Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O Estado de S. Paulo

HAITI
Gustavo Chacra

De Nova York ao caos em 24 horas

‘O jornalista americano Gay Talese escreveu no seu livro O Reino e o Poder, sobre a história do New York Times, que repórteres preferem ‘ver países em ruínas e navios a pique do que uma cena sadia, que compõe boa parte da vida’. Eu me lembrei disso enquanto lutava com outros colegas por um espaço em qualquer monomotor de Santo Domingo para Porto Príncipe.

Nós queríamos ver o resultado do terremoto, corpos, fome, tragédia. Mas dizer que preferimos isso à normalidade da vida como afirma Talese? Difícil. Moro na mesma cidade que ele, Nova York.

A terça-feira começou como um dia sem notícia. Tudo mudou ao ser notificado sobre a tragédia no Haiti. Na hora, eu disse que queria vir para cá. No dia seguinte, bem cedo, embarcava para Santo Domingo. Quinta-feira de manhã, estava aqui, no centro das notícias do mundo. Vi cenas que nunca imaginei que seriam possíveis: corpos carbonizados, outros abandonados na rua, incluindo um bebê; pessoas sem comida, sem água, sem nada. Bairros destruídos.

Ver todas essas coisas e escrever as reportagens, com a pressão do horário do fechamento, do texto claro, com a internet caindo, é um dos principais desafios de qualquer jornalista. Mas o importante são as histórias. Haitianos que foram queimados ou enterrados sem identificação. Nunca saberemos quem foram, suas memórias, se tinham filhos ou seus planos, interrompido pelo terremoto. Mas várias pessoas ainda podem estar sob escombros. É por essas histórias que pegamos filas para entrar na Faixa de Gaza e embarcamos em monomotores para Porto Príncipe.’

 

GOVERNO
Felipe Recondo e Marcelo de Moraes

Conferência de Cultura arma novo ataque à mídia

‘Depois da crise aberta pelo conteúdo do Programa Nacional de Direitos Humanos e da polêmica de controle de mídia proposta pela Conferência Nacional de Comunicação, o governo já tem nova confusão interna com data marcada para acontecer. Prevista para ocorrer de 11 a 14 de março, a 2ª Conferência Nacional de Cultura tem em seu texto-base conceitos e propostas que atacam a mídia, preveem interferência em áreas como ciência e tecnologia e meio ambiente e defendem ampliação da atuação do Estado.

O Estado teve acesso ao texto-base da Conferência de Cultura, que faz forte crítica à mídia no item 1.4, que trata de Cultura, Comunicação e Democracia.

‘O monopólio dos meios de comunicação (mídias) representa uma ameaça à democracia e aos direitos humanos, principalmente no Brasil, onde a televisão e o rádio são os equipamentos de produção e distribuição de bens simbólicos mais disseminados, e por isso cumprem função relevante na vida cultural’, diz o texto-base, que orientará as discussões da conferência.

O documento também defende a pressão pela regulamentação de artigos que obriguem emissoras de televisão a cumprir cotas de regionalização na produção e exibição de programas.

‘Tão necessário quanto reatar o vínculo entre cultura e educação é integrar as políticas culturais e de comunicação. Nesse sentido, os fóruns de cultura e de comunicação devem unir-se na luta pela regulamentação dos artigos da Constituição Federal de 1988 relativos ao tema. Entre eles o que obriga as emissoras de rádio e televisão a adaptar sua programação ao princípio da regionalização da produção cultural, artística e jornalística, bem como o que estabelece a preferência que deve ser dada às finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, à promoção da cultura nacional e regional e à produção independente (art. 221).’

E acrescenta: ‘As emissoras comerciais se organizam com base nas demandas do mercado, que são legítimas. Contudo, essas demandas não podem ser as únicas a dar o tom da comunicação social no País.’

INTERVENÇÃO

Na prática, a proposta da Conferência Nacional de Cultura repete a mesma situação de reuniões anteriores e de documentos internos do governo, como o que estabeleceu o Programa Nacional de Direitos Humanos. O texto dispara em várias direções, defende a intensificação da participação do Estado e critica ou deseja intervir de alguma maneira sobre atividades de mídia.

Foi esse tipo de ação que causou crise de governo por conta da confecção do Programa Nacional de Direitos Humanos. A proposta acabou tratando de assuntos tão diversos como agronegócios, liberação do aborto e criação de Comissão da Verdade para discutir ações de tortura praticadas durante a ditadura militar. Bombardeado por todos os lados, o governo acabou sendo obrigado a rever o texto.

Agora, para a Conferência da Cultura, se repete a intenção de influenciar outras áreas de governo, como ciência e tecnologia. ‘A cultura deve relacionar-se com as políticas de ciência e tecnologia e reforçar a premissa de que o desenvolvimento científico tem de incorporar a diversidade cultural do País, com seus múltiplos conhecimentos e técnicas’, cita o texto no item 3.1, chamado Centralidade e Transversalidade da Cultura.

Também traz propostas relacionadas à conservação do meio ambiente, que passa, de acordo com o texto, por uma mudança no modo de vida da sociedade.

‘A política cultural não está alheia à crise ambiental, que se torna mais grave a cada dia. Mesmo porque essa crise decorre de um componente cultural: o modo de vida consumista, que explora exaustivamente os recursos naturais’, diz o texto. ‘No Brasil aprendemos pouco com as culturas indígenas; ao contrário, o País ainda está preso ao modelo colonial, extrativista, perdulário e sem compromisso com a preservação dos recursos naturais.’

DESCENTRALIZAÇÃO

Na primeira conferência, temas como esses foram debatidos e integraram as 30 propostas consideradas prioritárias. ‘Garantir a participação da sociedade civil, através de seus fóruns, na discussão da elaboração da lei geral de comunicação de massa assegurando a descentralização, a universalização, a democratização e o controle da sociedade civil sobre os meios de comunicação e que regule o sistema de concessão e produção de conteúdo’, informava o texto de uma das propostas.

Outra sugeria ‘debater, defender e promover sistemas brasileiros de comunicação de massa, com a participação de atores públicos e da sociedade civil, assegurando a democratização dos meios de comunicação e a diversidade cultural’.

O Ministério da Cultura está em fase de preparação da conferência. Na semana passada, durante videoconferência em que os preparativos eram discutidos, servidores do ministério disseram estar preocupados com a baixa quantidade de inscrições até o momento. E disseram aos organizadores nos outros Estados ser necessário fazer esforço adicional para aumentar o número de participantes.’

 

Felipe Recondo e Marcelo de Moraes

Ministério não vê nada que gere polêmica

‘Apesar dos pontos controversos incluídos no texto-base da 2ª Conferência Nacional da Cultura, representantes do Ministério da Cultura dizem não haver nenhuma proposta que possa gerar polêmica. Segundo a secretária de Articulação Institucional, Silvana Lumachi Meireles, os itens foram referendados nas conferências regionais e não há motivo para grande reação.

‘Não há nenhum ponto polêmico, porque as propostas passaram pela análise em 2.992 municípios de todos os Estados que fizeram suas conferências’, afirmou. ‘Nesse universo representativo, esses temas não geraram polêmica.’

Ela negou que as sugestões referentes aos meios de comunicação, incluindo as propostas de produção regional de conteúdo e controle social, configurem tentativa de interferência na mídia. ‘Estamos falando de direito à informação e não de controle da liberdade.’ E afirmou que propor a discussão de assuntos referentes a outros setores do governo, como a regulação da produção de conteúdo dos meios de comunicação, não configura interferência em outros ministérios. ‘O Ministério da Cultura cumpre sua parte em atendimento à reivindicação da sociedade civil. Desde sempre há áreas do Ministério da Cultura que têm tentado atuar em parceria com os Ministérios da Educação e do Meio Ambiente’, argumentou. ‘Não dá para dissociar cultura de meio ambiente e educação.’’

 

Um debate que cabe em qualquer evento

‘No governo Lula, as conferências nacionais têm sido realizadas constantemente e produzido propostas polêmicas, mas inócuas. Na prática, servem para que o presidente Lula dê voz ao público interno do PT e dos movimentos sociais, que levantam bandeiras controvertidas, mas acabam não tendo consequências. O controle sobre a mídia e sobre o comando editorial dos meios de comunicação parece ser tema comum entre várias delas.

Em 2006, a 1.ª Conferência de Economia Solidária aprovou, na sua conclusão, que ‘as políticas públicas da Economia Solidária devem privilegiar os meios de comunicação comunitários, populares e alternativos, sem esquecer de exigir a contrapartida dos grandes meios de comunicação, que são concessões públicas e devem estar a serviço da sociedade e sob seu controle social’.

Ao fim da 1.ª Conferência Nacional da Juventude, os participantes defenderam o estabelecimento de cotas para a produção e exibição de conteúdo em todos os meios de comunicação. Pela proposta, 50% dos programas exibidos serão obrigatoriamente nacionais – com 15% de produção independente e 20% de produção regional.

Na 3.ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, em julho de 2007, que não tinha a comunicação em sua pauta de discussões, os participantes aprovaram uma ‘moção de repúdio aos ataques da mídia às comunidades quilombolas’. O ápice do tema foi a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), de 14 a 17 de dezembro do ano passado. Os participantes da Confecom aprovaram o ‘controle social’ da mídia, o que poderá implicar a participação popular em todo o processo de produção dos meios de comunicação.

Em outras situações, as propostas aprovadas atacam projetos encampados pelo próprio governo, como foi o caso da conferência sobre segurança alimentar. No documento final, os participantes defenderam a interrupção das obras para transposição do Rio São Francisco. ‘O projeto de integração das bacias que implica a transposição do Rio São Francisco deve ser suspenso imediatamente, pois o diagnóstico atual indica a morte de seus afluentes’, defendem os integrantes da conferência no documento final.

A mesma conferência propôs que uma parcela do dinheiro aplicado no mercado financeiro fosse destinada à produção de alimentos. ‘Instituir a obrigatoriedade da utilização parcial dos recursos financeiros não produtivos provenientes de especulação financeira em ações produtivas que contemplem a segurança alimentar e nutricional’, propuseram os participantes.’

 

TECNOLOGIA
Ethevaldo Siqueira

Desta vez, a TV-3D tem tudo para decolar

‘O Consumer Electronics Show (CES 2010), que terminou no domingo passado aqui em Las Vegas, inaugurou a era da TV tridimensional (TV-3D). Sem ter nenhuma bola de cristal, podemos afirmar que, desta vez, a TV-3D veio para ficar. Na realidade, ela tem mais de 30 anos e dezenas de tentativas frustradas. No passado, a grande barreira eram as limitações da tecnologia analógica, cujas soluções nunca chegaram a empolgar nem os espectadores nem a indústria. Hoje, diferentemente, estamos diante de um salto triplo: TV digital, imagens de alta definição e tridimensionais.

Outra vantagem será a padronização das tecnologias de TV-3D. Assim, o consumidor poderá confiar em um único padrão e usufruir a plena integração da tridimensionalidade dos filmes de cinema, do Blu-ray disc 3D, dos videogames mais avançados e dos programas de TV aberta e por assinatura.

Vale lembrar que, num futuro próximo, toda comunicação visual utilizará imagens tridimensionais. Assim como, no passado, a passagem de preto e branco para a imagem em cores foi vista como um salto natural, devemos encarar com a maior naturalidade a chegada da tridimensionalidade à TV, ao cinema, ao home theater e às imagens dos computadores.

NEM TODOS QUEREM

Mesmo diante desses argumentos, no entanto, persiste uma dúvida central: como reagirão os espectadores? É provável que uma boa parcela resista à ideia de investir em televisores e em conteúdos mais caros. Outros se sentirão constrangidos pelo uso obrigatório de óculos especiais que lhes assegurem a bela ilusão da profundidade de imagens. A visão 3D fica, assim, limitada às oportunidades em que o espectador pode sentar-se e concentrar sua atenção em um filme ou show. ‘Uma coisa é usar óculos numa sala de cinema, mas em casa você está com outras pessoas numa sala de estar, movimentando-se para a cozinha ou fazendo outras coisas’, diz Greg Ireland, da empresa de pesquisas IDC.

Para quebrar a hesitação dos consumidores, os maiores fabricantes se apressaram em lançar seus modelos de TV-3D neste CES 2010. Tim Baxter, presidente da divisão de consumo da Samsung Electronics, estima que entre 10% e 14% dos 35 milhões de televisores a serem vendidos neste ano nos Estados Unidos terão a capacidade de exibir imagens 3D. A empresa coreana está aliando-se à DreamWorks Animation SKG Inc. para produzir a versão 3D do filme Monstros vs. Alienígenas (Monsters vs. Aliens) exclusivamente para os compradores de seus televisores 3D.

CONVERSÃO 2D-3D

Os aparelhos da Samsung serão capazes de converter programas produzidos em 2D para 3D. Embora a qualidade dos programas convertidos seja menor, os espectadores deverão aceitá-la enquanto não existirem conteúdos em 3D originais, abundantes e disponíveis, segundo Baxter.

Os novos televisores Cell TVs, da Toshiba, também converterão programas 2D em 3D, por serem dotados de Cell chips, os mesmos microprocessadores usados no Play Station 3, da Sony, que tem recursos avançados.

De seu lado, a Panasonic diz que lançará 4 modelos de televisores 3D de plasma e não de LCD, no segundo semestre. Já a Sony só lançará seus televisores 3D no terceiro trimestre deste ano. Alguns de seus aparelhos virão completos, com óculos. Outros serão do tipo 3D-ready, cabendo aos clientes adquirir os óculos separadamente.

A LG promete lançar dois modelos de televisores de grandes dimensões em 3D, em maio: um com 47 polegadas, outro com 55. A empresa diz que eles custarão de US$ 200 a 300 mais que os melhores televisores sem os recursos da 3D. Até a Vizio Inc., líder de mercado de TVs de preços populares nos Estados Unidos, diz que seus televisores mais sofisticados terão os recursos da tridimensionalidade.

Os fabricantes não esperam que a TV-3D se imponha rapidamente. Eles lembram os casos da TV em cores e, mais recentemente, o da TV de alta definição, que levaram muitos anos para alcançarem a maior parcela dos telespectadores. Como outros avanços tecnológicos, os programas em 3D exigem avanços e melhorias na infraestrutura da televisão e do cinema, desde a tomada de imagens até a edição e distribuição.

E OS CONTEÚDOS?

O reduzido conteúdo de filmes disponíveis, produzidos originalmente em 3D, abrange desenhos ou mesmo filmes fascinantes convertidos para a nova tecnologia, como Avatar, os da série Up, as produções da Pixar e outros. Nas demonstrações feitas no CES 2010, a maioria dos adultos parecia hipnotizada pelos desenhos em TV-3D.

Agora todos os players estão preparados para o lançamento tanto dos televisores 3D quanto do Blu-ray 3D, até o fim do primeiro semestre. A rede de TV via satélite DirecTV anunciou que vai enviar upgrades de software à maioria de seus set top boxes em junho para recepção em 3D. A ESPN planeja oferecer um canal em 3D em tempo de transmitir a Copa do Mundo da África do Sul. A rede Discovery vai associar-se à Imax e à Sony para constituir rede própria em 3D full time em 2011.’

 

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