Muitos árabes ficaram chocados com a declaração de um importante clérigo saudita, no mês passado, que afirmou que os proprietários ‘depravados’ de emissoras televisivas que exibem ‘conteúdo imoral’ deveriam ser condenados à morte. A afirmação do xeque Saleh al-Luhaidan, no entanto, não é um caso isolado e representa a contínua controvérsia cultural que existe na TV árabe.
Ainda em setembro, outro clérigo saudita proibiu os muçulmanos de assistirem à série de TV turca Noor, muito popular nos países árabes. O programa mostra a vida de muçulmanos moderados que bebem vinho e fazem sexo antes do casamento. O episódio final teve audiência de 85 milhões de telespectadores – mais de 51 milhões eram mulheres acima de 15 anos. O programa foi dublado em árabe coloquial, e não na versão formal geralmente falada na TV. Isto é raro no mundo árabe, onde a maior parte dos programas recebe legenda. Há duas semanas, um terceiro clérigo disse que as crianças não podem assistir ao rato americano Mickey Mouse, pois o personagem infantil é um ‘soldado de Satã’ que deve ser morto.
Especialistas acreditam que estas declarações polêmicas refletem uma lacuna cultural entre os produtores e os telespectadores. A maior parte dos programas exibidos nas emissoras árabes é produzida na Síria e no Egito, mas o maior mercado árabe – a Arábia Saudita – é de longe o país mais conservador quando se trata de cultura e religião. ‘Alguns programas estão expondo as pessoas que são isoladas culturalmente à modernidade em um ritmo mais rápido do que gostariam’, avalia Ramez Maluf, professor de comunicação da Universidade Americana do Líbano.
Ameaça
O que mais incomoda, porém, é o crescente sucesso da TV e seu poder de influenciar a população. Pesquisas recentes mostram que dramas televisivos apresentam número de telespectadores nunca antes registrado. Quatro séries programadas para ser exibidas durante o Ramadã, mês sagrado muçulmano, foram canceladas – curiosamente, nenhuma continha questões religiosas ou morais. ‘Uma geração está crescendo assistindo a esta programação; muitos colocam as fotos dos personagens dos programas em seus celulares. Não se pode enviar os consumidores de volta a uma caixa fechada, e as autoridades acham isto ameaçador’, afirma um executivo de TV árabe, que prefere não se identificar.
Durante o Ramadã, que terminou no dia 30/9, as emissoras preparam uma programação especial, com o objetivo de atrair um grande número de telespectadores. Muitos dos programas têm temas religiosos, mas os que não o são atraem críticas de conservadores. Este ano, muitos executivos de TV afirmaram que houve um aumento no número de críticas e de programas cancelados.
Os países árabes vêm, há um bom tempo, tentando impedir o crescimento de cobertura crítica na TV. Este ano, diversos ministros da Informação assinaram um acordo no Cairo para impor restrições a canais por satélite que cometam alguma ofensa aos governos ou que divulguem conteúdo que incite ódio. Informações de Robert F. Word [The New York Times, 27/9/08].