Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Caso Newsweek reacende polêmica de fontes anônimas

O artigo da Newsweek sobre a suposta profanação do Alcorão na base americana na Baía de Guantánamo, em Cuba, resultou em mortes e muitas críticas. A afirmação, publicada há três semanas, de que uma cópia do livro sagrado dos muçulmanos teria sido jogada na privada para obrigar os prisioneiros a falar levou à maior onda de protestos contra os EUA no Afeganistão desde a queda do governo Talibã, há mais de três anos.

Segundo informa a revista britânica The Economist [19/5/05], o Departamento de Defesa americano só se manifestou – questionando a informação contida na Newsweek – depois que teve início a onda de violência nos países muçulmanos. A revista, inicialmente, divulgou um pedido de desculpas, afirmando que poderia ter publicado informações erradas. Bombardeada por críticas vindas do Pentágono e da própria imprensa, a Newsweek, através de nota assinada pelo editor Mark Whitaker, retratou-se formalmente. ‘Baseados no que sabemos agora, retratamos nossa história original sobre uma investigação interna que supostamente teria descoberto abusos com o Alcorão na base de Guantánamo’, dizia a declaração.

Ainda assim, ao contrário de outros erros jornalísticos recentes – como os ocorridos no New York Times, USA Today, CNN e CBS News – que resultaram na demissão dos envolvidos, a revista nega a opção de tomar ações disciplinares contra os repórteres responsáveis pela matéria, já que afirma que a apuração foi feita de maneira cuidadosa. O grande problema encontrado pelos jornalistas Michael Isikoff e John Barry foi a fonte confidencial que lhes passou a polêmica informação e que, quando questionada novamente, voltou atrás em sua declaração.

Jornalistas defendem, leitores desconfiam

O caso Newsweek é apenas mais um episódio do crescente debate sobre o uso de fontes anônimas na imprensa dos EUA. Pesquisas recentes conduzidas com leitores americanos revelaram que o uso destas fontes pelos jornais é uma das maiores razões pela queda da confiança na mídia, informam Christine Hauser e Katharine Q. Seelye [The New York Times, 16/5/05]. A imprensa já sabe disso, e começou uma série de cuidados para reconquistar seu público. Estudo do Project for Excellence in Journalism, da Universidade de Colúmbia, com 16 grandes e pequenos jornais do país mostrou que o número de artigos com citações de fontes anônimas caiu de 29% em 2003 para 7% em 2004.

Ainda assim, enquanto críticos da prática dizem que ela é usada exageradamente com o intuito de mascarar a preguiça, opinião ou invenção de informações pelos jornalistas, grande parte dos repórteres e editores afirma que o uso de fontes anônimas é essencial na cobertura de matérias sensíveis – especialmente aquelas que envolvem grandes e poderosas instituições. O papel dos editores nesta questão polêmica, diz Joe Hagan [The Wall Street Journal, 17/5/05], é dos mais complicados. ‘Eles precisam assegurar aos leitores que o uso de fontes anônimas não alimenta textos parciais ou imprecisos. Mas eles sentem também que precisam proteger o trabalho de seus repórteres’, afirma.

Para se chegar a um acordo, alguns dos jornalões americanos têm modificado suas políticas internas. O New York Times tornou público, na semana passada, os resultados de um relatório que recomenda a sua equipe que reduza o número destas fontes nas matérias. Documento similar foi distribuído pelos editores do Washington Post no ano passado. O USA Today pôs em prática sua longa política de evitar, sempre que possível, o uso de fontes não-identificadas. E o Los Angeles Times prepara um novo manual ético para orientar seus jornalistas.