Friday, 15 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Audiência na mira


Folha de S. Paulo, 13/4


Ana Paula Sousa


Audiência na mira


Após um ano no papel de vidraça, a TV Cultura tenta retomar as rédeas da própria imagem. E melhorá-la.


Em evento realizado na manhã de ontem no cinema do shopping Bourbon, em São Paulo, a emissora jogou fora os trajes de prima pobre das TVs e, a exemplo do que fazem as redes comerciais, reuniu a imprensa para apresentar a grade de programação de 2011.


Na tela, o menino Júlio e a galinha Zazá, do ‘Cocoricó’, fizeram as vezes de apresentadores de um bem editado ‘pot-pourri’ com trechos dos 25 novos programas que passam a ir ao ar neste mês.


Os mestres de cerimônia parecem escolhidos pela popularidade, claro, mas também pelo significado.


É, sobretudo, pelo segmento infantil, que em outras épocas foi grife na emissora, com programas como ‘Mundo da Lua’ e ‘Castelo Rá Tim Bum’, mas vinha desfalecendo, que a nova grade chama a atenção.


Há, além da nova temporada de ‘Cocoricó’, o ‘Quintal da Cultura’, ao vivo, que traz aquilo que, no imaginário coletivo, espera-se de uma TV educativa.


A atração é formada por esquetes que procuram ensinar as crianças a brincar. Um deles será conduzido pela dupla Paulo Tatit e Sandra Peres, do Palavra Cantada.


‘Fizemos esforços para ter um programa ao vivo para criar uma relação mais próxima com o público infantil’, afirma Fernando Vieira de Mello, diretor de conteúdo.


Enquanto Vieira de Mello diz que a nova administração busca uma TV mais ‘agressiva, competitiva e atraente’, o presidente João Sayad compara o cardápio de ofertas a gôndolas de supermercado.


‘A grade de programação tem que ser como a gôndola de um supermercado: no meio de um produto mais simples, colocamos um mais sofisticado’, comparou.


É assim que ele explica, por exemplo, a convivência entre concertos de música clássica e o programa ‘Inglês com Música’, espécie de game que usa músicas com as letras reproduzidas em legendas para divertir e ‘ensinar’ o idioma.


‘A Cultura, hoje, é uma TV preocupada com seu público’, diz Sayad. ‘Não vamos buscar a audiência a qualquer custo porque mantemos a linha educativa, mas observamos e reagimos a ela. Nosso diferencial é exibir o que não está nas outras.’




 


 


Presidente da TV Cultura diz que ajustes continuam


A apresentação da nova grade de programação da TV Cultura, ontem, foi uma reação prática, mas também institucional, a uma crise que se estendia há um ano.


As indefinições de rumo e os cortes que têm deixado inquietos os funcionários tiveram início em maio do ano passado, quando João Sayad, então secretário da Cultura do Estado de São Paulo, foi eleito o novo presidente da Fundação Padre Anchieta, mantenedora da TV Cultura, para um mandato de três anos.


Em agosto, dois meses depois de ter se sentado na cadeira até então ocupada pelo jornalista Paulo Markun, Sayad anunciou que pretendia extinguir 450 vagas e também pôr fim aos serviços terceirizados, como as gravações feitas para a TV Assembleia e a TV Justiça.


Em fevereiro deste ano, 150 novas demissões chamaram a atenção para um possível desmonte da emissora que recebe recursos do governo do Estado.


‘Ainda estamos definindo novos procedimentos orçamentários e administrativos’, desconversou Sayad, quando questionado sobre a situação financeira da emissora. ‘Mas não estamos prevendo mais nenhuma demissão em massa, apenas pequenos ajustes.’


TERCEIRIZADOS


Ao lado das questões dos cortes, o outro assunto que Sayad tratou de maneira evasiva foi a possível terceirização de parte significativa da programação.


‘Essa é uma discussão complexa’, delimitou ele. ‘Mas não houve um aumento de produção terceirizada em relação aos programas próprios.’


O que Sayad fez questão de dizer é que pretende, cada vez mais, abrir a tela da Cultura para a produção independente.


Já é esse o caso de alguns novos programas, como a séries ‘Amores Expressos’, produzida pela Academia da Filmes, e ‘Amores Latinos’, apresentado por Eric Nepomunceno e feito em parceria com o Canal Brasil.


GUERRA DE TITÃS


Apesar do ar profissional da nova grade, o investimento nos novos programas, de acordo com Sayad, foi de R$ 5 milhões -valor equivalente ao orçamento de um longa-metragem nacional feito com condições mínimas de produção.


O orçamento da emissora para 2011 é de R$ 190 milhões -sendo que, desse total, R$ 85 milhões em do governo do Estado e o restante é obtido com publicidade.


Consciente de que entrar na guerra pela audiência é entrar numa guerra de titãs, Sayad preferiu não falar em metas. Não houve meio de tirar dele qualquer índice de audiência ou porcentagem de crescimento.


Diante da insistência dos jornalistas, o diretor de conteúdo da emissora, Fernando Vieira de Mello, acabou por fazer uma piada: ‘O segundo lugar está bom’.



 


 


TV Brasil abastece 72% das emissoras públicas nacionais


À medida que foi se tornando mais fraca a programação da TV Cultura, foram ganhando mais espaço, na rede nacional de emissoras públicas, os programas da EBC (Empresa Brasil de Comunicação), ligada ao governo federal.


Nascida da fusão entre a TVE do Rio e a Radiobrás, estatal federal, a empresa mantém a TV Brasil, que deu início a suas transmissões em dezembro de 2007.


À altura, a chamada rede pública, que tem emissoras espalhadas por todo o Brasil, retransmitia, sobretudo, programas da TV Cultura.


De acordo com dados aos quais a Folha teve acesso, em junho de 2009, a programação da TV Brasil já abastecia 55% das emissoras públicas nacionais. Em dezembro do ano passado, esse índice tinha alcançado 72%.


Procurado para comentar os dados, o presidente da Fundação Padre Anchieta, João Sayad, enviou, por escrito, a seguinte resposta.


‘O polo de interesse maior da Cultura é o Estado de São Paulo e, nesse sentido, a cobertura é bastante eficiente’, escreveu. ‘Mas como contamos com uma programação diversificada, com atrações de qualidade, estamos convencidos de que será possível conquistar novos espaços em outros Estados.’


GRADE COMPARTILHADA


Menos indireta, Tereza Cruvinel, diretora-presidente da EBC, atribui a ultrapassagem numérica da TV Brasil a um posicionamento adotado pela própria Cultura.


‘Há cerca de dois anos, numa reunião da Abepec [associação de todas as emissoras educativas estaduais], em Belém, a Cultura disse que, com a criação da TV Brasil, iria redefinir seu papel e que passaria a cobrar pela programação, deixaria de dar os programas gratuitamente para a rede’, relata.


Nesse mesmo encontro, a TV Brasil apresentou sua política de rede. A proposta da nova emissora era compor uma grade que unisse seus programas àqueles produzidos pelas TVs locais.


Uma das regras da rede da TV Brasil é que cada emissora estadual, mesmo que adquira os produtos nacionais, preserve, pelo menos, quatro horas de programação local.


‘Começamos também a fazer coproduções com as emissoras regionais’, explica Cruvinel. Exemplo disso é a animação ‘Bangogalango’, feita pela TV Minas -Estado administrado pelo PSDB- e exibido por toda a rede federal.


A TV Brasil tem, hoje, contratos firmados com 22 Estados. Com outras três emissoras, a TV do Rio Grande do Sul, que só retransmitia a TV Cultura, incluída, está em negociações.