O New York Post colabora com uma investigação do FBI sobre uma suposta tentativa de extorsão do bilionário Ron Burkle por Jared Paul Stern, colaborador da Page Six, coluna de fofocas do jornal. O repórter teria sido flagrado em uma gravação de vídeo pedindo US$ 100 mil e uma gratificação mensal de US$ 10 mil a Burkle em troca de não escrever informações negativas sobre ele na coluna. O caso veio ao conhecimento público através do Daily News, tablóide rival do Post, em uma nota em seu sítio na quinta-feira (6/4) à noite e na matéria de capa da edição de sexta-feira (7/4).
Stern foi suspenso do jornal ainda na quinta-feira (6/4), deverá ficar afastado até o fim da investigação e pode ser demitido, de acordo com o porta-voz Howard Rubenstein. Ele informou que o Post forneceu registros do computador de Stern e outros materiais para os investigadores.
O editor-chefe do diário, Col Allen, afirmou que, se as acusações de extorsão forem verdadeiras, ‘a conduta de Stern será repreendida moral e jornalisticamente, por constituir um grande abuso de privilégio e violação da ética e de normas do New York Post‘. Gary Ginsberg, vice-presidente-executivo da News Corporation, que publica o Post, afirmou que o grupo está levando muito a sério a investigação. Ele acrescentou, entretanto, que as acusações não têm maiores implicações ao jornal.
Troca de acusações
Ao se defender, no domingo (9/4), Stern afirmou que as negociações sobre os pagamentos partiram do empresário. ‘Ele fez isto através de um intermediário, que conversou comigo sobre um grande investimento em minha empresa de roupas. Foi assim que todo o assunto do dinheiro começou’, disse o colunista, que também é proprietário da linha de roupas Skull&Bones.
‘Obviamente, o papel do Daily News precisa ser examinado’, completou ele. ‘O Sr.Stern foi vítima de uma campanha maliciosa e espera ser completamente exonerado e reintegrado ao trabalho’, afirmou Joseph Tacopina, advogado de Stern. O colunista alegou que encontrou Burkle pela primeira vez em julho do ano passado, quando ele teria lhe oferecido pagamentos em troca de uma cobertura positiva na imprensa. Stern teria proposto que Burkle se tornasse uma fonte, dando informações privilegiadas sobre suas amizades famosas. O empresário teria negado, mas como favor concordou em comprar 60 camisas da Skull&Bones.
Stern alega que, nas conversas, estava ‘apenas tentando convencer o empresário’ a investir em sua linha de roupas. Vendo que não receberia investimentos, o colunista teria se oferecido ainda para trabalhar para Burkle como consultor de mídia.
Já Burkle, um dos homens mais ricos do mundo, com patrimônio estimado em mais de US$ 2 bilhões, tem outra versão da história. Há cerca de um ano, informações sobre ele começaram a aparecer mais freqüentemente na Page Six. Amigos de Burkle afirmaram que tais informações eram falsas e que o empresário não havia nem sido procurado para comentá-las. Burkle teria enviado cartas ao editor da coluna, Richard Johnson, e a Rupert Murdoch – dono da News Corp. – reclamando da falta de precisão das informações publicadas. O advogado de Burkle também teria enviado diversas cartas ameaçando litígio.
Colin Myler, editor-executivo do jornal, prometeu ao empresário corrigir qualquer erro. Porém, dois dias depois, foi publicada uma nota no Post afirmando que Burkle teria bancado a viagem de um grupo de celebridades para Aspen, no Colorado – o que nunca ocorreu. No mês passado, a coluna também noticiou que o ‘bilionário festeiro Ron Burkle (…) está pensando em gastar mais de US$ 50 bilhões em um apartamento maior em Manhattan, onde ele poderá se entreter mais dispendiosamente’.
Em março deste ano, um funcionário de Burkle recebeu um e-mail de Stern. Na mensagem, o colunista sugeria que o empresário tinha ‘meios’ de mudar o tratamento recebido por ele na coluna. Neste momento, Burkle suspeitou de que estava sendo extorquido e procurou seu advogado, que pediu ajuda de agentes federais. Depois de uma série de e-mails com o braço direito de Burkle, o empresário e o repórter teriam se encontrado algumas vezes em Nova York, ainda em março. Os encontros foram secretamente gravados. ‘As fitas mostram claramente que Burkle nunca teve interesse em investir na empresa de roupas de Stern, nem contratá-lo como consultor de mídia’, afirma Michael Sitrick, porta-voz do empresário.
Prática comum
As colunas de fofocas sempre ocuparam um lado obscuro em relação a normas jornalísticas, com repórteres muitas vezes aceitando presentes de famosos que aparecem nas colunas. Nos encontros, Stern teria oferecido três níveis de ‘proteção’ ao empresário. ‘Sabemos como destruir as pessoas. É o que fazemos’, teria afirmado ele sobre a Page Six.
Quando Burkle pressionou o jornalista a dar mais detalhes sobre esta ‘proteção’, Stern teria citado alguns exemplos envolvendo Johnson, afirmando que seu chefe tinha um ‘esquema de acordo’ com Harvey Weinstein, co-fundador da produtora Miramax Films, e Ronald O. Perelman, presidente da Revlon. Através de um porta-voz, Weinstein negou qualquer relação imprópria com o colunista ou com Johnson. A empresa de Perelman teria contratado a mulher de Johnson, Sessa von Richthofen, como assistente administrativa. A executiva que a contratou afirma que não foi pressionada a fazê-lo.
O colunista também citou o exemplo de Joe Francis, criador da série Girls Gone Wild, que teria oferecido levar grande parte da equipe da Page Six para sua propriedade no México em um jato particular, para a despedida de solteiro de Johnson. Pouco depois, uma nota teria sido publicada afirmando que Francis poderia ser o próximo Hugh Hefner. Johnson também teria aceitado uma viagem gratuita na primeira classe para a cerimônia do Oscar no mês passado, como cortesia da ABC e da Mercedes-Benz, além de estadia por três noites em hotel de luxo, carro e motorista a sua disposição.
Desculpas
Segundo o advogado de Stern, Edward Hayes, seu cliente teria cometido ‘um erro. Ele pede desculpas se o caso envergonhou o Post e, como nada de verdade aconteceu, esperamos que tudo passe’, completou.
‘Eu peço desculpas por causar qualquer embaraço ao New York Post depois de quase 11 anos de serviços, e espero que eles não se apressem em me julgar’, afirmou o colunista. ‘Não fiz nada ilegal nem insinuei extorsão. Foi um erro continuar a discussão sobre investimentos em minha empresa de roupas’, insiste.
Stern se disse surpreso com os ‘colegas’ jornalistas, que não o defenderam. ‘Fico surpreso como a cobertura do caso não foi mais equilibrada’, desabafou. Ele teria afirmado que é inocente e que, quando o vídeo for visto na íntegra, isto ficará provado. O colunista também iniciou uma campanha por e-mail a repórteres, oferecendo links para matérias que questionam as acusações feitas por Burkle.
Guerra de jornais
O Daily News, que vem enfrentando forte concorrência do Post desde que este reduziu seu preço para US$ 0,25, teve um grande aumento nas vendas no dia em que publicou a matéria de capa sobre o escândalo e nos dias subseqüentes. O caso recebeu grande destaque até mesmo nas publicações que não são destinadas a fofocas.
Até a edição de segunda-feira (10/4), o New York Times havia publicado 10 artigos desde que o caso veio à tona, três dias antes. O próprio News, que deu o furo, publicou menos artigos; foram sete no total. Matérias também foram publicadas pela New Yorker e New York Observer.
‘As acusações do escândalo do New York Post mereciam destaque de capa por serem de interesse do leitor’, justificou o editor-executivo do Times, Bill Keller. Ele alegou que o caso da Page Six é uma ‘janela para o mundo selvagem, lucrativo e de conflito de interesses no jornalismo de fofocas, o qual, pelo menos em Nova York, é mais sobre dinheiro e poder do que sobre celebridades’.
O Daily News também justificou a cobertura. ‘Nós nos interessaríamos, como qualquer jornalista, na notícia de um bilionário sendo extorquido’, afirmou Martin Dunn, editor-chefe do jornal. ‘O fato de envolver alguém da imprensa é ainda mais atrativo’.
O Post, no entanto, acredita que o escândalo aconteceu devido ao sucesso da coluna. ‘A cobertura reflete o poder do Post e da Page Six. Foram a influência e a fama da coluna que fizeram da história um escândalo’, afirmou Steven Rubestein, porta-voz do Post. Informações de Campbell Robertson, Allison Hope Weiner e William K. Rashbaum [The New York Times, 8/4/06], da AP [9/4/06], de Howard Kurtz [Washington Post, 11/4/06], Joe Strupp [Editor & Publisher, 11/4/06] e Sarah Ellison [The Wall Street Journal, 11/4/06].