Friday, 15 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Morreu o homem mais confiável da América

Morreu na noite de sexta-feira [17/7], aos 92 anos, o jornalista americano Walter Cronkite. Há algumas semanas, sua família havia divulgado uma declaração afirmando que Cronkite sofria, há alguns anos, de uma doença cerebrovascular e que não era esperado que se recuperasse. O jornalista, que por duas décadas – de 1962 a 1981 – apresentou para cerca de 20 milhões de telespectadores por noite o noticiário da rede de TV CBS, tornou-se uma das figuras mais emblemáticas do jornalismo americano.


Sua morte coincidiu com o aniversário de 40 anos da missão espacial Apollo 11, que levou os primeiros astronautas à lua. Cronkite era um apaixonado pelo programa espacial, e sua cobertura tornou-se parte da História. Visivelmente emocionado no momento da confirmação de que o homem chegara à lua, o âncora tira os óculos e só consegue soltar a expressão ‘Oh, boy’.


Figura única


‘Ele era o jornalista de TV perfeito’, resume o executivo da CBS News Don Hewitt, criador do programa 60 Minutes. ‘Tinha tudo o que precisava para ser um redator, um editor, um apresentador. Só houve um Walter Cronkite e nunca haverá outro’. Segundo o professor de jornalismo Todd Gitlin, de Columbia, ele era ‘a voz da verdade’. Cronkite ‘pretence a uma época em que havia três emissoras, três companhias de petróleo, três marcas de pão’, brinca, completando que o jornalista era a personificação da estabilidade, mesmo quando sua mensagem era de que a situação não era nada estável.


Em seus anos de âncora na CBS, o jornalista era apontado em pesquisas de opinião como ‘o homem mais confiável da América’. Certa vez, o senador Robert Kennedy, impressionado com sua popularidade, chegou a sugerir que entrasse para a política. ‘Eu não compreendo meu impacto ou sucesso’, declarou Cronkite, em outra ocasião. ‘Faço jornalismo honesto e objetivo. Fazer qualquer outra coisa seria falso’.


Testemunha da História


Nascido em novembro de 1916 no Missouri, Walter Leland Cronkite Jr. tornou-se correspondente da United Press em 1939 e foi um dos principais repórteres americanos a cobrir a Segunda Guerra Mundial, na Europa e Norte da África. Cronkite foi um dos jornalistas selecionados pela Força Aérea dos EUA para voar em um avião bombardeiro B17 sobre a Alemanha. Anos depois, confessou que se achava um covarde. ‘Eu morria de medo o tempo inteiro. Fazia o possível para não entrar em combate’.


O jornalista entrou para a CBS News em 1950 e passou a ocupar a cadeira de âncora 12 anos mais tarde. Sua forma séria de narrar os fatos, com voz grave e profunda, gerava impacto nos telespectadores. A voz falhou, entretanto, no dia do assassinato de Kennedy, em 1963. E, apesar de ser lembrado como a ‘personificação da objetividade’, Cronkite mudou o tom quando decidiu ir ao Vietnã, em 1968, ver a guerra com os próprios olhos. Suas reportagens no CBS Evening News e em um programa especial sobre o conflito foram cruciais para virar a opinião do público americano contra a política de Washington. ‘Dizer que estamos próximos da vitória é acreditar, diante das evidências, nos otimistas que estavam errados no passado’, declarou, levantando dúvidas sobre a versão oficial da guerra. Os telespectadores fiéis de Cronkite sabiam que ele não mentiria. Reza a lenda que o presidente Lyndon Johnson teria dito a assessores: ‘Se perdi Cronkite, perdi o americano médio’.


Ícone


Quando se aposentou do cargo de âncora, Cronkite esperava participar de projetos especiais e grandes reportagens da CBS, mas acabou desapontado quando percebeu que não seria assim. Depois de receber uma medalha presidencial em 1981, o jornalista passou suas últimas décadas produzindo documentários, escrevendo livros e velejando – uma de suas paixões. Ele também participou da campanha contra o aquecimento global e criticou publicamente a guerra no Iraque. Sua mulher, Betsy, morreu em 2005, vítima de um câncer. Eles estavam juntos há 64 anos e tiveram três filhos.


O presidente Barack Obama afirmou que Cronkite era ‘alguém que podíamos confiar para nos guiar pelas questões mais importantes do dia; uma voz de certeza em um mundo incerto. Ele era família. Nos convidou a acreditar nele, e nunca nos desapontou’. Já o ex-presidente George W. Bush classificou o âncora de ‘ícone do jornalismo americano’. Informações de Bart Barnes e Joe Holley [ Washington Post, 18/7/09] e de Michelle Nichols [Reuters, 19/7/09].