Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Relatório critica ‘Rolling Stone’ por reportagem sobre estupro

A revista americana Rolling Stone se retratou sobre uma reportagem publicada em novembro de 2014 que relatava um estupro coletivo em uma fraternidade da Universidade da Virginia, supostamente ocorrido dois anos antes. A divulgação do episódio provocou uma série de debates sobre violência sexual nos campi dos EUA.

No entanto, o artigo se tornou alvo de polêmica depois que veículos como o jornal Washington Post expuseram falhas no processo de apuração da história. A Rolling Stone acabou acatando os questionamentos e admitiu que sua reportagem foi equivocada. A revista justificou que, à época, houve muita cautela para não pressionar a vítima e que o interesse exagerado em protegê-la de mais humilhações e exposição acabou levando a um trabalho raso.

Para se retratar, a revista divulgou um relatório encomendado por seus editores e preparado pela Escola Superior de Jornalismo da Universidade Columbia, apontando todas as falhas no material. Dentre outras afirmações, o documento diz que a Rolling Stone “falhou na prática jornalística básica” para verificar os fatos narrados pela vítima – uma universitária identificada apenas como “Jackie”.

Erros sucessivos

O relatório de 13 mil palavras (maior do que o artigo original da revista) foi assinado por três profissionais de Columbia: Steve Coll, reitor da escola de jornalismo; Sheila Coronel, diretora de assuntos acadêmicos; e Derek Kravitz, estudioso de pesquisa em pós-graduação.

O primeiro erro apontado foi o fato de a repórter Sabrina Rubin Erdely – responsável pelo texto original sobre o estupro – não ter entrado em contato com três amigos de Jackie citados em seu depoimento (a reportagem se referia aos três por pseudônimos). Mais tarde, em entrevista para o Washington Post, estes mesmos amigos confirmaram não ter sido consultados por Sabrina. Além disso, lançaram dúvidas sobre a história de Jackie e negaram ter dito o que lhes foi atribuído na reportagem da Rolling Stone.

Outro erro apontado foi o fato de a revista não ter fornecido, durante a apuração, informações suficientes à fraternidade Phi Kappa Psi, onde os supostos acusados residiam, para que esta pudesse responder adequadamente às acusações – gesto que, na opinião dos pesquisadores de Columbia, levaria a discrepâncias que colocariam o texto de Sabrina em xeque. Depois que o material foi publicado, a Phi Kappa Psi alegou que não houve nenhuma festa no fim de semana em que Jackie disse ter ocorrido o estupro. No momento, inclusive, a fraternidade cogita processar a revista.

A Rolling Stone também falhou na identificação do principal agressor de Jackie, citado por ela apenas por um pseudônimo: “Drew”. Tanto Sabrina, quanto a fraternidade, o Washington Post e até mesmo a polícia foram incapazes de encontrar alguém que correspondesse à descrição fornecida por Jackie.

Coll também criticou a postura tendenciosa da repórter, relatando que, desde o primeiro rascunho da matéria, o tom para se referir aos supostos estupradores ou mesmo à postura da Universidade para com o caso era depreciativo.

A própria investigação policial a respeito das denúncias sobre o estupro coletivo não encontrou evidências que corroborassem a reportagem (embora os investigadores responsáveis tenham enfatizado que suas descobertas não excluíam a possibilidade de a violência ter acontecido de fato).

Novas diretrizes

Will Dana e Jann S. Wenner, editores da Rolling Stone, disseram que as práticas da redação da revista foram alteradas desde então. Dentre as novas recomendações está a ausência ou uso mínimo de pseudônimos em reportagens e maiores esforços para controlar “informações depreciativas”.

Em um comunicado em resposta ao relatório de Columbia, Teresa A. Sullivan, presidente da Universidade da Virginia, descreveu o artigo original como “jornalismo irresponsável que danificou injustamente a reputação de muitas pessoas inocentes e da Universidade”.

Já John D. Foubert, ex-reitor da Universidade da Virginia e atual presidente da One in Four, instituição voltada à prevenção de violência sexual, teme que o escândalo que sucedeu o artigo possa desencorajar algumas mulheres a denunciarem agressões sexuais.

Em declaração ao New York Times, Sabrina Rubin Erdely disse que a leitura do relatório foi “uma experiência brutal e humilhante” e reconheceu que não fez o suficiente para verificar o relato de Jackie. Ela também se desculpou aos leitores da Rolling Stone, a seus colegas e a “quaisquer vítimas de agressão sexual que possam ter ficado temerosas após a publicação do meu texto”. De acordo com Wenner, Sabrina continuará a escrever para a revista, bem como Sean Woods, editor do artigo original. No link onde havia o artigo original de Sabrina, há agora o relatório [em inglês].