Pizza.com é um nome de domínio que foi vendido por cerca de US$ 3 milhões em 2008. Outros custaram muito mais. Essa valorização explica em parte a corrida por novos TLD (Top Level Domain) genéricos que a Icann (Internet Corporation for Assigned Numbers and Names) disparou em 2011.
Na semana passada, foi realizado em Buenos Aires o encontro Icann 53. Como sabemos, a Icann ganhou a concorrência de privatização da Iana (Internet Assigned Numbers Authority), organização que cuidava dos recursos coordenados da internet: distribuição dos endereços (números) IP, gestão da raiz de nomes da rede (como .br, .com, .org), além de ser repositório de documentos, parâmetros e definições técnicas.
Na origem da rede operavam apenas os TLDs .com, .net, .org, .edu, .gov, .mil e .int. Com sua expansão para além das fronteiras dos EUA, foram criados domínios de duas letras, que se referiam a territórios e códigos de país (ccTLD). Surgiram mais de 200, entre eles o .ar, .br, .za etc.
O registro sob todos os domínios era à época sem custo. Em 1995, os domínios .com, .net e .org passaram a ser administrados por uma empresa, a Network Solutions, e a ser cobrados. Também perderam a conotação de “norte-americanos” e consolidaram-se como “genéricos”, gTLDs, ou seja, não restritos a determinado país.
A concentração da operação desses três domínios genéricos em uma única empresa gerou tensões e atraiu muitos empreendedores para o negócio de operar domínios genéricos.
Assim, no cenário em que o Icann assume a Iana em 1998, estava subentendido que uma das metas seria a criação de mais domínios genéricos para tornar esse mercado menos concentrado. Sete domínios foram logo criados, mas passou-se tempo até que o Icann abrisse chamada a interessados, englobando mais de 1.900 propostas de nomes genéricos. Hoje, cerca de 600 deles já existem na raiz de nomes e começam lentamente a se disseminar pela internet.
É isso bom ou mau para rede? Os que defendem o programa dirão que ele permite a criação de novos rótulos relacionados a locais geográficos, atividades, marcas etc. É o caso dos domínios .berlin, .club, .lgbt, .toyota etc. Os que não são favoráveis dirão que é apenas uma iniciativa comercial, tentando tirar proveito de nomes interessantes.
Um caso emblemático foi discutido na Icann 53: o TLD .sucks, que significa “algo desagradável, que aborrece e incomoda”. Os que defendem o .sucks dirão que é uma forma da comunidade expressar seu desagrado, criando um sítio sob nome do serviço, marca, pessoa que quer criticar.
Os que veem nele um “caça-níqueis” apontarão para o fato de que o .sucks cobra milhares de dólares para o registro de palavras que eles próprios avaliam como “interessantes”. E se alguém quiser se proteger, pode ser que tenha que comprar o próprio nome lá. Esse potencial de “chantagem” existe sempre que um novo domínio genérico é criado. É de se apoiar tal uso?
Como disse Shakespeare pela boca da gentil Julieta, afinal, qual o valor intrínseco de um rótulo? “Chamássemos a rosa de outro nome, teria ela ainda assim o mesmo doce perfume!”
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Demi Getschko, membro do Hall da Fama da Internet, é conselheiro do Comitê Gestor da Internet (CGI.br) e colunista do Estado de S.Paulo