Os atentados que deixaram mais de 180 mortos em Mumbai, na semana passada, já geraram pelo menos um conflito. Enquanto os governos da Índia e do Paquistão tentam investigar os ataques com calma para evitar uma tragédia ainda maior, a imprensa dos dois países deu início a uma verdadeira guerra de palavras.
A mídia paquistanesa respondeu ao tom sensacionalista dos veículos de comunicação indianos, que não pouparam detalhes dramáticos ao reportar a suposta ligação dos terroristas com o Paquistão. Em editoriais, artigos de opinião e comentários de âncoras televisivos, a mídia da Índia passou a ser acusada de jornalismo irresponsável por aceitar, sem questionamentos, informações incendiárias de ‘fontes anônimas’ da polícia e do setor de inteligência do país.
Análises
Talk shows políticos no Paquistão passaram a dedicar edições inteiras à análise da cobertura indiana sobre os atentados da última quarta-feira (26/11), em que terroristas fortemente armados invadiram hotéis, uma estação de trem e um centro judaico, entre outros locais com grande concentração de estrangeiros. ‘No primeiro dia, a mídia indiana começou a fazer alegações contra o Paquistão. No dia seguinte, a mídia paquistanesa começou a rebater as acusações. Agora, eu acho que foi dado início a uma guerra entre Índia e Paquistão’, afirma Hamid Mir, um dos mais populares âncoras paquistaneses. ‘Os Exércitos dos dois países podem não estar lutando, mas a mídia da Índia e do Paquistão estão envolvidas em uma grande briga. Para mim, o processo de paz entre os dois países é a grande vítima desta guerra’.
Segundo o também apresentador de TV paquistanês Talat Hussain, o problema da mídia indiana é que, por não reportar as falhas de seu próprio governo, acaba sendo obrigada a preencher o noticiário televisivo com mentiras e informações imprecisas. ‘Só porque você já esgotou sua cobertura, não significa que tenha licença para levar os dois países à beira da guerra. Somos países com armas nucleares’, afirma. O clima indigesto gerado pela imprensa é tão ruim que, tentando aliviar um pouco a situação, o presidente paquistanês, Asif Zardari, participou por telefone de um programa de TV político indiano, no fim de semana, prometendo que ações duras serão tomadas contra qualquer ligação terrorista com o Paquistão.
Onda de ataques
Em artigo no Times of India, o colunista Gautam Adhikari afirmou que ‘muito do terrorismo global de hoje, e não só o que atingiu a Índia, emana ou é planejado do Paquistão’. O jornal paquistanês Dawn rebateu. ‘Segmentos da mídia indiana se envolveram em uma onda de ataques ao Paquistão, misturando fatos com teorias para apresentar ‘provas’ da malícia e da perfídia do Paquistão’, alertou, em editorial publicado no sábado (29/11).
Além dos comentários e editoriais indianos criticando o Paquistão, os jornalistas paquistaneses também se irritaram, na última semana, com a grande quantidade de informações atribuídas a fontes anônimas. O jornal indiano Hindustan Times noticiou que ‘os corpos dos terroristas encontrados eram todos de paquistaneses’. O Hindu reportou que uma mensagem de e-mail que assumiria a autoria dos ataques teria vindo de um computador no Paquistão. O Indian Express divulgou que ligações interceptadas de celulares de dois terroristas gravaram pelo menos 11 diálogos entre os homens e seu suposto líder, que estaria na cidade paquistanesa de Karachi. Antes disso, a imprensa indiana noticiou que o único terrorista capturado vivo teria confessado pertencer a um grupo militante paquistanês chamado Lashkar-e-Taiba. A maioria dos dados da cobertura tinha como base as tais fontes anônimas da polícia e inteligência. Os jornalistas indianos se defendem, alegando que apenas repassam as informações destes oficiais. Informações de Saeed Shah [The Guardian, 1/12/08].