O uso de fontes anônimas por jornais costuma ser um assunto complexo. Há muitas questões que devem ser levadas em conta, e talvez a principal delas seja a relevância do uso daquela fonte. É preciso haver uma boa justificativa para publicar uma informação fornecida por alguém que – também por uma boa razão – não pode ter seu nome revelado ao público. Por isso, dois casos recentes chamaram a atenção e provocaram reclamações dos leitores do New York Times. Uma das políticas do jornal refere-se a não usar fontes anônimas de maneira indiscriminada e não reproduzir alegações que possam ser consideradas ataques pessoais ou especulações. Nos dois casos, as informações tinham tom de fofoca, o que levou os leitores a indagar os motivos do jornal para reproduzi-las.
Suspeito-problema
Uma das matérias dizia respeito a Raymond Clark III, acusado de assassinar sua colega de Yale Annie Le no laboratório onde os dois trabalhavam. Colegas que não se identificaram definiram Clark como intrometido e exigente, e disseram que ele dava trabalho no laboratório, recusando-se a fazer pequenas coisas, como calçar protetores nos sapatos. Segundo o ombudsman do Times, Clark Hoyt, trata-se de um cenário comum: repórteres tentam traçar o perfil de um suspeito de um crime com tons de mistério – o corpo de Annie foi encontrado entre duas paredes do laboratório – e acabam se baseando em comentários anônimos que não permitem que os leitores avaliem sua credibilidade ou motivação. Não é possível saber, por exemplo, se a pessoa que falou sobre os problemas causados por Clark teria alguma antiga desavença com ele.
Philip Corbett, editor de padrões do diário, defende a publicação das informações. ‘As declarações não foram acusatórias’, opina, admitindo que as fontes poderiam ter sido descritas de maneira mais completa e as citações poderiam ter sido colocadas de maneira mais cuidadosa, para que não parecessem uma opinião sobre culpa ou inocência. Joe Sexton, editor da seção metropolitana, conta que a matéria foi cuidadosamente supervisionada – havia nove jornalistas envolvidos na cobertura do caso Annie Le, ocorrido no mês passado. Não foram publicadas, por exemplo, informações sobre um incidente ocorrido seis anos atrás, em que a polícia foi chamada por conta de uma briga de Clark com sua então namorada. Sobre as fontes, Sexton diz que ninguém de Yale se identificaria, já que a universidade havia determinado que funcionários do laboratório que falassem com a imprensa poderiam ser demitidos.
Sexo e extorsão
O outro caso que levou os leitores a enviar queixas ao ombudsman tratava da revelação de que o apresentador David Letterman teria sido chantageado por um produtor de TV, que ameaçava levar a público relações sexuais que ele teve com funcionárias de seu programa. Em uma matéria sobre a história, uma fonte identificada apenas como ex-colega de Robert Joel Haldeman, acusado de tentar extorquir o apresentador, dizia que não era suspresa que ele estivesse envolvido em um caso de dinheiro e sexo, já que gostava de ‘viver no limite’ e costumava ter relações amorosas complicadas.
Para o repórter Bill Carter, autor da matéria sobre Halderman, a publicação das observações foi válida. Seu editor, Bruce Headlam, concorda. Carter ressalta que o artigo continha muitos comentários positivos sobre Halderman, todos com fontes identificadas. ‘Ouvi muitas fontes e não usei todas. Acho que agi com responsabilidade’, afirmou o repórter. Na opinião de Henry Weinstein, professor de direito da Universidade da California-Irvine e ex-colaborador em questões legais para o Los Angeles Times, as fontes anônimas não eram necessárias em nenhum dos casos, pois não pareciam essenciais e não eram de interesse público.