O julgamento do agente secreto acusado de dar o golpe que matou a fotojornalista Zahra Kazemi, espancada em uma prisão no Irã há um ano, terminou abruptamente no domingo, 18/7, depois de apenas três sessões no tribunal. A advogada e ganhadora do Prêmio Nobel da Paz Shirin Ebadi, que representa a mãe de Zahra no julgamento, deixou o local ameaçando levar o caso a organizações internacionais se oficiais de alto escalão não forem intimados a depor. Ela acusa o juiz de ignorar provas que sugerem que um oficial do judiciário teria aplicado o golpe fatal na fotojornalista.
Na ocasião do crime, o sistema judiciário iraniano inicialmente anunciou que Zahra havia morrido naturalmente em conseqüência de um derrame. Um inquérito do governo mostrou posteriormente que ela recebeu uma pancada na cabeça enquanto estava presa, o que partiu a caixa craniana e causou hemorragia cerebral.
Em um emocionante testemunho no sábado, 17/7, a mãe da fotojornalista disse que seus dedos das mãos e dos pés e o nariz estavam quebrados e que havia marcas de queimaduras em seu peito. Além disso, ela contou que oficiais iranianos a forçaram a concordar que o corpo da filha fosse enterrado no próprio país, evitando assim que ele fosse para o Canadá e sofresse novas autópsias.
Bode-expiatório
Mesmo com a brusca interrupção do julgamento, o agente acusado pelo assassinato, Mohammad Reza Aghdam Ahmadi, foi inocentado – o veredicto foi conhecido com uma semana de atraso. A decisão foi comemorada pela família de Zahra, pelo governo iraniano e por grupos defensores dos direitos humanos, que receavam que o agente fosse apenas um bode-expiatório para acobertar suspeitos em cargos superiores. Membros da equipe da advogada Shirin Ebadi afirmaram à Reuters [24/7/04] que irão pedir que o caso seja reaberto para que o verdadeiro culpado pela morte de Zahra possa ser punido.
Onda de repressão
O promotor público Saeed Mortazavi ordenou que os jornais iranianos não publicassem a cobertura do julgamento. Diversos repórteres contaram que Mortazavi ligou pessoalmente para suas redações para dar a instrução de não noticiar os acontecimentos do tribunal. A maior parte dos jornais iranianos ficou acuado e obedeceu a ordem, afirma Ali Akbar Dareini [AP, 19/7/04].
A volta à tona do caso de Zahra parece ter levantado uma onda de repressão no país. Na semana passada, dois jornais diários e uma publicação mensal foram suspensos por período indeterminado, acusados de insultar o governo, fazer propaganda contra o regime e publicar notícias falsas.
São eles o Vaghayeh Ettefaghieh, onde a maior parte da equipe é formada por repórteres provenientes do jornal Yas-e no, suspenso em fevereiro deste ano; o recém-nascido Jomhouriat, que havia publicado apenas 12 edições; e o mensal Aftab, publicado desde 2000 por um grupo de escritores e intelectuais, cujo editor, Issa Sahakhiz, foi preso no ano passado, acusado de fazer propaganda contra o regime.
Segundo a organização Repórteres Sem Fronteiras [19/7/04], as suspensões são um exemplo ‘da deplorável chantagem usada pelo chamado ‘sistema de justiça’ iraniano e pela linha-dura do regime para silenciar qualquer fonte de informação independente, especialmente durante o forjado julgamento dos assassinos da jornalista Zahra Kazemi’.