É cada vez mais comum a extinção do espaço para comentários dos leitores em sites de notícias. Recentemente, a Reuters anunciou que passaria a descartar os comentários feitos aos artigos jornalísticos, o que provocou um intenso debate sobre o valor da interatividade do leitor e sobre o futuro dos comentários na era das redes sociais.
Numa nota sobre o assunto, a agência afirmou que “a ideia de comentários num site deve dar espaço a novas realidades de comportamento no mercado”. Outras organizações jornalísticas fizeram o mesmo, como o jornal americano Chicago Sun-Times, que descreveu os comentários como “uma mistura confusa e constrangedora de frases desinformadas, um lançamento estridente de bombas”. O Huffington Post já havia decidido descartar comentários anônimos no ano passado.
“Se você está lendo este artigo na internet, dê um tempo, quando terminar, e reflita sobre ele”, pede Anne Applebaum, da revista digital Slate. “Depois, vá até o pé do artigo e leia os comentários. Em seguida, volte a avaliar suas opiniões. Provavelmente, elas mudaram, principalmente se você leu uma porção de observações ofensivas, negativas, de zombaria – o que frequentemente acontece”.
Quando surgiu, a internet aparentemente seria um espaço livre onde pessoas civilizadas poderiam travar um debate aberto; agora, fóruns muitas vezes sem qualquer preocupação em edição deterioram a rede com mensagens ofensivas. A preocupação em torno dos comentários é válida: experiências mostraram que a percepção que se tem de um artigo, de seu autor, ou do assunto em questão pode ser influenciada por comentários anônimos online, principalmente se forem duros. Um grupo de pesquisadores descobriu que comentários grosseiros “não só polarizavam os leitores, como muitas vezes mudavam a interpretação que um leitor poderia ter da própria matéria”. Um analista digital da Atlantic Media também descobriu que, entre as pessoas que liam comentários negativos, era maior a probabilidade de que considerassem um artigo de má qualidade, independentemente do conteúdo, e duvidassem das declarações que eram citadas.
“A diferença com o Twitter está na conversa”
O influente blog sobre tecnologia Re/code anunciou em novembro que estava suspendendo os fóruns de comentários de suas páginas – os leitores são redirecionados a fazer comentários nas redes sociais. “Refletimos sobre esta decisão por um bom tempo, uma vez que valorizamos a opinião do leitor”, escreveu a editora-executiva Kara Swisher. “Mas concluímos que, como as redes sociais prosseguiram com um crescimento sólido, é ali que a discussão sobre a maioria de nossas matérias está se travando, tornando os comentários no site cada vez menos usados e cada vez menos úteis.”
Nos sites do grupo Gawker Media (Gawker, Jezebel, Lifehacker, Deadspin e Gizmodo, entre outros), a maioria dos comentários tem que ser aprovada antes da publicação. O novo sistema foi desenvolvido depois que as seções de comentários do site Jezebel foram inundadas com imagens de estupros violentos. Na CNN, os comentários sobre a maioria das matérias foram suspensos no mês de agosto. Eles são ativados, de forma seletiva, quando se trata de matérias que os editores entendem que podem proporcionar um debate de alta qualidade – e quando os autores e os editores têm condições de participar na mediação das conversas.
Mathew Ingram, do site GigaOm, diz que o debate sobre o papel dos comentários dividiu ao meio a comunidade do jornalismo digital, com “forte oposição de um lado e forte defesa do outro”. “É uma questão muito controvertida”, diz Ingram. “E o envolvimento das pessoas é muito forte. Minha posição é: se você tem um site, por que negar às pessoas a possibilidade de comentar sobre seu conteúdo?”
Charles Arthur, jornalista freelancer e ex-editor de tecnologia do jornal The Guardian, diz que “a diferença [dos espaços para comentários em sites de notícias] com o Twitter está na conversa: sempre há a oportunidade de se ter uma discussão racional, o que parece quase impossível nos comentários”. “As pessoas preferem fazer seus comentários, defender sua opinião, num lugar que lhes seja útil. Por que você iria querer ser a 133ª pessoa a deixar um comentário sobre uma matéria? Por que vou gastar meu tempo aqui? O que é que eu ganho com isso?”, questiona ele.