A al-Jazira tem mais de três mil funcionários e 65 correspondentes em todo o mundo. No mundo árabe, chega a 50 milhões de lares. Recentemente, a emissora investiu aproximadamente US$ 500 milhões (em torno de R$ 980 milhões) na compra da Current TV, nos EUA, de olho em sua audiência de 40 milhões de residências.
Depois de um início turbulento, em que era vista como porta-voz de terroristas, a al-Jazira tornou-se, por mais de uma década, amplamente respeitada como uma voz independente no Oriente Médio. Recentemente, entretanto, muitos jornalistas e âncoras que trabalhavam em cidades como Paris, Londres, Moscou, Beirute e Cairo deixaram a rede, alegando que ela teria desenvolvido uma agenda política.
Um destes profissionais é o sírio Aktham Suliman, que atuou como correspondente da emissora em Berlim de 2002 a 2012. Desencantado, Suliman deixou a al-Jazira, segundo ele, por não conseguir mais trabalhar como um jornalista independente. “Antes do início da Primavera Árabe, éramos uma voz para a mudança, uma plataforma para a crítica e ativistas políticos na região. Agora, a al-Jazira tornou-se uma emissora de propaganda”, afirma.
Muitos dissidentes chegaram ao poder na região árabe – e eles costumam mostrar pouco respeito aos princípios democráticos. Infelizmente, a rede acaba cedendo às pressões dos novos governantes. Hoje, quando egípcios protestam contra o presidente Mohammad Morsi e o governo da Irmandade Muçulmana, a al-Jazira geralmente é crítica a eles. Segundo Suliman, executivos da al-Jazira ordenaram que os decretos de Morsi devem ser retratados como “pérolas de sabedoria”. “Essa postura ditatorial era impensável antes”, diz o jornalista.
Criada com um objetivo nobre
A programação árabe da al-Jazira foi lançada em 1996 com um objetivo nobre: servir como um veículo objetivo em uma região tomada por uma censura rigorosa. Em seu início, a rede chegou a exibir mensagens de Osama bin Laden, provocando críticas dos EUA, onde era classificada de “rede terrorista”.
Ao mesmo tempo, tratava-se do único meio árabe que regularmente convidava políticos israelenses para debates. Seus correspondentes não hesitaram em chamar o então presidente iraquiano Saddam Hussein de “ditador” e o líder egípcio Hosni Mubarak de “banana”. A emissora também divulgava matérias sobre dissidentes, incluindo membros da Irmandade Muçulmana, opositora ao governo de Mubarak. A coragem e o jornalismo investigativo renderam diversos prêmios à al-Jazira.
Agenda política
Mas agora, o emir do Catar, xeque Hamad bin Khalifa Al Thani, que financia a al-Jazira, está tendo dificuldades com alguns “espíritos independentes” que trabalham na emissora. Al Thani tem um estilo autocrata de liderança e já colocou jornalistas indesejados atrás das grades. Hoje, o diretor-geral da rede é parente do xeque, assim como o presidente do conselho, que deve seguir as normas políticas da emissora e não servir ao interesse dos telespectadores.
Graças ao petróleo, o Catar – sede da emissora – tem a segunda maior renda per capita do mundo e desempenha um papel-chave geopolítico com uma agenda clara. Quando, por exemplo, ocorreram protestos contra o regime do Bahrein, aliado do emir, a al-Jazira ignorou a situação. Na Síria, por sua vez, onde o Catar apoia os opositores islâmicos do presidente Bashar Assad com dinheiro e armas, os jornalistas estão extremamente próximos aos rebeldes. Tão próximos que correm risco de vida: Mohammed al-Musalma, que trabalhava para a al-Jazira desde abril 2012, foi morto em um tiroteio – o vídeo do assassinato chegou a circular na internet. Al-Musalma era um jornalista-cidadão pago regularmente pela emissora. “Se não é feita nenhuma diferenciação entre ativistas e jornalistas, isso é um risco para todos”, opina Suliman. Embora estivesse em uma área de risco, al-Musalma não usava nenhum equipamento de segurança.
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