Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Criança desesperança

Mais uma edição do programa Criança Esperança foi apresentada pela Rede Globo. A dinâmica do programa é bem simples: as “estrelas” da emissora, em conjunto com os cantores mais populares do país, se reúnem em um show de quase duas horas enquanto o público faz doações através de ligações telefônicas ou através do site. Em 26 anos, quatro milhões de crianças já foram ajudadas, dados estes divulgados pela própria emissora. O programa é apresentado pelo comediante Renato Aragão, embaixador na Unicef (Fundo das Nações Unidas para Infância), que ajuda crianças pelo mundo afora. Vale lembrar que a sede da ONU é nos EUA, grande potência mundial que, historicamente, gosta de invadir países em nome da liberdade e da democracia.

Nos últimos anos, vimos e ouvimos proliferar pela mídia um novo termo, uma prática recente das grandes empresas que, após anos tratando o consumidor como lixo, resolveu dar satisfações aos seus clientes. Essa nova prática, que deveria ser uma obrigação, que só começou a acontecer depois que os consumidores começaram a ter um maior conhecimento de seus direitos e ganhou o nome de responsabilidade social. A partir desse momento, o que mais se vê nos intervalos comerciais dos programas de televisão são empresas mostrando que têm “responsabilidade social”.

A Rede Globo exercita a sua responsabilidade social de uma forma diferente. Reserva uma data dentro da sua programação, no horário que foi convencionado ser chamado de horário “nobre”, portanto mais valorizado, e ainda conta com a solidariedade de seus espectadores. O espetáculo tem um padrão de qualidade que é reconhecido por todos que entendem de show, mas ser solidário com o dinheiro alheio é um acinte. Os projetos ajudados são sempre aqueles que rendem à Globo uma maior audiência, como se somente o morro do Cantagalo no Rio de Janeiro precisasse de ajuda.

Tentativa de ludibriar a população

Será que o dinheiro que a Globo ganha durante os intervalos do programa, é revertido para Unicef? Será que não é responsabilidade social criar uma emissora durante a ditadura militar? Narcotizar e idiotizar a população com novelas não é responsabilidade social? A eleição do ex-presidente e hoje senador Fernando Collor de Mello não foi um ato de responsabilidade social?

Esse termo, tão em moda, só serve para mostrar que a atitude que deveria ser considerada uma obrigação, um ato de respeito ao consumidor, ganha status de grande favor, como se as multinacionais estivessem ajudando a população espontaneamente. Empresas que sempre exploraram os recursos do país, se valendo de sua debilidade política, social e econômica.

Ter responsabilidade social com o dinheiro do trabalhador é uma afronta, é fazer pilhéria com a população, depois de quase 50 anos dominando, alienando pessoas e vendendo sonhos. Vir a público para mostrar os princípios editoriais, defender a liberdade de expressão, como se fossem os heróis da nação, chega a ser de mau gosto, além de mais uma tentativa de ludibriar a população do país.

***

[Thiago Corrêa Silva é estudante de Jornalismo, Rio de Janeiro, RJ]