quais seriam as opções possíveis para as operadoras de TV?
Sambrook e McGuire dizem que, felizmente, ainda existe um fator que salva as emissoras: a marca. O nome de uma empresa ainda se faz importante e muitos consumidores mantêm sua lealdade – e é isto que dará tempo às companhias para inovar (com o porém de que este tempo é limitado, lembram eles).
Ambos sugerem que uma opção é o encerramento e reinvestimento em serviços sob demanda. Outra é encontrar um novo propósito e conteúdo diferenciado a fim de apelar a um público mais amplo.
Os jornalistas exemplificaram o caso de Jeff Zucker, da americana CNN, que optou por se aprofundar nas reportagens em vez de focar no imediatismo na notícia. Sambrook e McGuire alertaram, no entanto, que este formato pode acabar mudando a essência do canal, transformando-o numa espécie de Discovery Channel ou National Geographic. Há também a opção de impactar através de partidarismo político, o que funcionou bem para a Fox News, mas nem tanto para a MSNBC (que se posicionou quase como uma nêmese da Fox). Porém, todas estas abordagens ainda são apegadas ao passado, a um universo fixo, fechado, de transmissão linear.
No que diz respeito à tecnologia, a CBS, por exemplo, tem investido em sistemas de transmissão de vídeo via streaming – bem mais barato do que uma transmissão permanente por satélite. Tal estratégia tem aumentado significativamente a audiência do canal.
No Reino Unido, a BBC também agiu nesse sentido, criando o BBC3, um canal exclusivo na web direcionado para atrair o público jovem (mas que não tem tido muito sucesso). A rede de TV Al Jazeera, com sede no Catar, também anunciou serviço similar e criou o AJ+, uma rede online de vídeos de curta duração destinada a um público mais jovem e que tem o intuito de rivalizar com o Vice News.
Custos de produção
O mais importante disso tudo não é focar apenas no consumidor, mas também nos produtores de conteúdo. Sambrook e McGuire supõem que, lá pelo ano de 2020, a TV provavelmente será uma telinha no ??canto da sala que faz de tudo: acessa a internet, transmite vídeos, comunica-se com o mundo. Para o consumidor, tal fusão se revelará mero detalhe. Mas para quem produz o conteúdo, será necessário medir todo o custo da infraestrutura de distribuição terrestre e via satélite em contraste à entrega do mesmo conteúdo via internet.
E sugerem mais: a criação de um aplicativo para dispositivos móveis ou TV capaz de agregar os últimos pacotes apresentados no esquema de newsgathering – personalizados ao gosto do espectador, porém contendo apenas três informações essenciais sobre a notícia, num boletim que pode ser acessado a qualquer hora.
Para os dois jornalistas, o perfil etário daqueles que se dedicam à TV está cada vez mais elevado, por isso não faz mais sentido se dedicar à transmissão linear de notícias em plena era digital.