Saturday, 21 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Cobertura morna em tempos de telespectadores quentes

Há muito que as questões ambientais já fazem parte das principais pautas de discussões setoriais e fóruns acadêmicos. A preocupação com o meio ambiente equilibrado é um dos principais temas debatidos pela Organização das Nações Unidas e, recentemente, foi alvo de polêmicas após a saída dos Estados Unidos do acordo de Paris.

Embora, desde a primeira infância, sejamos interpelados já na escola a discutir o assunto “desenvolvimento sustentável”, parece que a grande parte da população não se sente interessada sobre o assunto. Em verdade, as discussões envolvendo o meio ambiente, o ecossistema e outros aspectos ligados à natureza tem se reduzido aos confrontos envolvendo os integrantes de ONGs e empresários, que buscam o desenvolvimento econômico a qualquer custo.

Neste cerne, levando em consideração o papel que a televisão possui, dentre estes o de educar, percebe-se que as programações envolvendo pautas ambientais, não têm despertado o interesse da população em geral. Sabe-se que a convergência midiática alterou completamente o perfil dos telespectadores, que agora fazem dos computadores, tabletes e smartphones concorrentes diretos da TV. Todavia, ainda que a televisão tenha fortes concorrentes, programações como telenovelas, jornais ainda sustentam altos índices de audiência. Por seu turno, programações de cunho ambiental não têm conseguido se manter na mídia.

Max Fercondini encontra um bicho preguiça durante a gravação do programa Globo Ecologia. (Foto: Arquivo Pessoal / Max Fercondini)

Um exemplo clássico de desinteresse em programações focadas na educação ambiental foi o encerramento do programa “Globo Ecologia”, que foi exibido pela última vez em agosto de 2014. Vale ainda destacar que programas como “Globo Repórter”, que trazem temáticas ecológicas, só tem atingido altos picos de audiência quando a pauta trata de outros assuntos, tais como espiritualidade, negócios ou saúde, como aconteceu no último dia 04 de agosto, que atingiu 31 pontos de audiência, sua maior média desde 2012.

Outro programa em TV aberta que durou pouco mais de 3 anos foi o denominado “Aventura Selvagem”, transmitido pelo Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), cujo formato em reality show contava com a participação de um biólogo e aventureiro em busca de desafios no meio da selva. Mas, daí surge o questionamento, por que será que os telespectadores não se interessam por estes programas? Será que a fórmula adotada em seu roteiro é tão distante dos demais programas que sustentam altos índices de audiência?

Inicialmente vale destacar que os horários que tais programas eram exibidos possuíam baixo prestígio. O “Globo Ecologia”, por exemplo, era exibido às 6h 45min dos sábados. O programa “Aventura Selvagem” aos domingos, 6h da manhã. Além dos programas acontecerem muito cedo, a narrativa é lenta. O primeiro, imbuído de uma didática morosa, como poucos investimentos em edição.

Já o segundo, focado em um único personagem, fazia a trama tornar-se cansativa, enfadonha e repetitiva. Conforme elucida Moran (1995), a lógica da narrativa não deve se basear necessariamente na casualidade, mas sim na intencionalidade de que uma cena deve garantir o interesse da outra. O conjunto de formas, sons, efeitos e sentidos é que darão o ritmo adequado à programação.

Nesta senda, nota-se que as emissoras, pelo menos os canais abertos, utilizam os programas ambientais para que possam compor o quadro de programação educacional exigido pela legislação, todavia, não investem adequadamente nessas programações, tornando-as desinteressantes e fadadas ao fracasso. Como dito alhures, o telespectador de hoje possui inúmeras formas de comunicação, entretenimento, distração, logo, não há mais espaço para programações mornas e desinteressantes.

Em tempos onde o “zapping” do controle remoto foi substituído por outros tipos de “zaps”, faz-se mister que a dinâmica televisiva trabalhe outros aspectos em suas programações ambientais, que não só o caráter educativo, mas também estimule a criatividade, curiosidade e interesse das pessoas por suas mensagens.

Referência utilizada:
MORAN, José Manuel. O vídeo na sala de aula. In Comunicação e educação: revista do Curso Gestão e Processos Comunicacionais. Ano I, nº. 2, da ECA/USP, São Paulo, Editora Moderna, 1995.

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Jeremias Barreto Souza é advogado e jornalista.