‘O que interessa em primeiro lugar às pessoas quando começam a ler o jornal? São os títulos das matérias e as fotografias. Por extensão, as legendas – textos que acompanham as fotos ou ilustrações. Toda fotografia deve ter sua legenda, mas muitas vezes o texto breve não cumpre a sua função. Há frases redundantes, óbvias, não ajudam o leitor a, pelo menos, apreciar a fotografia e ter informações complementares.
Não é a primeira vez que escrevo sobre o assunto nesta coluna. Já tinha chamado atenção, em março passado, para as legendas publicadas no O POVO que não cumprem suas funções. Observando, nos últimos meses, vejo que muitas continuam sem seguir a linha correta – com frases curtas e que incluam informações sobre o acontecimento. Encontramos muitas informações que destoam da fotografia, sem contar os erros.
Separei para os leitores exemplos de edições recentes. Vejam: No caderno GOL!, dia 18 passado, numa matéria sobre o Icasa intitulada ‘O Grande do Interior’, tem a foto de um homem vestido com a camisa do time, no estádio Romeirão, segurando a imagem do padre Cícero na mão direita e uma cruz (que puxa de um cordão no pescoço). Está olhando para cima. Na legenda diz: torcedor-símbolo do Icasa faz a festa após a goleada sobre o Paysandu Por que foi denominado de torcedor-símbolo? Nada diz no texto. E ele não está fazendo a festa, pela imagem está agradecendo em oração pela conquista do time.
Outro exemplo, encontrado na mesma edição, estava em Economia. Sobre a matéria referente à adesão do contribuinte ao novo Refis da União, foi publicada uma foto de pessoas em uma fila. Na legenda: Receita Federal diz que programa é mais vantajoso. Algo a ver? Nem se sabe se a fila é na Receita Federal!
Continuando naquela edição, na página 8 (Fortaleza) a matéria era sobre a Mostra de Teatro Transcendental que beneficiaria (com a arrecadação) seis instituições. Na foto, crianças em torno de uma mesa fazem desenhos. Na legenda diz: crianças atendidas por instituições sociais serão beneficiadas pelo que for arrecadado na Mostra de Teatro Transcendental que tem início hoje. Primeiro repete quase tudo que está no título. Segundo: não cita a instituição da foto. Terceiro: Não acrescenta informações ao leitor.
Encontrei ainda legenda que destoa da foto. Na edição do dia 29 de junho (Brasil, pág. 22) na matéria ‘Morre a primeira vítima da gripe suína no Brasil’, a foto mostra três homens caminhando não se sabe onde e as costas de um outro usando o colete da Defesa Civil. Na legenda, a seguinte frase: prefeito do Rio Eduardo Paes e secretário de (da) Saúde Sérgio Cortês debatem agravamento da pandemia. Estavam era visitando um local. Não se sabe onde.
Em outra, na edição do dia 2 de julho, pág. 27, acompanha uma frase mal escrita. Abaixo da foto do ministro da Defesa lia-se: Nelson Jobim argumentou que a base de Alcântara por ser uma das mais importantes do mundo. (?) Na última terça-feira, 26, na capa do Vida & Arte a legenda saiu ilegível. Que língua será essa? É aramaico? Perguntou a leitora Francisca Leilah Ribeiro Freire. Não, não era em aramaico, era truncada mesmo. Nada se lia abaixo da foto da socióloga Roselane Bezerra.
Exemplo de boa legenda encontrei na página 17 (Política), também da edição do último dia 18. Na matéria sobre novas denúncias contra o presidente do Senado, José Sarney, o título era o seguinte: Sarney diz sofrer ‘campanha nazista’. A foto mostrava o Congresso Nacional com uma fumaça negra por trás. E na legenda: Brasília incendeia por causa do clima seco do Cerrado nesta época do ano, mas também pela série de denúncias que parecem não ter fim. Dá a descrição real da imagem e compara aos fatos ocorridos recentemente no Senado.
Para o repórter-fotográfico da Universidade Regional de Blumenau (SC) e coordenador de Fotografia do Portal Análise em Foco (www.analiseemfoco.com.br), Daniel Zimmermann, fazer uma legenda não é tarefa simples e, por vezes, não possui o devido valor por parte de editores e jornalistas. ‘Os textos são cada vez mais enxutos e a fotografia assume um papel importante na ‘disputa’ com o texto. As fotografias estão maiores, coloridas e ocupam mais espaço nos jornais’, analisa Zimmermann.
Concordo com o jornalista quando ele diz que a construção da legenda deveria ser em conjunto (editor, repórter e repórter-fotográfico). ‘Isso porque o momento de constituição da fotografia é toda referenciada em um contexto cultural, estético, profissional e pessoal do fotojornalista. Ele, melhor do que ninguém, vai saber expressar o que aquela fotografia quer dizer, porque foi ele quem a criou a partir do recorte de uma realidade’. Embora saiba que o tempo de fechamento do jornal é curto, com horas marcadas para o encerramento das páginas, o conjunto dos profissionais ajudaria a acabar com as distorções nas legendas.’