Quando o presidente americano George W. Bush, em coletiva conjunta com o presidente Vladimir Putin, levantou a questão da falta de liberdade de imprensa na Rússia, dois jornalistas russos se opuseram, mencionando casos de falta de liberdade de imprensa também nos EUA. Como aponta Peter Baker, do Washington Post [25/2/05], não por acaso, ambos faziam parte do seleto grupo de profissionais de imprensa que acompanham Putin. ‘Nossa mídia regional e local comumente critica o governo’, disse um deles. Mas os repórteres da comitiva do presidente russo não podem se dar ao luxo de criticá-lo, pois trabalham para veículos controlados pelo Estado ou totalmente fiéis a ele.
A realidade da Rússia hoje é que os canais de televisão dão notícias aprovadas previamente pelo Kremlin. As perguntas dos jornalistas a autoridades muitas vezes são combinadas de acordo com a conveniência delas. A justiça existe, mas raramente um tribunal se atreve a condenar o governo. Nas eleições, a oposição que representar algum tipo de ameaça é, de alguma forma, tirada do páreo, e o parlamento se reúne apenas para sancionar o que o grupo de Putin determina.
Um dos jornalistas que discutiram com Bush trabalha para o Kommersant, jornal que pertence a um inimigo do presidente, Boris Berezovsky, mas escreveu dois livros, sobre a atual política russa, que agradam ao Kremlin. O outro repórter, que questionou o presidente sobre ‘as violações de direitos dos jornalistas nos EUA’ e sobre ‘o fato de que alguns jornalistas americanos foram demitidos’, é da agência Interfax, que segue estritamente as ordens do governo russo. Bush respondeu que, nos EUA, os jornalistas não são demitidos pelo governo, mas pelos seus veículos.
Marcação cerrada
Já na Rússia, há muitos exemplos de como o Estado intervém diretamente para calar jornalistas. Basta relembrar o caso da única rede independente que havia no país, NTV, comprada ‘à força’ por uma empresa estatal. Quando seus funcionários demitidos conseguiram um outro canal para trabalhar, o TV-6, o governo o fechou rapidamente. Como mesmo assim não desistiram e retomaram seu projeto com uma rede chamada TVS, o ministro de Imprensa de Putin a interditou também, substituindo-a por um canal de esportes. Em 2002, o diretor-geral da NTV, já sob controle oficial, também foi demitido porque não agradou a Putin a cobertura da rede para a invasão de um teatro moscovita por terroristas chechenos. O tipo de postura da presidência russa com relação à imprensa fica claro no próprio sítio do Kremlin, onde a transcrição da coletiva de Bush e Putin foi publicada, mas com todas as falas do americano apagadas.