Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

A hora e a vez das plataformas móveis

Na década passada, diante do crescimento da internet, o jornalismo tradicional entrou em um período de sufoco. Primeiro veio o susto com a migração dos leitores e dos anunciantes, depois a compreensão da necessidade de se adaptar ao novo meio. Até hoje discute-se, e muito, a transição do papel para o digital. Agora, “imagine voltar para os anos 90 e ajudar as empresas jornalísticas a tomar decisões-chave que previnam a crise gerada pela internet”. A proposta é de Cory Bergman, co-fundador do Next Door Media, portal de jornalismo comunitário na região de Seattle. Em artigo no site do Instituto Poynter, ele afirma ser esta a oportunidade que temos hoje diante da internet móvel. Para Bergman, trata-se de nada menos do que “a segunda grande onda prestes a colidir com a imprensa”.

Hoje, para competir no mundo das notícias, as empresas devem adotar um pensamento que dê prioridade aos aparelhos móveis e crie um modelo de negócios sustentável. Mas muitas redações veem a internet móvel como apenas “mais uma plataforma” além do computador, e não como algo separado e completamente novo. “A realidade é que vivemos em um mundo multi-tela, e o mundo de aparelhos móveis não opera paralelamente ao mundo dos desktops”, diz o colunista Henry Blodget, da Business Insider, em seu blog. “Para alguns serviços, como os de notícias e de informação, a tela do desktop ainda é de longe a mais dominante. Abandonar essa tela ou se adaptar primeiramente a outra tela não faz sentido”.

Muitos jornalistas e executivos de mídia têm esta mesma visão. Bergman, por sua vez, discorda dela; ele acredita que estas pessoas estão vendo apenas uma parte da questão, e não o todo. Suas razões:

1. O design responsivo não funciona para aparelhos móveis

A revolução móvel trata de uma ruptura de receita, mais do que de design e distribuição.

Em 1996, quando os jornais gozavam de grandes lucros, duas empresas fizeram sua estreia na internet. Uma das companhias praticamente destruiu a maior fonte de renda dos jornais e a outra acabou gerando mais renda com publicidade do que toda a indústria jornalística junta.

Craigslist e Google criaram novos modelos de negócios viabilizados pela tecnologia. Da mesma maneira, os dispositivos móveis estão permitindo novos modelos de negócios, e os dois grandes impulsores disso são as possibilidades de geolocalização e de pagamentos digitais.

Existe uma pequena janela de oportunidade para investir ou adquirir essa tecnologia e modelos de negócios que podem aumentar a receita dos jornais. Um design responsivo é essencial para os sites de notícias, mas não é a estratégia da “mobilidade”.

2. A tecnologia móvel não apenas ultrapassará os desktops, mas irá erodi-los

“Nos próximos 12 a 18 meses, muitas organizações de notícias irão ultrapassar o limite de mais de 50% de usuários visitando seus sites via telefones ou tablets, em vez de desktops ou notebooks”, explica Fiona Spruill, editora de plataformas emergentes do New York Times. “Os números falam por si mesmos”.

Isso já está acontecendo com o jornal britânico The Guardian em certos horários. Os aparelhos móveis serão a tela dominante até o início do ano que vem. Um número cada vez maior de pessoas está visitando determinadas marcas apenas através de aparelhos móveis. No ano passado, quase 100 milhões de pessoas passaram a usar o Facebook através de telefones ou tablets, sem tocar em seus desktops. O Google reportou quatro meses de queda em buscas via desktop e uma explosão de buscas via aparelhos móveis.

3. A queda no uso do desktop irá pressionar a receita dos jornais

Enquanto os usuários mudam suas plataformas, a indústria terá que enfrentar a queda de receita, a menos que consiga criar novas formas de lucro via internet móvel para compensar o declínio. De muitas formas, isso é similar à transição da forma impressa para a digital. Levar um modelo existente para outra plataforma não é a solução.

O Google e o Facebook, juntos, já controlam 70% de todos os dólares em publicidade móvel. Junto com a geolocalização, a busca local é um grande negócio. O Google recentemente criou um novo produto que permite anunciantes ofertarem em buscas de aparelhos móveis próximos fisicamente de seus negócios. Por exemplo, é possível anunciar um determinado restaurante para todos que procuram por “comida” no Google estando próximo ao restaurante. É difícil para os banners tradicionais competirem com esse tipo de tecnologia.

Alguns jornais começam a perceber uma tração nos preços de seus anúncios, o que pode trazer a ideia de assinaturas para aparelhos móveis. Mas a maioria das organizações ainda está experimentando com a tecnologia e ainda existe uma grande dependência de empresas como Apple, Google e Amazon.

4. Notícias devem resolver problemas

Um estudo feito no fim do ano passado descobriu que a leitura de notícias só corresponde a 2% do tempo gasto em internet móvel. Aplicativos sociais chegam a 26%. Segundo o Comscore, em dezembro o Facebook sozinho chegava a até 23% do tempo gasto.

Enquanto o Facebook e o Twitter crescem em tempo gasto, e já que os dois são povoados por vários compartilhamentos de notícias, as redes sociais competem cada vez mais com as organizações de notícias.

Como resultado, simplesmente estender a cobertura dos jornais para os aparelhos móveis não é suficiente. É preciso criar uma forma de mensurar a renda para os anunciantes. A tecnologia móvel não é meramente “outra” plataforma, mas um ecossistema inteiramente novo.

5. Empresas de tecnologia estão investindo na plataforma móvel

Ano passado, o Google começou a priorizar a tecnologia móvel. Depois o Facebook. Depois o Yahoo. Essas companhias estão investindo em uma escala impressionante, adquirindo empresas de tecnologia para plataformas móveis e aumentando suas equipes.

Enquanto isso, surgem novos negócios para as áreas de comunicação, notícias, publicidade e serviços. Eles estão atraindo milhões em investimentos e algumas das mentes mais geniais do ramo.

A ideia de simplesmente expandir os modelos de negócios para a plataforma móvel em vez de investir em inovação é preocupante. É por isso que organizações de notícias deveriam priorizar essa tecnologia imediatamente. Isso não significa ignorar os desktops, mas priorizar a nova plataforma ao arquitetar um novo produto, conduzir pesquisas e escrever relatórios.

Também é necessário falar menos sobre mídias sociais e mais sobre plataformas móveis. De muitas formas, as redes sociais viraram uma grande distração, tirando a atenção de jornalistas das mudanças radicais acontecendo em seus negócios. As redes sociais são importantes, mas não se deve esconder que essas plataformas competem cada vez mais por atenção e por dinheiro.

“Quando a internet era nova, muitos de nós fomos para ela com criatividade e energia”, diz Regina McCombs, professora de tecnologia móvel do Poynter. “Agora, enfrentamos um potencial ainda maior e vários desafios para desenvolver uma audiência, enquanto ainda temos poucos investimentos. É assustador”.