O processo já é conhecido: primeiro vem o telefonema à redação, normalmente de um conselheiro do primeiro-ministro, que informa o descontentamento com os artigos de um colunista. O colunista é repreendido. “Diminua o tom”, pedem os chefes. O colunista se mantém firme em seus pontos de vista e acaba demitido.
Com medo de irritar o autocrata primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdogan, executivos de mídia começaram um “abate”. Muitos lembram da multa de 2,5 bilhões de dólares imposta em 2009 ao Dogan Group, o maior conglomerado midiático do país. Seu dono, Aydin Dogan, foi forçado a diminuir seu império e demitir os críticos ao governo para diminuir a pressão.
No entanto, Ercan Ipekci, presidente do sindicato dos jornalistas do país, diz que os demitidos são “sortudos”. A Turquia é hoje a nação com o maior número de jornalistas presos do mundo. As estimativas variam, mas ao menos 49 estão na cadeia. O Índice de Liberdade de Imprensa de 2013, publicado pela organização Repórteres Sem Fronteiras, lista a Turquia na 154ª posição de 179 países, atrás do Mali e do Afeganistão.
O governo alega que a maioria dos jornalistas presos violou as leis antiterrorismo do país. Ipekci discorda, citando o caso de Omer Celik, que pode ser condenado a 15 anos de cadeia por “agir sob as ordens de uma organização terrorista”. Muitas das evidências contra ele focam em suas reportagens sobre um “partido político” (provavelmente uma alusão ao partido pró-curdos Paz e Democracia).
Um número crescente de profissionais de imprensa está apelando à autocensura. A cobertura dos casos de corrupção ligados ao governo é uma área proibida, assim como o apoio turco aos rebeldes sírios.
Um novo projeto de lei irá diminuir o âmbito de aplicação das leis contra “crimes terroristas”, parte de uma tentativa de Erdogan para conseguir paz com os curdos. Grupos de direitos humanos não estão impressionados. “Se o projeto passar em sua forma atual, representaria outra oportunidade perdida para se fazer reformas genuínas nos direitos humanos”, declarou a Anistia Internacional.
“O Ocidente não é melhor que a Turquia”
Ironicamente, os jornais estão apontando suas críticas para a Alemanha, onde jornalistas turcos reclamam que estão tendo seu acesso negado ao julgamento da morte de 10 pessoas entre 2000 e 2007, sendo oito delas turcas, por um grupo neonazista. Ao distribuir somente 50 lugares para a imprensa durante o julgamento, a corte de Munique parece tentar manter o assunto somente dentro do país.
Membros do partido governante, chamado Justiça e Desenvolvimento, apontam o caso como uma prova de que “o Ocidente não é melhor que a Turquia”. Mesmo com suas falhas, diz o argumento, o partido tornou o país mais democrático.
É verdade que o primeiro-ministro fez mais que seus rivais seculares para controlar os generais e acomodar os turcos. Nos tempos de fraco governo de coalizão, jornalistas curdos eram torturados e mortos às dezenas e os chefes da mídia curvavam-se ao Exército. Mas, após 10 anos de governo, os argumentos do Partido Justiça e Desenvolvimento estão se tornando fracos – e coitado do jornalista que ousar falar isso em público.