O adolescente Salaheddin Barhoum, de 16 anos, e seu amigo Yassine Zaimi, 24, que apareceram na primeira página do New York Post como suspeitos do atentado na Maratona de Boston, em abril, abriram uma ação de difamação contra o jornal. O Post não identificou os dois por nome, mas eles alegam que amigos e colegas de trabalho os reconheceram.
Segundo a ação, as fotos e artigos publicados três dias depois do ataque fizeram parecer que agentes do FBI estavam perseguindo Barhoum e Zaimi – que, na verdade, apenas assistiam à maratona. Na noite da publicação do artigo, autoridades divulgaram fotos dos verdadeiros suspeitos, Tamerlan e Dzhokhar Tsarnaev.
Os advogados de Barhoum e Zaimi acusam o Post de calúnia, imposição negligente de perturbação emocional e invasão de privacidade. Eles querem ressarcimento de danos, incluindo financeiro. “A capa faria com que um leitor racional pensasse que eles tinham bombas em suas mochilas e que estavam envolvidos no atentado da Maratona de Boston”, alega a ação.
Em abril, o editor-chefe do Post, Col Allan, defendeu a cobertura, afirmando à Associated Press que o jornal noticiou precisamente que a imagem havia sido enviada a funcionários envolvidos na investigação do atentado. “Não os identificamos como suspeitos”, justificou.
Barhoum e Zaimi são marroquinos e receberam o visto americano há quatro anos. Zaimi mudou-se sozinho para os EUA, onde conheceu a família de Barhoum, quando eram locatários da mesma casa. Ele conseguiu um trabalho numa lanchonete cinco dias depois de ter chegado ao país e trabalha atualmente em uma empresa de serviços financeiros, além de estudar administração. Ele também gosta de correr – por isso, ele e Barhoum, que também corre, foram para a linha de chegada mais cedo naquele dia, inocentemente achando que iam participar da corrida.
Zaimi tinha participado da corrida de cinco quilômetros no ano anterior, que havia começado no local em que estavam, e achou erroneamente que a maratona começaria no mesmo lugar. Mas organizadores do evento lhe disseram que o início da corrida era a 40 quilômetros dali. Envergonhados com a situação, eles ficaram no local e conversaram com quenianos e etíopes que estavam reunidos para receber os corredores de elite. Duas horas antes de as bombas explodirem, foram embora.
Mau jornalismo
Na caçada por suspeitos, fotógrafos da linha de chegada publicaram material no Reddit, plataforma de mídia social onde os usuários postam informações com links para sites de internet. No dia 17/4, amigos alertaram a Zaimi e Barhoum que suas fotos estavam online. Naquela noite, eles decidiram ir à polícia. Autoridades questionaram os dois e lhes disseram que não eram suspeitos. No começo daquele dia, o FBI chegou a pedir às organizações de mídia mais cuidado, devido às inúmeras informações errôneas divulgadas. No dia seguinte, os dois foram capa do New York Post. Uma pequena manchete dizia que funcionários federais estavam atrás deles.
Um artigo pequeno na capa afirmava que “não há evidência direta relacionando os dois ao crime, mas autoridades querem identificá-los”. Na parte interna do jornal, mais fotos mostravam seus rostos junto com um artigo que não os identificava. Mas, segundo advogados, a matéria sugeria claramente que eram suspeitos.
A princípio, os dois não ficaram sabendo do artigo. Quando Zaimi chegou ao trabalho, o vice-presidente da empresa o chamou em seu escritório – ele só veio a entender o motivo quando um colega lhe mostrou o jornal. Zaimi imediatamente começou a chorar, sua boca ficou seca e ele pensou que estava tendo um ataque de pânico. Ao voltar para casa, na estação de trem, muitos apontavam para ele. Desde então, Zaimi sente-se deprimido e parou de correr. Ele não tem família nos EUA. Já Barhoum, que é estudante, foi para uma corrida naquela manhã. Quando chegou em casa, diversos repórteres estavam interrogando seus pais – um lhe mostrou a foto doNew York Post. O adolescente começou a suar e tremer, sentindo-se tonto e com náuseas.
Max Stern, um dos advogados de Barhoum, acusou o jornal de discriminação racial e afirmou que pedirá à corte para forçar oPost a divulgar sua fonte de informação. “Que tipo de estereótipo e discriminação levou o jornal a pensar que estava tudo bem em fazer isso? E eles teriam feito o mesmo se fossem jovens brancos andando com uma mochila?”, indagou.
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