O grito do pré-candidato democrata Howard Dean nas primárias de Iowa virou hit das emissoras americanas. Tanto que a própria CNN julgou ter exagerado no número de repetições da cena. ‘A história era importante, mas o desafio de uma TV de notícias 24 horas é tentar manter informados os diferentes telespectadores durante o dia, sem exagerar’, disse Princell Hair, administrador-geral da CNN.
Para alguns, a explosão da mídia pode ter levado o pré-candidato da liderança à ruína eleitoral. ‘Foi totalmente injusto’, disse Joe Trippi, ex-administrador de campanha de Dean, que perdeu seu emprego com a queda do democrata. Trippi reconhece que a cena tinha valor jornalístico, mas diz que poderia ter se limitado a um dia de transmissão.
De acordo com David Bauder [AP, 8/2/04], emissoras americanas televisionaram o grito de Dean 633 vezes – afora noticiários locais e talk shows – nos quatro dias seguintes a sua ocorrência. Na CNN, a seqüência foi repetida várias vezes, depois foi analisada, mais tarde, transmitida em programa humorísticos e até virou parte de uma música na internet. Em uma noite, o grito virou lenda.
Paul Slavin, vice-presidente sênior da ABC News, disse que a cena ganhou tanta vida que ‘a atenção que estava recebendo merecia mais atenção ainda’. Para ele, seu único arrependimento é não ter transmitido uma reportagem intrigante de Diane Sawyer antes. A repórter afirmava que Dean estava usando um microfone especial naquela noite, que filtrava o barulho da multidão para sua voz se sobressair – outros vídeos mostraram que o grito era quase inaudível na audiência ao vivo.
Andrew Heyward, presidente da CBS News, disse acreditar que o comportamento de Dean ajudou em seu declínio, ‘não tanto pela repetição do discurso, mas pela consciência coletiva de que aquilo ferira sua imagem, o que se tornou uma espécie de profecia provocada pelo próprio público’.
Números não mentem
Segundo uma análise do Center for Media and Public Affairs, apenas 39% da cobertura de Dean nos noticiários noturnos foram positivos durante a semana que sucedeu seu discurso em Iowa. Em comparação, a cobertura do concorrente John Edwards foi 86% positiva durante o mesmo período, e de John Kerry, 71% positiva.
Se se considerar os dados do Center for Media and Public Affairs desde 1o de janeiro até as primárias de New Hampshire, John Edwards tinha 96% de comentários positivos. Em seguida vinha John Kerry (79%), Wesley Clark (68%) e Howard Dean (52%).
Conforme apurou Howard Kurtz [The Washington Post, 9/2], sete de cada 10 reportagens sobre os pré-candidatos democratas nos noticiários noturnos da CBS, ABC e NBC são positivas. Há quatro anos, essa proporção era de apenas quatro para 10, com os então pré-candidatos Al Gore e Bill Bradley.
A percepção de que Kerry e Edwards ‘têm mais chance de se eleger fez a mídia apresentá-los como os bons candidatos’, disse Matthew Felling, do centro de estudos.