O quadro “A Origem do Mundo”, de Gustave Courbet, é uma obra de arte maravilhosa, uma esplêndida exposição do brilhantismo na pintura e uma pedra angular do movimento realista francês. E também é, segundo o Facebook, pornográfico. Recentemente, a rede social censurou uma imagem do quadro postada por um professor francês e em seguida cancelou sua conta por ter violado os termos de uso. Agora, o professor, que não teve o nome divulgado, está processando o Facebook, denunciando que foi ignorada sua liberdade de expressão – e os tribunais franceses devem poder usar do direito de jurisdição para ouvir seu caso. No dia 5/3, um tribunal francês concordou com sua segunda denúncia, o que significa que o caso será julgado na França, de acordo com a legislação francesa.
À primeira vista, esta notícia pode parecer uma importante vitória em favor da liberdade de expressão. Afinal, as políticas adotadas pelo Facebook em relação à indecência são absurdamente arbitrárias e puritanas, pedindo que sejam censurados desenhos de nus e fotos de mulheres amamentando. E um fã de Courbet tem muito mais chances de ganhar uma ação em favor da liberdade de expressão contra o Facebook na França do que nos Estados Unidos: neste país, a Primeira Emenda só se refere à censura do governo, ao passo que as leis francesas sobre liberdade de expressão eventualmente permitem que a censura privada também seja punida.
Porém, na realidade a decisão do dia 5 pode abrir caminho para novos pesadelos para as liberdades civis. De uma maneira geral, os países europeus adotam uma abordagem mais indulgente em relação à liberdade de expressão, concedendo ao governo amplos poderes para censurar qualquer expressão considerada de ódio. A permissão para que tribunais europeus monitorem o discurso online de empresas norte-americanas resultaria, em última instância, na punição de opiniões impopulares. Tribunais franceses já tentaram proibir o Yahoo de permitir a venda de objetos de lembranças nazistas online e o presidente François Hollande avalia, neste momento, um tipo de legislação que responsabilizaria sites como o Facebook e o Google por permitir a publicação de discurso de ódio.
Trata-se de uma questão pouco clara e duvido que mesmo aqueles que não têm mais paciência para a censura do Facebook estejam dispostos a aprofundá-la. A França tem o direito de censurar seus próprios cidadãos, mas suas teorias repressivas da liberdade de expressão não deveriam infectar os viveiros de expressão na internet com base nos Estados Unidos. Adoro o quadro “A Origem do Mundo” e acho que a influência de Courbet nos pós-impressionistas lhe rende um lugar entre os maiores pintores desde o Renascimento italiano. Mas estou disposto a deixar o Facebook censurá-lo se isto significar manter a França longe dos fóruns mais vitais dos tempos modernos para uma expressão desinibida.
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Mark Joseph Stern é jornalista da Slate