Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

A direita pode resgatar a moral?

Não há dúvidas que as manifestações massivas aconteceram na velocidade que ocorreram em junho de 2013, devido às redes sociais. Cada um pode ter algum espaço de produção e reprodução de conteúdo online. Ganha a democracia imediatamente e, em médio prazo, espera-se que a credibilidade também se faça valer.

Os interesses públicos, tão longe do povo, desde que os poderes públicos nacionais saíram da cidade do Rio de Janeiro, são colocados ao espaço da população via internet e todos os que tenham interesse em comum formam uma rede de discussão e fóruns pró ou contra. A reação encontrou terreno fértil no ciberespaço e as massas vão à direção daqueles que despertarem raiva, como a corrupção consegue despertar naquele que tomou consciência de que foi furtado. Nesse sentido, a ala progressista não consegue reverter o bombardeio midiático do medo, da violência, do roubo, do estupro e, por fim, do assassinato. Talvez não seja exatamente nessa sequência, com os intervalos comerciais, mas o encadeamento assim se sistematiza.

Roberto Amaral, ex-presidente do Partido Socialista Brasileiro (PSB), dissera em entrevista para o movimento estudantil que “(…) mais importante que a democratização dos meios de comunicação é a democratização da informação”, por entender que a moralidade em questão a ser preservada são os valores do homem e o seu respeito, devido ao seu direito inalienável. Reside aí o sentimento de “passar a mão na cabeça” dos bandidos ao se levantar o papel dos “direitos humanos”.

Certamente não se chega neste mundo nenhum recém-nascido babando de ódio, uma vez que a maior necessidade de um ser tão sensível é o amor. Eis que a educação deve contribuir muito na formação da personalidade e do caráter. Ao menos é o que eu acho, pois não tenho filhos. O que posso dize seguramente é que a vida adulta em nossos dias, às vezes, se torna insuportável. O estresse testa nossa saúde ao máximo. Alguns não aguentam e ficam doentes, depressivos, hipertensos, entre outras doenças cada vez mais comuns em jovens do nosso tempo. Mas o que a produção midiática tem a ver com isso tudo? Trata-se de um conto ficcional de minha parte?

Tarefa árdua

O que o clã de Jair Bolsonaro constitui, por exemplo, é legitimar o que uma grande parcela da sociedade carioca que os elege (para deputado federal, o pai bateu recorde) pensa, ou nem para para pensar. No Rio de Janeiro é normal ver mulheres bem vestidas (e de roupas largas e longas) correndo de madrugada por medo de ser estuprada ou assaltada. Por essa “lógica” da fragilidade não se questiona a educação das boas famílias que matriculam seus filhos numa escola tradicional como o Colégio Cruzeiro e seus alunos (pré-adolescentes) planejam, numa emboscada, atacar o colega por problemas infantis com arma branca, conforme noticiou O Globo (22/11/2014). Ao se verem três meninos andando juntos, que “aparentem” ser de origem favelada, o mesmo principio de pânico despertado nas mulheres que correm de madrugada se generaliza para todos. Eu também tenho medo de sofrer uma tentativa de assalto, principalmente por arma de fogo.

O que se apresenta nesse contexto dos direitos humanos, e eu não pretendo passar a mão na cabeça de ninguém, é que é certo que nossos presídios – vistos numa panorâmica aérea – têm uma cor predominante exposta no banho de sol, assim como nos campi das universidades, apesar da recente inclusão, uma outra cor também é predominante. No acesso à universidade se gera polêmica sobre a meritocracia. Nisso eu gostaria de ver alguém passar a mão na consciência.

Nesses casos da normalização do estupro do homem sobre a mulher e da prisão perpétua ao jovem negro, vemos como a justiça, se não é falha, é completamente antidemocrática. A regulação da mídia também passa pelo espaço de conteúdo nacional, tendo em vista que o oligopólio e controle dos meios de comunicação se aliam à ideia dos trustes, ao passo da globalização do território se tornar, cada vez mais, eficiente pela propagação do perfil estético do bandido e do vilão. Jamais iriam criticar o “incentivo” aos meninos do Colégio Cruzeiro de esfaquear o colega. Nesse caso é desumano pensar em redução da maioridade penal. Coloca-se aí algo mais grave quando a banalidade da violência atravessa as grades dos condomínios de luxo e chega num instante através dos celulares, computadores e tablets das crianças.

Jair Bolsonaro foi recepcionado como uma liderança por aspirantes a oficiais de carreira formados pela Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN) em 29/11/2014, num ato isolado. Enquanto numa outra ocasião solene o então ministro da Defesa, Celso Amorim, estaria exposto a uma vaia orquestrada, um militar da reserva é referenciado com status de líder ao declarar que pretende “jogar para a direita esse país” (ver aqui), além de endossar que “o nosso compromisso é dar a vida pela pátria e vai ser assim até morrer” pelo sentido de preservação dos bons costumes “da família”. Afinal, quem defende convictamente suas posições machistas, racistas, homofóbicas e sobretudo conservadoras só chega nesse nível de posicionamento público por ser autêntico e legitimado pela sociedade.

Esse sentimento de salvação da pátria ensinado nas escolas militares até hoje propaga a ideia de que houve uma revolução de 1964 a 1985. Acima de tudo, inclusive dos efeitos da crise financeira global, a crise moral entrou em colapso e resgatar a solidariedade como construção de um mundo generoso se tornou tarefa árdua, porém prazerosa, para quem não cobra nada pela satisfação de construir pragmaticamente o futuro da humanidade. Para tanto, os meios de comunicação em massa ajudariam muito ao fabricar esse sonho, que tira o sono dos medíocres.

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Paulo Mileno é ator