Monday, 04 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Deonísio da Silva

‘Jesus nasceu antes de Cristo. Também o Brasil nasceu antes de si mesmo. No primeiro caso, quem errou a conta dos anos foi um monge chamado Dionísio, o Pequeno, que viveu no século 6. Quando os cálculos foram refeitos, a data de nascimento de Jesus foi fixada entre os anos 3 e 5 a.C.

No caso do Brasil, certo monge irlandês, ainda no primeiro milênio, registrou a existência de uma ilha do Atlântico com este nome. Vários pesquisadores, a começar por João Ribeiro, concluíram que Brasil vem do francês brésil, palavra derivada do francês antigo breze, que ainda antes do descobrimento era escrita braise. Já os italianos argumentam que seus navegadores e mercadores, bem antes de o Brasil ser descoberto, vendiam brasile a comerciantes de várias nacionalidades, incluindo a portuguesa. A palavra designava tintura extraída da casca de uma árvore de cor avermelhada, que recebera tal designação por semelhança com uma brasa acesa. Quem a comprava, utilizava a substância para, entre outros fins, tingir tecidos e ornamentar manuscritos com as famosas iluminuras.

Na língua inglesa, Brasil é escrito Brazil há muito tempo! Cada uma das citadas nacionalidades lingüísticas puxa a brasa para a sua sardinha ou para seu assado. Os dicionários dizem que assim ou assado é uma locução cujos significados se aproximam de equivalentes como tanto faz, de uma maneira ou de outra. Quem sabe a origem da expressão tenha vinculações remotas com a clássica oposição entre o cru e o cozido, grande divisor da civilização no dizer de vários antropólogos, e ofereça etapa de transição: entre o cru e o cozido, o assado. Neste caso, a expressão assim ou assado ofereceria o ato assim, intrínseco, e assado traria aperfeiçoamentos que incluiriam, no caso da carne, o fogo e o sal.

De todo modo, um só país tem este nome, ainda que nos Estados Unidos, onde encontramos Paris no Texas, existam várias localidades denominadas Brazil, que é como o nome de nosso país é conhecido internacionalmente por ser o inglês o latim do mundo atual, lugar que provavelmente perderá para o mandarim nas próximas décadas. Assim, nos EUA, o Brasil, travestido de Brazil, fica do lado de cima do Equador e nomeia lugares nos estados de Indiana, Dakota do Norte, Tennessee, Kentucky e Missouri.

Como devemos escrever o nome de nosso país? Brasil, naturalmente, embora não se possa devolver o que venha endereçado para Brazil, Brésil e Brasile. Aliás, entre nós não há lei que possibilite ordenar a bagunça de nomes de estados, de municípios e de pessoas. Para não começar criticando os outros, este escritor dá o exemplo de seu nome. Dionísio, à semelhança do que ocorre com muitos outros nomes, é grafado de várias maneiras: Dioniso, Dionizio, Dionízio, Deonizio, Deonízio e até Deonísio, como sabem os pacientes leitores desta coluna. E seu sobrenome, da Silva, atualmente na Presidência da República, enseja referências no mínimo curiosas na imprensa estrangeira. O prenome é identificação menos vaga que o sobrenome.

A palavra mais próxima do nome do Brasil aparece no século 12: é o italiano brasile, definida como espécie de madeira vermelha oriental empregada em tinturaria. Brasile aparece em textos do latim medieval, também no século 12. Enfim, italianos, franceses, espanhóis, portugueses e ingleses, ainda que remotamente, teriam herdado do latim a denominação de nosso país.

Mas de onde o italiano trouxe brasile? Provavelmente do árabe wars, designando certo tipo de madeira utilizada em tinturaria, cujo adjetivo warssu indica tom avermelhado.

As origens têm o encanto de mostrar que, à semelhança das pessoas, é o espírito das letras que as vivifica.’



JORNAL DA IMPRENÇA
Moacir Japiassu

‘Gushiken da Selva’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 20/05/04

‘Fiel leitor que se protege sob o pseudônimo de Gushiken da Selva envia ‘mancada’ do Centro de Informações das Nações Unidas no Brasil.

Acocorado sob o título Aumenta a presença de tropas da ONU no planeta, Gushiken leu:

‘Existem hoje cerca de 48 mil militares trabalhando sobre a bandeira da ONU em suas forças de paz mas até o final de 2004 este número pode subir para 70 mil’, afirma o Subsecretário-Geral das Nações Unidas para Operações de Paz, Jean-MarieGuéhenno.

Comentário do leitor: ‘Como diria Janistraquis — considerado, de que planeta vieram essas tropas?’.

Boa pergunta, Gushiken, boa pergunta. E esclareço que quem estava sob o título acima não era o leitor, porém o texto.

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Na moita?

Da considerada Tereza Cruvinel em sua coluna de O Globo:

(…) Em fevereiro, após um jantar com jornalistas em minha casa (por ele proposto com a saudável intenção de melhorar o relacionamento com a imprensa, depois de críticas feitas aqui na coluna), muitos leitores escreveram perguntando se ele bebera muito. Tomou um uísque na chegada e dois cálices de vinho no jantar. A maldade já circulava. Dela sabiam auxiliares, mas nada foi feito. Daqui para frente será vigiado pelas lentes(…)

Janistraquis, que entende do assunto, alerta: ‘Considerado, o que o presidente bebe em almoços e jantares públicos não tem a menor importância; a pergunta que deve ser feita é a seguinte: quantos copos ele entorna quando está sozinho?’.

É verdade. Alcoólatra militante esconde a garrafa até debaixo da cama.

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Sinal de perigo!

Homem se engana em fantasia sexual e é condenado, dizia o titulão; o texto discorria assim:

Da série Parece mentira, mas não é.

O resumo da história é mais ou menos este: um homem e uma mulher se conheceram pela Internet. Papo vai, papo vem, e ela confessa que sua fantasia sexual é simular um estupro (não torça o nariz, com certeza você também tem alguma fantasia bem esquisita).

No dia e hora combinados, o californiano Michael Todd Howard invadiu a casa de sua parceira. Tudo estaria perfeito se não fosse por um detalhe: Michael entrou na casa errada.

Howard só notou o engano depois de perceber a resistência para lá de exagerada da mulher. Depois de um rápido empurra-empurra, ela chutou o americano em sua parte mais sensível (sim, lá mesmo) e chamou a polícia.

O californiano foi condenado a um ano de prisão pela Justiça de San Diego. Resta saber se sentença foi dada pela invasão a domicílio, pela tentativa de estupro, ou simplesmente pela burrice extrema do réu.

Fonte: Reuters

A historinha acima, que saiu no UOL, estava esquecida nos arquivos e este colunista já se preparava para descartá-la quando Janistraquis alertou: ‘Considerado, acho bom transcrever a incrível, porém importantíssima nota; afinal, a Internet também é sítio de loucos varridos e periga que um internauta gay pode fazer amizade com algum Long Dong Silver desta vida e dar o endereço da gente!!!’.

É mesmo; à moda do pessoal aqui do C-se, digo-lhes, com pureza d’alma, que quem tem c… tem medo!

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Seqüestro

O seguinte e elucidativo texto saiu no Correio da Paraíba, amoitado abaixo do título Pais paraibanos recebem criança que foi raptada há três anos em São Paulo:

‘Criança seqüestrada em abril de 2001 em São Paulo foi devolvida aos pais paraibanos e já está em São João do Rio do Peixe. F.F.L.D., de 2 anos e 10 meses, sumiu durante exames numa maternidade paulista. Na época a família morava em Santos (SP).’

O conterrâneo Phelipe Caldas, sempre alerta, como sói acontecer a paraibanos em geral, leu e estranhou:

Será que uma menor (por mais jovem que seja) pode ser seqüestrada da barriga da mãe? Pois na verdade foi essa a informação do Correio, jornal líder de vendas na Paraíba!

Janistraquis fez as contas: quando saiu a notícia, a menina estava com 2 anos e 10 meses; foi seqüestreada em abril de 2001 e devolvida em 19 de fevereiro de 2004. ‘Considerado’, concluiu ele, ‘é claro que a menina foi subtraída ainda no útero da mãe e não sei por que o Phelipe estranhou; ora, sertanejos bons de serviço começam a sofrer muito antes de nascer!’.

Procede.

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Bebedeiras

Nosso considerado Roldão Simas Filho, diretor da sucursal desta coluna no Planalto (de cujo janelão é possível enxergar André Singer ao espelho, a ensaiar caras e bocas de Loretta Young), lia a edição de domingo do Correio Braziliense quando deparou com o seguinte trecho à página 22:

Mary Beth Cahill: Não tenho medo de usar minha habilidade para coesionar a equipe e fazê-la trabalhar numa só direção.

Nesta época de bebedeiras verbais, o experiente Roldão preferiu fazer um comentário seco e sóbrio: ‘O verbo coesionar não existe. Deveria ter sido empregado outro como articular, unir, harmonizar.’

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Grave ameaça

Celsinho Neto, diretor da nossa sucursal cearense, que para não se surpreender com mais nada neste mundo anda com uma pulga (amestrada) atrás da orelha, despachou de Fortaleza:

‘Considerado Janistraquis:

Tudo bem que os juros cobrados pelos bancos são extorsivos, mas leia esse título com característica de rogação de praga, publicado pelo jornal O Povo, manchete da editoria de economia:

BAIXA RENDA

Crédito quer atingir a 3 milhões

Ao preferir o verbo atingir em vez de atender, o editor subiu o tom da ameaça.’

Janistraquis concorda, ó Celsinho, e expeliu, logo após a leitura: ‘É mesmo muito azar um sujeito de baixa renda ser atropelado logo pelo crédito!’

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Nota dez

O melhor texto da semana foi publicado no saudoso Correio da Manhã, um dos melhores jornais deste país:

Mistério – Vítima podia já estar morta quando bateu no solo

CORPO CAI DO CÉU NA CAPARICA

Fernando Sequeira, de 85 anos, levantou-se ontem e foi regar as flores que rodeiam a casa da sua pequena horta, em Areeiro, perto da Charneca de Caparica, Almada. Uma rotina de todos os dias que foi quebrada com uma macabra descoberta.

Como não havia pressão da água, foi ao poço ver o que se passava. Descobriu que o cano fora partido pela queda do corpo de um indivíduo africano. Uma queda do nada. Uma queda do céu.

P.S. – Somente agora, quando já estava fechada esta edição, é que Janistraquis informa: o Correio da Manhã em questão não é aquele fundado por Edmundo Bittencourt e mortalmente alvejado pela ditadura militar, porém o de Lisboa. Perdão, leitores!

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Errei, sim!

‘SUSTO ARRETADO – Título do Estadão arrepiou Janistraquis: Asteróide com 6 mil toneladas ‘raspa’ a Terra. Depois do susto, o texto esclarecia: ‘Um asteróide com cerca de dez metros de diâmetro passou a 144 mil quilômetros da Terra, no dia 20 de maio’. Meu secretário abanou a cabeça: ‘Considerado, é o Estadão com sua mania de grandeza; a história desse asteróide é como se alguém de avião jogasse um caco de telha sobre São Paulo e acertasse o rabo de um canguru lá na Austrália!’ (julho de 1993)’



JORNALISMO CULTURAL
Ana Maria Bahiana

‘Outras coisas: motocicletas, mentes brilhantes’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 18/05/04

‘Vamos combinar uma coisa? ‘Diários de Motocicleta’ não é um filme brasileiro.

Portanto, não pode ser ‘nosso representante em Cannes’, ‘a aposta do Brasil para a palma de ouro’ e todos os demais lugares-comuns esperançoso-ufanistas que são de praxe quando, de fato, há uma obra brasileira em competição em algum grande evento internacional.

‘Diários de Motocicleta’ é uma co-produção EUA-Grã Bretanha (South Fork, a produtora de Robert Redford, FilmFour e Buena Vista International), escrita por um argentino, estrelada por um mexicano e falada em espanhol. O diretor, é claro, é brasileiro, e temos todo o direito do mundo de torcer por ele e ficar ululantes de felicidade se (merecidamente, aliás) seu trabalho for reconhecido. Mas se ‘Diários’ é um filme brasileiro, então ‘Tróia’ é uma película alemã…

Agora, o dia em que um filme como ‘Diários de Motocicleta’ for, de fato, brasileiro – o que é possível mas, pelo andar da carruagem, não imediatamente provável – eu serei a primeira a puxar a torcida.

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A cada novo horror que emerge das prisões do Iraque eu penso um pouco mais que a revolução, se ainda existir, será digitalizada.

Quanto tempo mais esta ferida ficaria fechada, acumulando pus e terrores, sem a existência da precisão, discreção e rapidez das câmeras digitais?

O tempo que levou, talvez, para que viessem à tona as sombras da Operação Condor, que, na década de 70, derrubou Allende e ‘desapareceu’ brasileiros, chilenos e argentinos: 30 anos. E sem termos a história completa – assunto, aliás do documentário ‘Condor’, de Roberto Mader, um dos projetos agraciados com o investimento da Petrobras, este ano.

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Levou o tempo normal de maturação de uma segmentada, mas OutraCoisa, também conhecida como ‘a revista do Lobão’, se encontrou. Está gostosa, firme, ágil. Tem todos os sinais de uma boa publicação na sua faixa – a mistura complicada de militância e objetividade, paixão e garimpo. Sobretudo, está nacional – em vez de regional, São Paulo-talvez-Rio – o que é absolutamente essencial.

Não gosto de revistas com penduricalhos extras, mas, no caso da OutraCoisa, os Cds se justificam pelo próprio perfil da revista, seu lado aventureiro num mercado – o musical – em mutação. E Mombojó é um luxo só!

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A complicação essencial de quem cobre a área de entretenimento é o dilema da convivência com um mundo infinitamente mais rico, poderoso e, obviamente, tentador.

Duas historinhas recentes podem servir de parábola.

A primeira aventura de um pobre repórter por este mundo das maravilhas termina mal – o crítico de cinema Elvis Mitchell, até pouco tempo estrela ascendente do caderno Arts & Leisure do New York Times (olha ele aí de novo…) sumiu abruptamente das ilustres páginas. Consta que a razão foi ciumada com outro crítico – A.O.Scott – por conta de prioridades e promoções. Nas entrelinhas, contudo, a narrativa é outra: a direção do suplemento teria descoberto que Elvis estava conversando com a Warner Brothers para ser o chefe da recém-criada Warner Independent, em Nova York.

Da segunda aventura não sei bem a moral: uma auditoria corriqueira das contas da produtora Imagine revelou que Graydon Carter, editor da Vanity Fair, recebeu cem mil dólares como ‘consultor’ do filme ‘Uma Mente Brilhante’. Carter entende xongas de física, mas sugeriu o livro homônimo ao seu amigo Brian Grazer, um dos donos da Imagine, dizendo que a obra daria um belo filme.

Não é a primeira nem a será a última tertúlia cinematográfica do editor. Ele e dois amigos acabam de rachar um milhão de dólares de adiantamento da Miramax Books – editora agregada à mini-major – pela publicação de uma antologia de artigos da defunta revista Spy, da qual Carter foi editor.

E no fina do ano o público poderá ver Carter em pessoa nas telas, fazendo uma ponta no remake de ‘Alfie’, da Paramount. Pelo seu trabalho em tres dias no set, Graydon Carter recebeu um cachê de 12 mil dólares.’