O próximo governo britânico deverá decidir se a imprensa necessita de um órgão regulador realmente independente para recuperar a confiança do público nos jornais, de acordo com o relatório de uma comissão investigadora da Câmara dos Lordes. Segundo Richard Best, presidente da comissão de comunicações da Câmara dos Lordes, apesar do alerta dado pelo escândalo dos grampos telefônicos e das sequelas de suas consequências, a Grã-Bretanha continua às voltas com um sistema de regulação da mídia confuso e complicado.
“Depois da eleição – porque agora é um momento muito delicado e ninguém quer ofender a imprensa – esperamos que o governo responda à nossa questão fundamental: você vai fazer alguma coisa se nenhum órgão for reconhecido como tendo legitimidade e credibilidade para avaliar as queixas sobre o comportamento da imprensa e possa agir como regulador?”, diz Lorde Best. “Nós queremos saber se futuramente será tomada alguma atitude no sentido de por em prática as recomendações do inquérito de Lorde Leveson [em relação à regulação da mídia] e os critérios da Carta Real [documento formal, equivalente a um estatuto, emitido pela rainha] que até o momento não foram cumpridos.”
Dizendo que a independência do novo órgão regulador conhecido como Ipso [Independent Press Standards Organisation], “ainda não foi estabelecida”, Lorde Best acrescentou que o público não tem confiança no sistema. “Essa organização parece gozar da confiança da imprensa, mas isso não ocorre com as pessoas que representam as vítimas de intromissão da imprensa”, diz o relatório da comissão da Câmara dos Lordes.
O Ipso substituiu a Comissão de Reclamações contra a Imprensa [na sigla PCC, em inglês] e, apesar de ter o apoio da maior parte da indústria jornalística, é rejeitado por veículos de destaque como os jornais The Guardian, Financial Times e Independent. Segundo Lorde Best, o Ipso não preenche os requisitos que constam da Carta Real, de um órgão regulador totalmente independente para avaliar as reclamações do público.
Um possível regulador alternativo, o Monitor da Imprensa Independente (Impress) pode tentar ser reconhecido quando for adequadamente estabelecido, mas até o momento nenhum publisher procurou associar-se. “Isto apresenta-se como uma coisa confusa para o público, e principalmente para quem queira fazer uma reclamação”, disse Lorde Best. “Após as revelações estarrecedoras sobre os grampos clandestinos… o que temos hoje é um processo complexo que as pessoas devem percorrer para fazer uma queixa contra uma publicação e não existe um órgão regulador que atenda aos critérios estabelecidos por Lorde Leveson e que constam da Carta Real.”
Questão espinhosa
O relatório da comissão investigadora da Câmara dos Lordes, publicado em 23/3, termina com um alerta de que, embora a espinhosa questão da regulação da imprensa possa ter temporariamente se acalmado, ela representou uma bomba-relógio que precisava ser resolvida.
“Em 2011, a questão da regulação da imprensa era por si própria uma notícia jornalística importante”, diz o relatório. “No momento, a questão tornou-se menos importante. No entanto, a menos que o Reino Unido tenha um sistema de regulação de imprensa que equilibre adequadamente o direito à privacidade com a liberdade de expressão, e que conte com a confiança de pessoas que sejam potenciais reclamantes, assim como da própria imprensa, é provável que a questão volte a perseguir o público e a imprensa.”
Lorde Best solicitou ao governo que seja rapidamente reavaliada a atual situação de um marco regulatório não satisfatório. “Quando irá o governo avaliar o êxito – ou não – das disposições que emergiram desde que foi divulgada a Carta Real, e o que mais deverá acontecer para que novas providências sejam tomadas? Irá o governo fazer alguma coisa?”
A comissão da Câmara dos Lordes ouviu sir Alan Moses, presidente do Ipso, membros do grupo ativista Hacked Off, que luta por uma imprensa livre e responsável, o sindicato nacional dos jornalistas [NUJ, na sigla em inglês] e outros órgãos regulatórios, assim como o editor-chefe do Guardian, Alan Rusbridger. Lynne Anderson, subdiretora da News Media Association, disse que a Carta Real não era aceitável e que a imprensa não necessitava de novas intervenções por parte do Estado. “O relatório de Lorde Leveson nunca recomendou um sistema de regulação de imprensa por uma Carta Real, e sim, por uma ‘autorregulação independente e voluntária’”, disse ela. “A Carta Real patrocinada pelo Estado não poderia estar mais longe da recomendação. Apesar dos ‘incentivos’ legislativos com o objetivo de se sobrepor à imprensa, nem um jornal ou revista está disposto a assinar a Carta [Real] política e ela foi condenada por grupos de direitos humanos e campanhas pela liberdade de expressão no mundo todo.”