Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Veja

INTERNET
Bruno Meier

Caiu na rede, é pop

Com sua cara lisa e seu cabelo escovadinho, Justin Bieber é o ídolo da hora entre as meninas, que se desmancham com canções açucaradas como One Time. Seu álbum de estreia, My World, emplacou quatro singles nas paradas de sucessos em 2009. No mês passado, My World 2.0, que acaba de chegar às lojas brasileiras, vendeu 283 000 cópias só na primeira semana no mercado americano. Aos 16 anos, Bieber tornou-se o segundo artista-solo mais jovem a alcançar o topo da parada americana com um disco. (Stevie Wonder ainda detém o recorde, com o álbum The 12 Year Old Genius, que ele lançou em 1963, aos 13 anos.) Mais prodigiosos ainda são os números de Bieber na internet. O cantor da franjinha tem mais de 64 milhões de acessos no MySpace; seus vídeos no YouTube passaram a marca de 160 milhões de espectadores; e seu perfil no Twitter conta com 1,8 milhão de seguidores. Esse sucesso nas redes sociais foi consolidado antes do lançamento dos discos. Justin Bieber é o exemplo mais consumado das mudanças substanciais que a internet está impondo ao mercado musical – e, sobretudo, ao modo como um artista se relaciona com seus fãs.

A carreira de Bieber começou há três anos, quando ele tirou o segundo lugar em um concurso de calouros na sua cidade natal – Stratford, de 30.000 habitantes, na província canadense de Ontário. Bieber postou a apresentação no YouTube, juntamente com suas gravações de sucessos de artistas como Aretha Franklin e Usher. Pretendia apenas mostrar suas performances a parentes e amigos. Em alguns meses, porém, os vídeos foram vistos mais de 10 milhões de vezes e despertaram a atenção do empresário americano Scooter Braun, que contratou o menino-prodígio e o carregou – com a mãe, claro – para Atlanta, no estado da Geórgia, onde o jovem talento se aprimorou com aulas de canto e dança. O empresário arrumou até um ‘instrutor de ginga’, para que Bieber aprendesse a andar e dançar com o molejo de um verdadeiro astro pop. Clipes do cantor continuaram sendo postados no YouTube. Embora já contassem com produção profissional, conservaram um certo jeitão de vídeo caseiro, pois era importante que os fãs vissem o garoto como um talento espontâneo revelado pela internet. Bieber, enfim, foi fabricado para não parecer fabricado.

Lenta e conservadora, a indústria fonográfica patinou muito tempo para acertar o passo com a internet. Mas está recuperando o atraso. Em 2009, as vendas digitais movimentaram 4,2 bilhões de dólares no mundo inteiro. Mesmo no Brasil, que engatinha no comércio de música on-line – a loja virtual iTunes, por exemplo, ainda não chegou aqui –, a aceitação dessa tecnologia cresce. Segundo dados da Associação Brasileira dos Produtores de Discos, as vendas digitais em 2009 tiveram um aumento de 159% em relação ao ano anterior. A venda de CDs, em compensação, caiu 80% nos últimos seis anos. O caso de Bieber demonstra que, para além de um mero canal de comércio, a internet é uma ferramenta poderosa para lançar artistas. O site MySpace, por exemplo, revelou o grupo inglês Arctic Monkeys, a cantora inglesa Lily Allen e a brasileira Mallu Magalhães. Rádio e televisão ainda são as maiores plataformas para a fama, mas a internet é o palco primeiro das bandas da novíssima geração. Formado em 2003 em Juiz de Fora, o grupo Strike começou atacando o Orkut, o Twitter e o MySpace. ‘Só depois de divulgar nosso trabalho na internet emplacamos uma música na novela Malhação’, diz o vocalista Marcelo Mancini. Bandas que já tinham renome antes da popularização da internet têm de se atualizar. ‘Somos de outra geração, mas também precisamos conversar com nosso público sem interferência das rádios ou da gravadora’, diz Samuel Rosa, vocalista da banda mineira Skank, surgida em 1991. Equipados com a câmera do celular, os músicos do grupo estão sempre produzindo vídeos curtos – trechos de shows e ensaios – para postar no Twitter e no seu site.

O tamanho das comunidades dedicadas a cada artista nas redes sociais passou a ser um índice de prestígio – e produtores de shows e festivais estão sempre de olho nesse indicador. ‘Uma banda tem de ter pelo menos 15 000 pessoas em sua comunidade no Orkut para chamar a nossa atenção’, diz a produtora Tati Rangel, que organiza shows em São Paulo e Minas Gerais. A Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos, o maior evento nacional da música sertaneja, promove enquetes on-line para descobrir as duplas que estão para estourar. ‘É o melhor instrumento para buscar novos nomes em um ambiente que troca tão rapidamente de ídolos’, diz Cássio Leite, diretor artístico do Independentes, grupo organizador da festa.

Descoberto no YouTube, assíduo no Twitter, Justin Bieber é o ídolo da geração que cresceu on-line. Mas o que ele oferece às suas enlouquecidas fãs adolescentes não constitui novidade: romantismo comportadinho, temperado por uma ou outra insinuação de sexo (‘se você me der a primeira dança, prometo que serei gentil’, sugere o cantor em First Dance). É uma espécie de boy band de um garoto só. A internet abriu novos caminhos para a música – mas isso, por si só, está longe de garantir a inovação.

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Sérgio Martins

Saque consentido

Para astros como Justin Bieber, a internet virou a solução para o problema que ela mesma criou – a crise na venda de discos ‘físicos’. Em certos mercados regionais do Brasil, os músicos buscam a saída pela informalidade (ou pela ilegalidade): associam-se à pirataria. Ao lançar seu segundo disco, no ano passado, o sambista pernambucano João do Morro decidiu não distribuí-lo nas lojas. Autorizou um vendedor de carrocinhas – carrinho que vende CDs piratas – a copiar e vender quantas unidades quisesse. Espalhadas pelos pontos turísticos do Recife, as carrocinhas encarregaram-se de divulgar a música do cantor e compositor. João não ganhou um tostão com o disco (que também é distribuído de graça na internet). Mas o sucesso da tática o tornou muito popular: ele hoje faz cerca de vinte apresentações mensais, a um cachê médio de 12 000 reais. ‘Graças à pirataria, minhas músicas ficaram conhecidas e meus shows lotam’, diz.

Essa estratégia semissuicida não é invenção do pernambucano. Em Belém, vigora uma combinação entre os artistas do tecnobrega, espécie de funk paraense, e os vendedores de CDs piratas. As canções que fazem sucesso nas aparelhagens, equipes de som que tocam tecnobrega, são entregues diretamente ao camelô. Ao artista, resta partir para o mercado de shows. ‘Ele pode ganhar até 1600 reais por apresentação’, diz o pesquisador Ronaldo Lemos, autor de Tecnobrega – O Pará Reinventando o Negócio da Música. João do Morro, que compõe sua própria música, tem direito de distribuí-la de graça. Na maioria dos casos, porém, esses esquemas informais são francamente ilegais. ‘Os artistas distribuem predatoriamente a propriedade intelectual de terceiros. Os compositores são lesados’, afirma João Augusto, presidente da gravadora Deck-disc.

 

TELEVISÃO
Personagens no olho da rua

Edie Britt, a corretora imobiliária espevitada de Desperate Housewives, foi o melhor papel da carreira no geral medíocre de Nicollette Sheridan. A atriz deixou a série em 2009. Sabia-se que ela não saíra em bons termos. Agora, revelou-se a dimensão do barraco: na semana passada, ela abriu um processo em uma corte de Los Angeles, por agressão e demissão injusta, contra o criador e produtor da série, Marc Cherry. Nicollette alega que Cherry lhe deu uns sopapos quando ela reclamou do roteiro de um episódio. Até a semana passada, Cherry não se manifestara a respeito. Mas as demissões televisivas sempre envolvem um problema criativo – como eliminar o personagem do ator cortado? E a morte escabrosa de Edie, eletrocutada depois de bater com o carro em um poste, tem certo cheiro de vingança autoral contra a atriz que cria caso.

Entre os atores encrenqueiros, poucos superam o potencial demonstrado por Vera Fischer e Felipe Camargo na novela Pátria Minha, de 1994. Os barracos do casal culminaram com um braço quebrado da atriz. A Globo demitiu os dois – e seus personagens foram mortos em um providencial incêndio. A baixaria também determinou a demissão de Isaiah Washington, o doutor Burke do melodrama hospitalar Grey’s Anatomy, depois de três temporadas da série. Grosseiro no set, Washington fazia piadas agressivas contra um colega gay, T.R. Knight – que, ironicamente, também acabou guilhotinado. No ano passado, Knight declarou à revista Entertainment Weekly que Shonda Rhimes, criadora da série, o demitiu depois que ele saiu do armário, alegando que os fãs reagiriam mal a essa revelação.

A rejeição do público pode fazer com que um ator acabe na rua. A eterna durona Michelle Rodriguez participou de duas temporadas de Lost, no papel da policial Ana Lucia. Os fãs da série odiaram a personagem, que teve de ser assassinada. Em casos mais graves, o problema não é um personagem em particular, mas a trama toda. Tempos Modernos, a atual novela das 7, vem patinando em índices de audiência abaixo dos 25 pontos (o esperado era 35). O autor Bosco Brasil matou o vilão Albano (Guilherme Weber) para sacudir a história. Weber, porém, segue na folha de pagamento da Globo – e vai voltar no papel do gêmeo bonzinho de Albano. Não estaria na hora de arranjar um incêndio?

 

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