Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Sem resultados, França deve afrouxar lei antipirataria

A tentativa francesa de acabar com a pirataria digital no país cortando a conexão de violadores das leis de direitos autorais está prestes a acabar, e sem resolver o problema. Em 2009, o governo francês, liderado por Nicolas Sarkozy, aprovou o que é considerada a lei antipirataria mais rígida do mundo, tentando diminuir o compartilhamento ilegal de arquivos e desacelerar a erosão da indústria midiática.

Infratores reincidentes e que ignoraram duas advertências para parar de baixar filmes ou músicas ilegalmente eram confrontados com a possibilidade de suspensão da sua conexão com a Internet. A lei foi imitada em diversos outros países, mas sempre com penas mais brandas.

Hoje, sob a presidência de François Hollande, a ministra de Economia Digital, Fleur Pellerin, disse que a suspensão de conexão com a Internet é incompatível com as esperanças de fomentar o crescimento da economia digital. “Hoje é impossível cortar o acesso de alguém à internet. É como cortar o abastecimento de água”, resumiu ela.

Um relatório preparado para o governo em abril também recomenda substituir a pena de corte ao acesso à rede por multas de 60 euros, além de fechar a agência de fiscalização, conhecida como Hadopi, e transferir algumas de suas funções para o órgão regulador de mídia do país. Alguns legisladores, como o socialista Patrick Blonche, vão mais longe e sugerem que o governo deveria eliminar totalmente o sistema de avisos e penalidades para esses casos.

Exemplo

Apesar de todo o debate, evidências de que o sistema funcionou continuam pequenas. Relatórios norte-americanos e estudos encomendados pelo Hadopi mostram que houve queda de downloads ilegais e o direcionamento de usuários para o iTunes. No entanto, a indústria musical francesa continua em crise, com queda de receita de 6,7% no primeiro bimestre do ano. Enquanto isso, a SNEP, gravadora francesa, disse que o número de visitas a sites de downloads ilegais cresceu 7% de janeiro de 2010 a janeiro de 2013.

Guillaume Leblanc, diretor da SNEP, disse que a empresa está disposta a desistir das ameaças de desconexão, desde que o sistema seja preservado. Ele afirmou ainda que o valor proposto de 60 euros para a multa para os violadores é muito baixo.

Mesmo com centenas de milhares de advertências enviadas pelo Hadopi, apenas algumas chegaram à suspensão de fato. “Se você não pode cortar cabeças para dar o exemplo, a guilhotina inspira menos medo”, diz Jérémie Zimmermann, porta-voz de um grupo contrário à lei.

Educação

Apoiadores da lei dizem que o corte ao acesso à Internet nunca foi o objetivo primordial. “O objetivo sempre foi ser uma medida educacional e desencorajadora”, afirma Frances Moore, chefe-executiva da Federação Internacional da Indústria Fonográfica.

Um abrandamento do sistema francês poderia deixar a Coreia do Sul – que implementou uma lei similar em 2009 – como o país com as leis antipirataria mais duras. Mais de 400 contas e sites sul-coreanos foram suspensos desde que a lei entrou em vigência. A receita das gravadoras cresceu 26% no país, entre 2008 e 2012. A eficiência da lei, no entanto, é questionável, pois o período coincide com o surgimento do fenômeno pop do país, impulsionado pelo rapper Psy e a moda da música “Gangnam Style”. Em março, a Comissão Sul-Coreana de Direitos Humanos recomendou que a medida deveria ser revista.

Outros países optaram por soluções menos draconianas, algumas vezes envolvendo acordos com o setor privado. Nos Estados Unidos, por exemplo, cinco grandes provedores concordaram em ativar o sistema de proteção a direitos autorais. Sanções, que incluem a diminuição da velocidade de acesso à Internet, não são colocadas em prática até o envio de ao menos cinco avisos.

Analistas alegam que o recuo francês pode diminuir o entusiasmo de legisladores por sistemas semelhantes em outros países. “Olhando para isso politicamente, pode ser mais difícil optar por repostas assim em outros lugares”, diz Brett Danaher, professor que estudou os efeitos do Hadopi nas vendas do iTunes.

Ele e outros especialistas dizem que legisladores devem dar mais atenção para o bloqueio de sites que hospedam conteúdo ilegal, em vez de perseguir usuários individuais. Moore diz que nenhuma estratégia provê uma solução fácil: “Temos que tomar uma aproximação holística. O bloqueio de sites e advertências são apenas duas ferramentas”.