Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Sobre imagens falsas e blogueiros vigilantes

O conflito entre Israel e o Hezbollah ficará marcado na história do jornalismo como a guerra da distorção de imagens e informações. A polêmica teve início em agosto, quando se descobriu que um fotógrafo freelancer da Reuters havia manipulado imagens no Photoshop para aumentar a dimensão de destruição do conflito. O profissional foi afastado, quase mil imagens de sua autoria foram removidas do banco de dados da agência, mas a polêmica estava longe de terminar ali.

Em julho, respeitadas organizações de notícias como AP, BBC, Time Magazine e New York Times, entre milhares de outros veículos de comunicação espalhados pelo mundo, divulgaram a chocante informação de que forças israelenses haviam lançado mísseis em duas ambulâncias claramente identificadas como da Cruz Vermelha. O ataque teria levado a um incêndio e ferido os passageiros dos veículos. Fotografias e filmagens feitas por alguém descrito como um ‘cinegrafista local’ mostravam uma ambulância bastante destruída, com um buraco no teto.

Blogs vigilantes

Bastou um blogueiro para desmentir a notícia. O blog Zombietime revelou que a história se tratava de armação. Fotografadas uma semana depois do suposto ataque, as ambulâncias não tinham o chão destruído – o que seria esperado se fossem atingidas por um míssil. O motorista de uma das ambulâncias, antes ferido, apareceu em outras filmagens sem nenhum arranhão. E, finalmente, o buraco no teto do veículo não só era perfeitamente redondo, como nele caberia com exatidão uma sirene.

Algum tempo depois, dezenas de cenas de membros do Hezbollah dando dinheiro para ajudar desabrigados e reconstruir escolas nos subúrbios de Beirute correram o planeta. Havia apenas um problema com as imagens: as notas de US$ 100 distribuídas pelo Hezbollah não tinham uma fina faixa de segurança presente em notas verdadeiras. O dinheiro da pseudo-filantropia era, na verdade, falso, o que foi descoberto e denunciado por, novamente, blogueiros. Autores de páginas como MyPetJawa e Little Green Footballs ampliaram fotografias e as mostraram para especialistas em moedas, que detectaram dezenas de irregularidades nas notas de dólar.

‘Talvez seja demais esperar que jornalistas sejam especialistas em moeda. Mas é de se esperar que eles sejam capazes de detectar uma fotografia manipulada’, comenta David Frum em artigo no sítio do think tank conservador American Enterprise Institute [28/8/06]. Ainda assim, foi um blogueiro – que também é músico profissional – quem detectou a farsa nas fotos do freelancer da Reuters.

Ingenuidade ou ambição?

Frum critica a postura da mídia internacional no conflito no Líbano. Segundo ele, cada um dos repórteres ocidentais designados a cobrir a guerra aceitava qualquer informação como fato inquestionável. Seriam os repórteres ingênuos? Frum defende que a explicação é mais complexa.

Mais do que ingenuidade, a mídia se sujeitaria à manipulação e distorção grosseira de imagens e informações por motivos competitivos e nada altruístas. A ‘ideologia anti-Israel’ também teria seu papel, diz ele. Mas, basicamente, ‘fotojornalistas querem ganhar prêmios, e organizações de mídia querem furos’, sentencia. ‘Se isso significa ter que contratar simpatizantes locais do Hezbollah para carregar câmeras onde jornalistas mais objetivos são proibidos de ir, é um preço que organizações de notícias pagarão’.