Os dados de registros telefônicos e e-mails de cidadãos americanos estão sendo analisados desde novembro de 2010 pela Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA, na sigla em inglês) e usados como base para a geração de gráficos sofisticados de conexões sociais, localização e outras informações pessoais. Segundo documentos datados de janeiro de 2011 vazados por Edward Snowden, ex-funcionário da agência, o monitoramento de cidadãos do país foi possível após a NSA cancelar restrições para a prática, com a justificativa de ajudar a “descobrir e rastrear” conexões entre alvos da inteligência no exterior e pessoas nos EUA.
Na época, a NSA recebeu autorização para realizar “análises gráficas em larga escala sobre grandes blocos de metadados de comunicação sem ter de verificar desconformidade” de cada email, telefone ou outro identificador. Antes, isso só era permitido para estrangeiros, devido a preocupações sobre a invasão da privacidade de cidadãos americanos.
Uma porta-voz da agência justificou que todo o trabalho da NSA tem um propósito de inteligência estrangeiro. “Nossas atividades estão centradas no contraterrorismo, contraproliferação e cibersegurança”, afirmou. Ela informou que o fundamento legal para a mudança que permitiu a análise de dados de americanos foi uma determinação da Suprema Corte de 1979, que alegava que americanos não deveriam esperar privacidade em relação a números discados. Com base nisso, o órgão de segurança e o Pentágono decidiram que poderiam ser criadas correntes de contatos usando metadados, ou seja, hora, localização e outros detalhes de telefonemas e emails, mas não seu conteúdo.
A NSA vinha tentando há mais de uma década obter essa alteração. Em 2006, um memorando do Departamento de Justiça já alertava sobre o potencial do mau uso de tais informações sem as proteções adequadas. Em 2008, o governo de George W. Bush deu aprovação à agência para realizar análise de emails e telefonemas de americanos. A NSA então implantou um projeto piloto durante um ano e meio e, em novembro de 2010, ele foi colocado em prática.
Funcionários da NSA foram alertados a seguir “regras de minimização”, que proíbem a agência de compartilhar com outros órgãos nomes e outros detalhes de cidadãos americanos cujos dados são coletados, a não ser que isso seja necessário para compreender relatórios de inteligência estrangeiros ou se há evidência de crime. Os dados podem ser ampliados com material de outras fontes, como perfis em redes sociais como o Facebook, informações de localização de GPS, registros de propriedade e de impostos, entre outros. A agência desenvolveu uma série de softwares e ferramentas para descobrir a maior quantidade possível de segredos de indivíduos.
Por baixo dos panos
As novas revelações levaram políticos a pedir que o presidente Barack Obama ordene a análise das políticas de vigilância do país. Sabe-se muito pouco sobre as operações da NSA e até mesmo a decisão de revisar os limites em relação à análise de dados de cidadãos americanos foi tomada em segredo, sem revisão da corte ou qualquer debate público. Não foram revelados quantos americanos tiveram seus dados analisados e nem o que resultou dessas análises.
Um documento interno revelou que, em 2011, uma ferramenta monitorava 700 milhões de registros telefônicos por dia e que, em agosto daquele ano, passou a receber também 1,1 bilhão de registros de chamadas por celular de apenas uma operadora. A agência afirmou que grande parte dos registros de telefonemas domésticos, divulgados por Snowden em junho, foi excluída.
Em 2013, a agência fez um pedido secreto de orçamento ao Congresso, também revelado por Snowden, que mostra um investimento de recursos financeiros e humanos para criar um repositório de metadados capaz de armazenar 20 bilhões de “registros de eventos” diariamente e torná-los disponíveis para funcionários da NSA em até 60 minutos. Os gastos incluem apoio para um sistema que tem um orçamento plurianual de US$ 394 milhões, destinado a “descobrir e correlacionar rapidamente padrões e relações complexas em meio a fontes diversas de dados em escala massiva”, segundo um documento de 2008.
Em um Comitê de Inteligência do Senado, na semana passada, o general Keith Alexander, diretor da NSA, não quis dar detalhes se a agência coletou ou teve planos de reunir dados de localizações de americanos com base em telefones celulares. Mas se a NSA não usar esses dados imediatamente, pode fazê-lo posteriormente, segundo documentos revelados.
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