Quais são os indicadores, ou qualidades, a serem adotados para rastrear se um publisher está no caminho certo para transformar seu negócio num futuro mais sustentável? Essa foi a pergunta feita pela Associação Mundial de Jornais (WAN-IFRA) a analistas e consultores de mídia que especializados em análise crítica da mídia e na pesquisa de novos modelos de negócio para a imprensa..
Ao longo deste ano, a entidade consultará uma serie de especialistas e editores para tentar identificar quais os publishers que estão no caminho certo em projetos de adaptação de jornais ao novo contexto digital . Entre os nomes consultados, a WAN-IFRA selecionou alguns cujas opiniões são sintetizadas a seguir. A instituição, que reúne os donos e editores de jornais do mundo inteiro, pede que as empresas não contactadas entrem em contato com dean.roper@wan-ifra.org e enviem suas sugestões. Seguem as observações recolhidas:
Ken Doctor, analista de mídia, Estados Unidos
Entre os principais indicadores numa transformação, eu procuro:
Percentual de compartilhamento entre a receita proporcionada pelo leitor comparada à receita publicitária – Atualmente, a receita proporcionada pelo leitor – em jornais impressos, digitais ou de qualquer tipo de acesso – é intrinsecamente mais estável e projetável do que a publicidade. Quando os jornais alcançam uma situação de receita da maioria dos leitores, a busca pela transição para um leitor basicamente digital torna-se mais fácil.
Percentual de despesas dedicadas à produção de redação/conteúdo – As melhores empresas – tanto no que se refere a seus produtos quanto à transição de seus negócios – registram cerca de 20% das despesas totais. Entretanto, nos Estados Unidos a média é de 13%. A maioria das empresas jornalísticas vem diminuindo continuamente a qualidade de seus produtos impressos e digitais e aumentando os preços. Numa comparação, é como se uma garrafa de Coca-Cola de 2 litros custasse 1 dólar e depois o preço subisse para 2 dólares por uma garrafa de 1 litro. Isso, na realidade, foi o que fez a maioria das empresas jornalísticas.
Percentual da receita por digital e impresso – Esse é um indicador mais difícil, pois é fácil ganhar um compartilhamento digital, considerando a pressa da perda do jornal impresso. No entanto, em última instância, a necessidade de superar os 30% de que a receita fossem digitais – o número do New York Times – é fundamental para a transição. De novo, os 50% da receita digital maioritária são um marco importante a ser alcançado em 2018-2019. Se esse número puder ser alcançado sem perda da capacidade de produzir conteúdo, então a empresa está indo pelo caminho certo.
Percentual de receita publicitária digital com origem em conteúdo de marca – Um indicador fundamental para 2016-2018.
Percentual de leitores deste milênio – Com o objetivo de, pelo menos, não fazer uma sub-indexação para esse grupo.
Kevin Anderson, fundador e diretor da Ship’s Wheel Media, Estados Unidos
No momento, estou observando algumas qualidades/critérios porque eles representam os maiores desafios que já vi enquanto editor-executivo de quatro jornais do grupo Gannett.
Novas ideias de receita que não só funcionem em grande escala, mas também para jornais menores, com enfoque local – O digital recompensa a escala maciça, mas para os jornais locais, mesmo aqueles que pertencem a um grupo, a receita localmente controlável não funciona em escalas tipo Google/Facebook.
Fazendo crescer audiências por aplicativos móveis e receita – Como eu disse em meu mais recente texto para The Media Briefing, se não o conseguirmos fazer através dos aplicativos móveis, então eu sinceramente acredito que isso irá decidir se muitos jornais têm um futuro de longo prazo.
Alcançar audiências mais jovens – Este era um dos principais objetivos da reorganização das Redações do Futuro, da editora Gannett (que receio que não se venha a concretizar devido a uma falha na entrega de eficiências de produção a um custo esperado). Isso é fundamental para algumas publicações que acompanham a idade média de seus consumidores subir a cada ano. Algumas publicações estão literalmente morrendo com sua audiência. E as empresas terão que desenvolver estratégias para alcançar audiências através de aplicativos de mensagens, e não de redes sociais como o Facebook.
Kalle Jungkvist, consultor de estratégias digitais, Suécia
Existem várias áreas para as quais acredito que as organizações jornalísticas tradicionais deveriam voltar seu enfoque, mas aqui vão três indicadores fundamentais que deveriam ser reveladores da realização de uma transição amadurecida:
Uma mudança perceptível no enfoque coletivo da empresa, na qual empreender um negócio diversificado, digital e sustentável se torna o principal objetivo estratégico e publicar um jornal é apenas parte desse negócio. Isso exige uma guinada considerável no tratamento dado à cultura, à liderança, à mentalidade – assim como ao fluxo de trabalho –, às tecnologias e aos tipos de jornalismo.
A capacidade de transformar a tradicional receita publicitária em desktop em receita por aplicativos móveis.
A capacidade de melhorar o tráfego, a frequência e o alcance digital tradicional e alcançar um publisher que acumulou, assim como distribuiu nas plataformas sociais – em outras partes de seu negócio – e criou novas oportunidades de negócios a partir dessas atividades. Isto poderia significar novas abordagens verticais, mercados, atividades de comércio digital ou, em seu conjunto, desenvolver e investir em novos negócios (talvez separados) digitais.
Eamonn Byrne, diretor de The Byrne Partnership
Nada do que se segue é particularmente novo, mas é raro encontrar todas essas qualidades em uma organização.
Vivendo dia por dia. Uma estratégia que reflita a relativa receita resultante da contribuição de fluxos herdados e de novas receitas (uma contribuição concreta, e não suas esperanças ou sonhos).
Que o que você diga corresponda ao que você faz. Objetivos claros, bem transmitidos e os processos completos (projetos de longo e curto prazo, orçamentos, estruturas)
Venda o que quiserem. Táticas que realmente reflitam a natureza multimídia das necessidades de nossos clientes e parceiros, e não apenas o que nós queremos vender disfarçado de estratégia de vendas com origem no mercado
Aborde situações difíceis com determinação. Esteja disposto a mostrar que o rei está nu numa atmosfera em que questões difíceis são abertamente discutidas em busca de resoluções, e não num debate filosófico.
Dê continuidade a suas ações de forma implacável e sistemática. Muitas iniciativas que hoje são cruciais parecem desaparecer amanhã. Uma estratégia fraca torna-se pior devido a uma continuidade ineficiente. Uma estratégia positiva torna-se negativa por falta de continuidade.
Conheça os pontos fortes de sua equipe e contrate de acordo com esses princípios. Se o detalhe for um de seus pontos fracos, procure alguém que não seja – o Demônio, assim como o sr. Fracasso, seu parceiro, está nos detalhes (e muitos deles estão à espreita nas promessas de planejamento e realização).
Os tempos e as equipes estão mudando. No hospício multimídia do século 21 não basta parecer bom e soar bem enquanto você esfrega sua marca na cara do mercado. Você precisa de equipes fortes, inteligentes, educadas e motivadas – e para sua criação você precisa de dinheiro e uma administração inteligente.
Uma disposição para analisar e medir a atividade, e não apenas os resultados. As perguntas formais sobre indicadores em atividade devem incluir – mas não exclusivamente – uma sindicância sobre o conteúdo e, principalmente, equipes e departamentos voltados para o mercado que identifiquem e exponham os níveis e os resultados dos indicadores em atividade. Uma alternativa mais simples e melhor do que as análises do Google.
Uma estratégia para alcançar e envolver uma juventude obcecada por aparelhos. Uma estratégia de alcance e envolvimento eficiente para este milênio.
Conteúdo de qualidade, seja qual for a fonte. Uma estratégia de conteúdo verdadeiramente multimídia que incorpore canais e conteúdo (pago ou não) e uma saudável política de século 21 rumo ao conteúdo pago e patrocinado.
Douglas McCabe, diretor-presidente da Publishing & Tech, Reino Unido
Em primeiro lugar, nossa hipótese mais ampla:
Por vários motivos, acreditamos que as marcas jornalísticas precisam de um novo enfoque em relação à sua audiência básica e precisam reforçar as diferenças entre suas posturas. As tendências da publicidade na mídia impressa e digital vão caminhando em direções ineficientes, com algumas exceções. Não estamos dizendo que no futuro não existirão organizações jornalísticas com financiamentos baseados, em grande parte, na publicidade; certamente existirão, mas a tendência é que existam numa escala menor que a de seus antecessores impressos e que sua existência seja relativamente pequena.
Acreditamos que um maior número de publishers comece a transitar de um modelo operacional de administração de provedor de conteúdo para o de oferecer serviços. No longo prazo, esses serviços serão definidos da maneira que os varejistas os imaginavam. Os serviços serão avaliados pela qualidade de seus conteúdos e pelas soluções de acesso (os “pontos de toque” do consumidor) entregues a um amplo conjunto de grupos de uma audiência claramente segmentada e dirigida. Os pontos de toque, entre um grande número de manifestações da marca, ficarão perfeitamente costurados juntos. Assim como os varejistas, os publishers ficarão obcecados com o comportamento de rastrear dos usuários e irão ajustar, na prática e rapidamente, suas experiências com os pontos de toque para otimizar o fornecimento. Os serviços irão melhorar a cada dia.
Os publishers desenvolverão modelos de filiação e acabarão por finalmente evitar termos inúteis, como paywall. Modelos de filiação amadurecidos irão oferecer acesso gratuito, assim como pago, e poderão oferecer níveis de serviços de bronze, de prata e de ouro. Os serviços irão incluir pacotes de conteúdo, sinais de vigilância, resumos semanais de jornais impressos, elementos sociais e interativos, eventos e comércio digital. O vídeo se tornará parte integral da comunicação. Os publishers irão resolver como tratarão de modo eficiente o consumo de conteúdo da marca fora do website (no Facebook, no Twitter etc.).
Algumas marcas jornalísticas irão oferecer serviços verticais especializados (saúde, meio ambiente, energia, educação etc.), enquanto outras irão enviar para a cobertura de apenas um, ou alguns, serviços verticais.
Alguns publishers irão sobreviver através de alianças e colaborações, ou tornando-se provedores de serviços – de notícias, de opinião e de conteúdo de artigos – para outros tipos de organização.
A publicidade será substituída por uma série de serviços de marketing privado que, naturalmente, além de incluírem anúncios também incluirão um amplo conjunto de iniciativas de marketing e conteúdo. Poderão criar intercâmbios privados em colaboração com o publisher e/ou outros parceiros. Alguns publishers, ou alianças, poderão, na realidade, tornar-se agências.
Os publishers irão incentivar uma cultura de inovação e estabelecer indicadores de desempenho para o desenvolvimento da audiência e do mercado. Também irão avaliar a influência e o impacto junto a suas audiências e ampliar os objetivos sociais: de nada adiantaria fazer tudo isso e tornar-se uma marca enfadonha que consumidores e empresas apenas usam por usar.
Em segundo lugar, os indicadores de desempenho que procuramos incluem:
Receita (separar usuário/sócio de marketing)
Receita média por sócio (ou pelo menos usuário)
Lucro – prova de sustentabilidade
Volume de sócios; volume de pontos de toque do consumidor
Duração média por ponto de toque
Avaliação da inovação (definida por cada inovação)
Influência e impacto
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Dean Roper é diretor de Criação da Associação Mundial de Jornais .